Vampirofobia

- Mas Silvio, você tem certeza? Absoluta? Acha, pelo menos, certo?

- Veja bem Veridiana, isso não importa. É necessário e pronto.

- Mas você está sendo incoerente, no mínimo.

- É. Tens razão. Mas isso também não importa.

- Será o Benedito! Alguma coisa importa pra você?

- Bem, isso tem proveito, utilidade. Satisfeita?

- O que? Não, não estás a falar sério? Estás?

- Nunca falei tão. Hoje, pelo menos.

- Eu me recuso a continuar esta verborragia. Por que é isto, exatamente, o que é!

- Tudo bem, tudo bem Veridiana. Façamos o seguinte, então...

- Não! Espera! Eu me confundi. Espera mais um pouco, só mais um pouco, pelamordedeus!

- Mas eu nem completei meu raciocínio.

- E nem precisa!

- Agora quem está sendo incoerente é você.

- Desculpa, é a ansiedade.

- Posso, então?

- Vai doer, Silvio?

- O quê?

- Muito ou pouco?

- Espera um pouco, mulher, do que você está falando?

- Não está na cara?

- Literalmente?

- Isso é obvio. Era uma pergunta retórica. Sou viciada nelas. Neste caso, infelizmente.

- Como quer, então?

- Quer o quê?

- Agora chega, Veridiana! Você não está facilitando minha filha.

- Não sou sua filha.

- Força de expressão. Caralho! Força de expressão!

- Tá bom, tá bom, mas não se irriiiiiiite.

- Ah não! Agora você apelou!

- rsrsrsrs. Olha só, quero inteira. De uma só vez. Você pode. Todo mundo sabe.

- É verdade. Isto é bem verdade. Mas todos quem sabem? Como VOCÊ sabe que eles sabem?

- Não importa, não é mesmo? Viu como é bom? Então, vai doer?

- De novo esta conversa?

- É o mínimo que você poderia me dar. Uma resposta sincera. Por consideração. Quantos anos de amizade?

- Uns tantos!

- Pois é!

- Vai!

- O quêêêêêê?

- Vai doer. Ué. Estou sendo sincero.

- Ai meu senhor Jesus Cristo, me conforte nesta hora, me..

- Ele nunca ajudou ninguém. Pelo menos comigo.

- Calaboca Silvio! Deixa eu pelo menos acreditar! Alivia o sofrimento, não sabia não?

- Para os outros não...

- Calaboca! Que saco! Seja mais sensível! Cadê seu cavalheirismo?

- Tudo bem, mas não se irriiiiiite.

- Agora é você que apelou! Rsrsrsrsrsr

- Ou você chora ou você ri. Assim eu me confundo. E aí vai doer pra cacete.

- Tá, tá. Estou chorando, olha só como estou triste.

- Nossa mãe do céu, tá quase na hora do dentista! Se me atrasar de novo o doutor Coimbra vai fuçar sem anestesia! Ele me avisou. E o cara mete medo!

- Tá com medinho é?

- Ironia? Iornia é? Mulheres, quem vai entendê-las. Até nessa hora.

- Silvio, há alguma chance de me livrar disto?

- Não.

- Umazinha? zinha? Bem diminuta?

- Não.

- Você lembra daquele dia...

- Veridiana, é sério, o doutor Coimbra. Preciso mesmo. Já fui prolixo demais. Ei, isso não é pleonasmo vicioso?

- Ok! Ok! Mas faz um favor, diz pro Manoel que foi muito melhor que as mordidelas ridículas que ele pensa me “esquentar”. Faz isso?

- Coitado.

- Faz?

- Mas aí a galera toda vai saber. Serei caçado como um bicho!

- Aceita tua natureza homem! Mostra que você tem culhões!

- Mas eu não tenho.

- O quêêêêêê?

Silvio chegou em cima da hora. Doutor Coimbra estava se preparando para a pesada tarefa. Usaria anestesia. Afinal eram peças bucais extraordinárias. Devia cobrar por centímetro quadrado, pensou. Mas só pensou. Não queria ter uma conversa mais longa com Silvio.