Saga de um matuto na cidade
José Feitosa da Silva
(JFeitosa)
TRANSLITERADO
Seu pade eu istô aqui
Para puder lhe contar,
Quero que o sinhô saiba
Que vim pra me cunfessar,
Istava ajueiado ali
Naquele pé de artar.
Seu pade... Eu não seiu lê!
Seu pade... Eu não seiu falar!
Seu pade... Eu não seiu iscrever!
Seu pade... Eu não seiu orá,
Mais eu istava ali quetinho
Tentano me acaimá.
Sabe o que foi, seu vigáro?
A razão do acontecido,
Nesta sumana passada
Fui passiar cum meu fio,
Lá no cento da cidade
Num lugar desenvoivido.
O movimento era grande!
Ome, muié e minino,
Uns comprano...
Uns oiano...
Uns desceno,
Uns subino.
E eu ali caminhava
Cum aparênça assombrada,
Andano sem oiar de lado
Cum medo de uma topada,
Quando meu fio me diche:
- Vamo assubir na iscada.
Foi quando levantei a vista
Cuma quem procurava ela,
Vi um negoço rodano
Cum muita gente muntado,
Só era butar o pé, seu pade!
E assubia sem dá um passo.
E eu ali me controlava
Por causa da minha Fé,
Quando meu fio me diche,
- Faça o que eu fizer:
O sinhô se agarre aqui
E tente butar o pé.
Quando ouvi a instrução
Não deixei o tempo passar,
Me agarrei cum as mão
E o pé já fui butar,
Cumecei logo assubir
Sem sabê cuma parar.
Quando chegou lá em riba
Aquilo entrava na terra,
O povo já custumado
Só era levantar a perna,
E eu sai trambecano
Quando desamontei dela.
E nu é que eu caí, seu pade!
Foi a maior afrição!
Aquele monte de gente
Ispiano eu no chão,
E o meu fio ispantado
Quereno uma ispricação.
Foi quando me levantei
Cum minha cara infronhada,
Só via o povo falano
E outros dano rizada,
Passei as mão na minha roupa
Sem pudê dar uma palava.
Minha veigonha era grande
Naquela ocasião.
Um ome véio cuma eu
Passano esta afrição,
Só Deus lá de riba via
A dor no meu coração.
Continuamo o passeio
Um passeio de sufrimento,
Meu fio muito contente
E eu sofreno por dento,
Quando entramo nôta casa
Que vendia vistimento.
Meu fio muito disarnado, falô:
- Pai vamo oiar,
Aqui tem caça... Tem camisa
Escoia uma pra comprar,
Quando fui oiar a caça
Miti a cara na vridaça que o povo veio oiar.
Aí seu pade! Eu confesso
Que fiquei aperriado,
Oiano o povo chegano
E os vrido no chão quebrado,
Falei meu fio vamo imbora
Sou um véio fracassado.
Um ome disinformado
Não deve ir pra cidade,
E quando não sabe lê
Só aimenta a gravidade,
Porque não conhece nada
E só cumete bobage.
Meu fio me acaimava e eu mais nada dizia.
Ele precurou o dono
Para acertar cum a dívida
E o que mais me incafifou,
É que ele diche o dotô
Que eu sufria da vista.
Ta veno mermo seu pade
Que eu não sofro da vista!
Estô veno o artar
A cô de sua batina,
Ai fiquei maguado
Chingano a minha cina.
Foi ai que aumentou
Todo o meu sufrimento,
Cheguei até me cumparar
Cuma se fosse um jumento,
Que só vive no diserto
Trabaiano no relento.
Aí seu pade; Eu pequei!
Pequei por me cumparar,
Me cumparar cum um jumento, um jegue!
Daquele do Ciará,
Por isso eu vim aqui, seu pade,
Quereno me cunfessar.
Peço a sua santidade
Que pegue na minha mão,
A pessoa sem iscola
Nunca tem educação,
Por isso mermo seu pade
Tô pedino o seu perdão.
Só o perdão me conforta
E me deixa libertado,
Das loucura, das bestera
Que eu tenho por pecado,
Agora posso durmir
Sem pensar no meu passado...
Inté seu pade, eu já vou.
Quero dizer pru sinhô
Que estou muito sastifeito
E também aliviado...
Inté seu pade, inté!
O sinhô muito obrigado...
Inté!...