Suicídio Solar
Mais uma vez o sol brilhava. Vívido. Orgulhoso. Avisando aos pássaros que cantassem, à neblina que cessasse, aos homens e mulheres que a vida, desinteressada, continuava existindo a despeito de suas existências desnecessárias. Mas uma, e apenas uma, flor ainda não desabrochara. Ele esperou. Observou, enquanto todo o resto ocorria em uma ordenada e bela sintonia. Porém, aquela única flor, ainda insistia em esconder de seus olhos suas pétalas amareladas e largas, como as de suas irmãs. Ele foi dormir. Novamente acordou, tocando seus sinos para o despertar. E aquela solitária flor continuava em reclusão, coberta pelo sereno, como se houvesse derramado lágrimas pela sua ausência noturna. O sol esperou. Observou, por mais uma vez, a ordenada sinfonia das existências, já ficando triste e enraivecido. Por que ela não despertara? Por que não se mostrava diante de seu bem-feitor, aquele que lhe fazia brotar, crescer e desabrochar para o mundo? Talvez lhe faltasse forças, pensou ele, brilhando com mais intensidade. A flor não reagiu. Brilhou ainda mais. A flor continuou guardada em sua morada. Então, sem se importar com mais nada, ardeu, como nunca havia feito.
Tudo secou. A vida simplesmente sumiu. E a flor finalmente abriu-se para contemplar seu carrasco, virando cinzas e se perdendo ao vento. O sol, desesperado ao ver que tudo consumira em sua ânsia, sem mais ter a quê aquecer, enfim esfriou. De uma vez. E para sempre.