FOGUETEANDO

FOGUETEANDO

(Este cordel no São João e o São João neste cordel)

Bom é viver no Nordeste,

Saber festejar São João,

Ser doidinho por forró,

Xote, xaxado e baião.

Comprar vestido de chita,

Lembrar Maria Bonita,

Viver essa animação.

Enfeitar a rua toda

Com balões e bandeirinhas,

Papel de todas as cores,

Pendurar umas fitinhas.

Trazer fecho de madeira,

Preparar uma fogueira,

E acender com as vizinhas.

Ao mesmo tempo a cozinha,

Fica bem movimentada,

A tuia de milho verde,

Pronta pra ser ralada.

Chama-se um cabra parrudo,

Daqueles que topam tudo,

Dá pra ele essa empreitada.

O suor pinga na testa,

Do ralo escorre a massa,

Amarela que nem ouro

Que na peneira se passa.

Vira canjica e pamonha,

Com o tempero da Tonha,

O cheiro chega na praça.

E completando o banquete,

Milho cozido e beju,

Queijo de coalho, pipoca,

Uma tirrina de angu,

Bolo de milho e mandioca,

Cafezim com tapioca

E castanha de caju.

Espie bem que beleza,

Essa festança junina.

Ficam todos assanhados,

Véio, menino e menina.

A gente não quer tristeza,

Que ela vá pras profundeza,

Pro raio da cerebrina.

Já vem os Bacamarteiros,

Com seu tiro de lascar,

Isso faz parte da festa,

Eles querem é brincar.

Apontam na direção,

Disparam sem compaixão,

Um sopapo de assustar.

Não podem faltar os fogos,

O clarear do rojão,

Peido de veia e traque,

Pipocando pelo chão.

Os moleques pra abusar,

Gritam só para enfesar:

“queima a rodinha Bastião”

A certa hora da noite,

O buscapé é amarrado,

Pra todo lado faísca,

Deixando o povo assustado.

Mas há quem goste da farra,

E faça toda algazarra,

Correndo desembestado.

É melhor trancar a porta,

Livrar-se da queimadura,

Espiar pela brechinha,

E fazer uma misura.

Gritar de longe: “quebrou,

Quebrou e já alisou”!

E correr da travessura.

Antes disso no terreiro,

Brinquedo da molecada,

É subir no pau de sebo,

Dançar coco de embolada.

Arriscar na pescaria,

Qualquer prêmio é alegria,

Vale até não ganhar nada.

As moças por sua vez,

Fazem adivinhação,

Pra casar e ser feliz,

Só mesmo com devoção.

Apelam pra Santo Antonio,

Para arranjar matrimônio,

Na noite de São João.

Elas vão lá no quintal,

No tronco da bananeira,

Colocam a faca virgem,

E puxam sem brincadeira.

Esperam sair marcado,

O nome do namorado,

E adeus vida de solteira.

Mergulham um par de agulhas,

Para dentro da bacia,

Lá no fundo elas se espalham,

E ai começa a agonia.

Elas têm que se juntar,

Para o casório vingar,

E não ficar pra titia.

Brincadeira de comadre,

Já é tradição também,

Promessa em volta á fogueira,

Que se cumpre muito bem.

Pra isso não tem idade,

Viram comadre ou compadre,

Para toda vida, amém.

Tem a barraca do beijo,

Onde tem assanhamento,

Pra ganhar uma beijoca,

Só mesmo com pagamento.

E a donzela mais bonita,

De ruge e laço de fita,

Beija sem constrangimento.

Já se avista na calçada

Os pares se preparando,

Vai começar a quadrilha,

Todos vão se balançando.

Animados pelo som,

Sanfoneiro da o tom,

E o puxador, o comando:

- Cavaleiro puxa a dama,

Eu danço com vormicê,

Depois fazer grande roda,

Preparar o anarriê.

A quem compete girar,

Trocam todos de lugar,

E agora tem balancê.

É um visuá colorido,

Uns cem metros de babado,

Lá vem a noiva de branco

Com seu par desengonçado.

No bucho ela traz o fruto,

Do casamento matuto,

Que ira ser celebrado.

Eita resenha danada,

Pro casamento sair!

O pai da noiva arretado

Não deixa o noivo fugir,

Ai ameaça o coitado:

“Ou casa ou morre, safado,

Nem pense em escapolir”.

Enfim o padre celebra,

A cerimônia bendita,

O juiz também ta lá,

Botando tudo na escrita.

Depois prossegue a festança,

Todos voltam para a dança,

Só param para a birita.

A festa num acaba aí,

O melhor vai começar,

Tem forró lá na palhoça,

Pra todo mundo brincar.

O povo vai bem trajado,

Modelito amatutado,

Dança até o sol raiar.

Na zabumba tem Jacó,

Seu Quinca é o sanfoneiro,

No triângulo, Zequinha

Que dessa arte é herdeiro.

Não precisa nem orquestra,

Os três já fazem a festa,

Pra todo bom forrozeiro.

Tem um tal de rela bucho,

E muita perna entrançada,

Dançando um bom Pé de Serra,

Pense, que gente animada!

Cachacinha vez em quando,

Tira gosto completando,

Dando um fungado na amada.

Tem vez que a dama é trocada,

Na brincadeira que tem,

Um cabra todo enxerido,

Toma a pareia de alguém.

Só que depois tem o troco,

Pra chatear o caboco,

Toma-se a dele também.

A sanfona chega chora,

Cada forró de lascar,

Não há como no Nordeste,

Ritmo tão popular.

É remelexo e poesia,

Arrasta-pé e alegria,

Ninguém cansa de dançar.

- Nem se despediu de mim,

Foi-se embora do sertão,

Andar por esse país,

Levando meu coração.

Tá é danado de bom,

Não pode sair do tom,

No ABC do sertão.

- Nos braços de uma morena,

O forró vai esquentar,

O tocador quer beber,

Não deixe ele cochilar.

Na festa do interior,

O que explode é o amor,

No São João lá do arraiá.

Apagou-se o candeeiro,

Mas o sol já vai raiando,

Apenas por essa noite,

O forró ta se acabando.

Outra noite vai chegar,

Quando a ressaca passar,

E a poeira for baixando.

É disso que o povo gosta,

É isso que o povo quer:

Ser nordestino valente,

Para o que der e vier,

Ser disposto na labuta,

Abençoado na luta,

Festeiro quando puder.

A gente escreve essas coisas,

No cordel, nosso vetor,

Esse dom nós possuímos,

Por graça de Nosso Senhor.

Num folheto amatutado,

Passamos nosso recado,

Com a arte e bom humor.

A beleza do folclore,

Mostra isso com mais riqueza,

A cultura popular,

Possui toda essa grandeza.

O poeta cordelista,

Com sentimento de artista,

Diz tudinho, com certeza.

Fátima Almeida

Mary Fa
Enviado por Mary Fa em 14/06/2009
Código do texto: T1648925