DORMI  NESTE MUNDO E ACORDEI... NOUTRO

 

Após ter jantado e olhado alguns programas na televisão e alcançado o horário de dormir, coloquei o meu pijama e em seguida a minha esposa fez o mesmo, isso quando eu estava com 66 anos. Dormi o meu primeiro sono que dura aproximadamente uma hora e meia... E naquele momento eu já tinha me acordado em outro mundo e não naquele que eu havia dormido... Mas o sono voltou e eu dormi novamente, me acordei outra vez e ainda sentia-me fora do meu mundo. Dormi novamente até clarear o dia... Minha esposa levantou antes e fez um chimarrão como era seu hábito... Eu levantei fui até a cozinha e minha esposa me deu o chimarrão eu o tomei e quando ela falava comigo eu não respondia, porque aquele mundo não era o meu, tudo estava estranho – peguei o controle remoto e tentei mudar de canal, mas apertava em todos os comandos e a televisão não obedecia - resolvi comer uma laranja, mas  não consegui descascá-la a força tinha sumido e o meu mundo real também. Mas lembro de que entendia um pouco o que a minha esposa falava e quando ela perguntou se eu queria consultar um médico  assenti afirmativamente com a cabeça... Lembro-me dela ter chamado a minha filha que veio com o marido e me levaram de carro até  o hospital e as coisas ficaram mais confusas tive algumas convulsões e fiz o exame de tomografia computadorizada da cabeça que atestou um AVC isquêmico.

Fiquei dez dias hospitalizado dei alta e voltei para casa como se um caminhão tivesse me atropelado... Não sentia dor, só sentia que o mundo deu um giro – mas foram muitos neurônios abatidos e os sobreviventes teriam de desviar caminhos para tentar amenizar os problemas ocasionados.
 
 Os problemas começaram aparecer. Fala o que mais me atingiu, eu pronunciava apenas sílabas e como eu falava espanhol por ter morado no Peru, as palavras em espanhol saiam bem melhor. Fui escrever no Word e pensava que tinha escrito certo, mandei um e-mail para um amigo, que logo me ligou para que eu traduzisse – fui tocar o acordeom o peguei na posição certa, mas colocando as mãos nos comandos saiam de tudo, menos músicas – ao tocar flauta também a pequei na posição correta coloquei os dedos nos buracos certos, isso até sabia, mas músicas tinham desaprendido todas.
Como eu sempre tive uma ótima saúde até os 66 anos,  primeiro venho a negação do AVC , depois uma pequena depressão pós AVC, até chegar a conclusão de que eu sofri o acidente e que teria que melhorar,  ou aguentar.
Fiquei mais ou menos um ano falando com dificuldade, até que a fala voltou quase que normal.   Fique duas horas por dia tocando acordeom para reaprender as músicas que tinha no meu repertório que eram 50... E saí com láureas, pois cheguei a tocar mais outras 50  em quatro anos... Na flauta consegui recuperar todas as músicas.  Voltei a escrever e é isso que estou fazendo agora.
Quando completei 70 anos regressei ao  judô onde tive uma vida dedicada a ele, participei de competições e iniciei a  pratica de corridas de rua com 50 eventos  participados... Faço natação no verão e ando bastante de bicicleta. Estou no quinto ano nas atividades físicas.
Dei alguns passos para trás com o AVC, mas quando tudo depende da  pessoa que pode  ficar com o prejuízo, ou pode se levantar como um guerreiro... Que sempre fui por praticar judô e sua filosofia - voltei ao meu próprio mundo.

Scaramouche
Enviado por Scaramouche em 19/05/2017
Reeditado em 20/09/2022
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