A PATINHA FEIA (Luc Ramos)

A PATINHA FEIA

Parte 1

Todos os dias de visita ela estava lá, não faltava um dia, durante o mês a cada semana a visita mudava, uma semana caia num sábado, na outra semana automaticamente o dia de visitas caia no domingo, e assim consecutivamente.

chovesse ou fizesse sol, pouco importava, Filomena estava presente.

O Julião, nem se preocupava mais, caso ela demorasse em entrar no Presídio, ele sabia que não dava outra ela estaria chegando, sempre foi assim, e assim seria sempre.

Filomena, quando o Julião estava na rua solto e roubava fios de telefone com um comparsa menor de idade, que era pra quando desse uma zebra o menor segurava a bronca e o Julião ficava a vontade, solto novamente. Sempre quando chegava em casa o malandro maltratava a Filomena, chegou até a lhe dar uns tabefes, e por estar drogado e cheio de cachaça, ela sempre se segurou "em copas" ficou firme, ele ouvia sempre por ai dizerem que mulher de malandro gosta de apanhar, se fosse verdade, ela era uma delas.

Depois de uns tempos o Julião resolveu dar uns voos mais longos, como o parceiro fez 18 anos e passou à maioridade o Julião resolveu mudar de artigo e começou a furtar automóvel.

Fez um curso rápido com um cara bom de mixa, aprendeu com um amigo ex - presidiário desligar alarmes de carro, sabe como é, precisa se atualizar, os engenheiros das fabricas de automóveis estão sempre inovando.

Assim que mudou de ramo, o Julião descobriu que tinha feito um bom negocio. Como "caranguejeiro" ele fazia bons negócios. Começou a ganhar mais dinheiro, os “caras” donos de desmanches pagavam bem e no ato.

Julião logo caiu de amores por uma morena que trabalhava e morava na casa dos patrões em um bairro nobre da cidade e nos dias de folga ela ia ao cinema no Shopping, Julião um moreno boa pinta, malandro, não teve trabalho para conquistar a morena que tinha um rabo do tamanho da bunda da Sheila do Tchan.

A Filomena depois disso passou a ser apenas a sua empregada domestica. Sexo nem pensar, quando a Filomena já na secura encostava-se nele, depois dele chegar altas horas da madrugada, ele muito mal educado, chutava ela para o lado: - Chega pra la, mulher, se liga, não vê que eu estou cansado, trabalhei até agora, nana e descansa.

Filomena não era boba, já tinha sentido o cheiro de perfume de mulher na roupa dele, percebeu que ele tinha comprado roupas novas, cueca nova. Tudo isso era sinal que outra mulher estava por perto.

Filomena não era feia, um pouco dentuça e magrela, mas, fazer o que? Os seus pais não puderam comprar para ela um aparelho desses que todas as adolescentes hoje usam e quanto ser tão magra era o seu bio tipo. Nasceu assim fazer o que? Mesmo assim quando ela passava na rua os "caras" mexiam com ela e sempre era o mesmo elogio: - Oi magrinha, vem meter comigo que eu vou te atravessar do outro lado. Ou então: - Dá pra mim magrela?

Ela não achava ruim esses elogios, pelo menos esse pessoal falava alguma coisa, e o Julião que não falava nada, quando ele ainda fazia amor com ela, ele subia em cima, de frente, depois virava ela de costas, fazia o que tinha que fazer, e pronto! Ela ficava na saudade sempre. Quando ela começava e esquentar os motores, era a hora que o Julião se satisfazia, ele deitava para o lado e roncava até o outro dia, contaminando o quarto com um forte cheiro de cerveja misturada com pinga.

Até que pintou o dia da zebra e o Julião foi parar em cana. Flagrante. O bicho pegou pra ele! Julião já tinha umas broncas antigas, aliadas ao 155 atual, acabou pegando cinco anos e alguns dias. Pra ela não mudou nada, nem sempre ele dava dinheiro para o sustento da casa. Na verdade quando ela ganhava algum dinheiro olhando as crianças da D. Eufrásia, dona da quitanda ali do bairro quanto recebia o Julião tomava o dinheiro dela.

Inclusive, depois que ele arranjou essa outra, ela que não era boba nem nada, percebeu que o Julião quando brigava com ela, sempre insistia em dizer:

- Ó nega, se quiser dar o fora do barraco, é só se mandar, não precisa nem dizer tchau, morou?

Vejam só! Se mandar do barraco. Poxa o barraco é dela! Ela que convidou ele á uns tempos atrás para morar ali.

Para encurtar a conversa, o Julião dançou e ela ficou sozinha, no mesmo dia que ele foi preso, um amigo dele que estava saindo de cana levou para ela um bilhetinho, dizendo para ela ir visitá-lo na cadeia e levar cigarros e material de higiene.

Ela assim procedeu e já fazia um mês que estava fazendo o maior sacrifício, lavando roupa pra fora, olhando crianças, qualquer coisa, mas, no fim de semana o jumbo do Julião era sagrado, ela enfrentava uma tremenda fila mas, levava as frutas e o que fosse necessário para o malandro que estava preso.

A PATINHA FEIA

Parte 2

Até que um dia, ela foi visitá-lo e se atrasou mais do que de costume, porque tinha havido um problema com algumas visitantes e a canseira desta vez foi grande, quando ela conseguiu entrar no CDP (Centro de Detenção Provisória) o Julião não estava mais no pátio a sua espera. Ela perguntou para o Funcionário que encaminhava as visitas para as celas.

-Ha, o Julião? Sei quem é, ele já subiu, tem uma garota nova visitando ele!

Ela nem soube dizer o que estava sentindo, chegou a pensar que era uma espécie de dor ou de alivio, embora se sentisse magoada com a traição.

Ela ficou por ali, esperando, meio escondida, até que viu o Julião aparecer com a morena no pátio, depois do “bem bom”.

Ah, era aquela então? Ela olhou bem para a fisionomia da mulher e sem que eles a vissem foi embora. O jumbo que ela tinha levado para ele, trouxe de volta para casa, ela precisava mais que ele daquelas frutas e guloseimas.

Foi pra casa, trabalhou normalmente e na sexta feira foi até uma boca de fumo que todo mundo conhecia e comprou cinco cigarros de maconha, gastou um trocado que não podia, mas, tinha que ser assim. Ela tinha um plano.

No outro sábado, dia de visita, madrugou na fila das visitas do CDP e quando eram umas seis horas da manhã a tal mulher que ela tinha visto na outra visita com o Julião chegou. Veio de táxi. A fila estava enorme, ela conseguiu chamar a atenção da moça e lhe disse: - Vem aqui, eu guardei um lugar para uma amiga e fiquei sabendo que ela não vai vir hoje.

A mulher bonitona, nem acreditou, que legal! Você me conhece da onde?

-Ora, na visita anterior, eu estava no xadrez ao lado da onde você estava com o seu marido, é seu marido não é?

-Não é ainda, mas estamos bem firme, nos vamos nos casar, ele vai dar o fora numa coitada que mora com ele, e talvez a gente se case até ai na cadeia mesmo.

-Que bom, espero que você seja feliz com ele!

-Obrigado!

A fila enorme começou andar, lenta... O sol forte, começando a mostrar a sua beleza e força, a morena bonita falou: - Colega, eu vou ao banheiro, você dá uma olhadinha na minha sacola pra mim?

-Claro! Vai sossegada, eu tomo conta.

Assim que a morena virou as costas, Filomena pegou um pacotinho que tinha preparado em casa e disfarçadamente, sem chamar a atenção das outras pessoas que estavam na fila, colocou no fundo da sacola da morena.

Logo a morena voltou: - Puxa que banheiro sujo fiz xixi em pé, você não quer ir ao banheiro?

-Vou sim, olha, caso eu não voltar, não se preocupe, vou procurar uma amiga lá no final da fila e ficar conversando com ela.-Quando chegar você me deixa entrar na sua frente, tá bom assim?

-Esta bem! Muito obrigado pelo lugar, guardarei o seu pra você, qual é o seu nome mesmo?

-Mafalda! Mentiu, dizendo o primeiro nome que lhe veio a mente.

- Obrigado, pelo lugar Mafalda, eu não vou esquecer você.

- De nada, espero que não esqueça mesmo. (ela riu enigmática).

Quando chegou a vez da morena passar no setor de revista do CDP e os seus pertences foram revistados, a morena toda catita ficou perplexa quando o rapaz que revistou a sua sacola, disse:

-Que é isso, mulher? Pensa que eu sou cego, Fuça, chama a Chefia, a mulher aqui estava tentando entrar com cinco parangos de maconha na sacola.

Cana nela! Filomena nunca mais voltou ao CDP, mudou para uma outra cidade e agora todos os sábados e domingos ela vai a uma Igreja Evangélica lá no bairro novo onde mora. Esta até de caso com um irmão da Igreja, um homem de uns quarenta anos, que á pouco tempo saiu da cadeia, e quer tentar uma vida nova com ela. ( FIM)