LUIZ XV E O DIABO ERAM VIADOS

Hoje, sábado, olhei pela janela e vi o céu enfarruscado. Procurei de cima até embaixo, de um lado para o outro e não vi nadica de sol anunciando um sábado legal, com direito a uma escapulida para uma caminhada pelas ruas da cidade.

Deixei escapar um muxoxo, entremeado por um palavrãozinho interjetivo, e aquele sentimento recôndito de desapontamento.

Sem mesmo desconfiar da razão, a ausência do Sol fez com que perguntasse a mim mesmo por que diabos o chamam de “Astro Rei”? Antes mesmo que a resposta se formasse em minha mente, importada da intuição, fui dar com o pensamento, imaginem, nos costados do Século XVI!

Pois não é que, naquela época, viveu um sujeito pra lá de excêntrico, um baixinho, que por mera questão dinástica acabou esparramando o traseiro exatamente no trono de França!

Naqueles tempos acho que o nome da hora, lá no país da Gália, era Luiz. Tanto era que o país, se não estou enganado, teve dezoito monarcas com esse nome e mais um de quebra, o Luiz Felipe I, que abdicou em 1848.

Caraca! Pensei. Se na corte havia inflação de Luizes, como seria lá pras bandas do pessoal da muvuca?

Pois bem, não é que o Luiz do qual estou falando, o rei, o Luiz que se achava o melhor da foto, acabou se vestindo com o codinome de “Rei Sol”? Ora bolas, que pretensão? Afinal, de onde viria o esplendoroso brilho para compará-lo ao Astro Rei do Sistema encalacrado nessa confusa galáxia?

O homenzinho, vaidoso como ele só, não gostava nada de ter nascido nanico. Não se sentia nada bem ao comparar seu tamanho com o dos circunstantes, na corte e, principalmente, quando a desmedida se dava diante das mulheres.

Não fica difícil entender, então, a razão de buscar formas para superar essa diferença madrasta criando subterfúgios para acalmar seus íntimos sofrimentos. Como era rei, quem poderia ter mais brilho do que ele? Sentindo-se a fonte da radiação e, numa postura de astro diante dos seus planetas e satélites, impôs a aceitação de um brilho que só poderia estar relacionado com o próprio Sol do firmamento.

Não demorou nada para que dentro e fora do reino fosse mencionado com o título mais que nobiliárquico, de “Rei Sol”. Mas, somente um apodo não iria trazer a satisfação plena que transformara um nanico em gigante, de um dia para o outro.

Aqui, neste ponto, é preciso dizer que tanto as más quanto as boas línguas diziam, tanto à boca pequena quanto à escancarada, que Luiz XV era viado. Sim! Era viado de carteirinha e, naquela época esse predicado nada tinha de politicamente incorreto. Ainda não havia sido criado o gayzismo e, portanto, nenhuma lei coibia o emprego do tal predicado!

Influenciado por essa questão comportamental, o Rei Sol entendeu que a elegância era uma virtude que deveria imperar pelos corredores e salões do Palácio de Versailles. De uma só penada, convocou seus subordinados imediatos e determinou drástica mudança na indumentária dos homens da corte, de modo a que passassem a utilizar gibões e casacos debruados, com enfeites e demais adereços, bem como camisas com mangas longas, rendas e bordados aparentes.

Com toda essa transformação, ainda não satisfeito, cuidou de dar tratos à bola e concluiu que o andar, para se tornar mais elegante requeria a utilização de sapatos com saltos altos. Certamente, isso propiciaria a elegância desejada, bem como faria com que homens e mulheres ficassem com as respectivas bundas divinamente empinadas e rebolantes.

Esse estratagema seria, ainda, o remédio adequado para aparentar uma altura com a qual poderia competir e se impor aos súditos, cortesões e demais reinóis

Pronto! Estava inventado o sapato de salto alto! Mas, não ficou só nisso! Um gaiato que vivia nos arredores do Palácio, um sujeito que vivia da profissão de ferreiro e que não entendia muito as loucuras do coroado, acabou espalhando que o rei havia se inspirado no Diabo!

A princípio, numa época em que a religiosidade era acendrada e a história das heresias mandava muita gente para a fogueira, o ferreiro corria fatal perigo pois isso dava a entender que havia uma certa parceria entre o Rei e o capeta. Não foi muito fácil entender a razão de ter escapado da denúncia por algum purpurado, circulante das catedrais.

No fundo, isso até poderia ser acolhido, por aquelas dignidades, em razão da culpa estar sendo atribuída ao supremo chefe do andar de baixo, inimigo figadal e milenar da cúria

Para o ferreiro, o primeiro viado que apareceu no mundo foi o dito cujo, o Diabo em pessoa, pois o tal de salto alto foi inventado lá no inferno, quando, também, desejoso de andar rebolando, arranjou um jeito de tirar as pernas naturais e colocar as atuais, de bode, com o casco daquela altura que conhecemos.

Ora! Para o ferreiro, religioso fundamentalista, lá no inferno não havia sapateiro e ninguém usava calçados. Todos andavam descalços, mas havia cirurgiões plásticos mexendo nas coisas que Deus moldou.

Foi então, que o desinfeliz reparou a altura dos cascos de um bodão preto que andava pelas suas propriedades e achou que poderia rebolar muito bem com aquilo.

Pronto! Segundo, o ferreiro, foi baseado na invenção do demo que implantou-se, em Paris, a moda do salto alto que tanto agradou ao rei.

Se isso corresponde à verdade, não posso garantir. Todavia, pelo menos alguém nos dá a dica de que a viadagem começou, mesmo, foi lá nas profundas dos infernos e o rei cuidou de copiar...

Deu no que deu...

Amelius

Sobradinho-DF

08/11/2014

Amelius
Enviado por Amelius em 09/11/2014
Reeditado em 09/11/2014
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