Christine, Violet Woman

Meu nome é Christine. Minha vida não parece ser muito interessante, mas talvez alguém goste de saber sobre ela. Ou talvez não. Algumas histórias não vendem tanto como outras...

Nunca fui como as outras meninas. Eu era diferente. Era popular. Era linda, desejada. E fazia disso uma arma a meu favor. Sempre pronta a subir, subia. E quando estava no topo, derrubava todos, para reinar sozinha. Foi assim no colégio, desde a quinta série. Muito estranho contar isso, mas eu era tímida, cheia de sonhos, desejos. Queria ser uma mãe. Ser filha. Mas pobre de mim: não fui nada. Hoje, depois de tempo passado, banho-me de novo nas águas de um rio que corre... Sem saber que eu não sou mais a mesma, e tampouco o rio, continua o mesmo. A vida mudou. Sou outra: não tão diferente assim. Mas um pouco mais receosa de voltar para casa. Queria rever minha família, tenho saudades dos domingos e dos almoços. Ah! Se eu pudesse contar as voltas que a vida deu, veria que eu ainda tenho muitas moedas... Triste saber disso...

Muito bem. Foi em 13 de março de um ano, não muito distante de mim, que eu conheci Camacho. Que quimeras moveram-nos para este encontro infeliz. Ele um jovem músico, esperando que a vida lhe desse tudo. E ela, por incrível que pareça, dava. Eu? Uma jovem universitária. Sem rumo, sem saber de meu futuro, e muito menos de meu presente. Era estranho, mas eu podia aceitá-lo como ele era. E ele, podia me amar. Isso para mim bastava. Mas foi em 27 de julho, do ano seguinte, que tudo mudou. Eu estava no terceiro ano de um curso que não esperava nada de mim, e de quem eu muito menos gostava. Estava confusa com a vida. Foi neste dia, que brigamos. E neste dia que nos perdemos de vez. Ele se foi. Por muito tempo esteve fora e nunca mais voltaria. Neste dia ele me disse: - Eu te amo, mas não posso agüentar ver você se desfazendo... Eu te amo meu amor, meu um amor. E eu, não podia amá-lo. Eu era popular. Esperava muito da vida, e o que um músico mal sucedido poderia me oferecer? Foi então, que pronunciei a frase mais cortante de toda a minha existência: - Mas eu não posso te amar... Ele se foi. E eu também. Nos fomos para mundos diferentes. Eu poderia voltar, ele não...

Depois de Camacho eu nunca mais amei ninguém. Nem mesmo a mim. Resolvi sair. Queria conhecer o mundo, viver o que a vida tinha para ser vivido. Afinal, nunca fui como as garotas. Não era boa, do tipo que escreve sua vida. Nem má, do tipo que não tem tempo para isso. Eu? Só vivia minha vida. Lembrava-me todos os dias de Camacho, mas sempre com uma dor na minha alma. Como se ele estivesse sempre faltando... E estava. Mas eu fui. Juntei tudo o que tinha. Abusei de minha popularidade, de meus falsos amigos, de minha vida “fútil”, e fui para Paris. Queria conhecer a vida. Queria experimentar o mundo. Cheirar o amor... Sentir os rumores do prazer, e quem sabe, amar novamente...

E fui. Em 31 de dezembro, daquele nebuloso e confuso ano, desembarcava em Paris. Não tinha rumo. Precisa viver. Não sabia que seria tão difícil a vida neste novo mundo. Tão diferente do meu Brasil. Do colo de minha mãe, das broncas de meu pai e da “popularidade” que me cercava. Eu não sabia que seria tão difícil. Mas precisava ser forte, estava em Paris.

Foi no ano novo, que vi. Era tão bela, a Torre acesa. Brilhando por mim. Mas na verdade, eu preferia imaginar assim. Ela não brilhava por mim, muito menos, sabia de minha existência. Quando deu meia-noite, não tinha para quem desejar feliz ano-novo. Via os namorados se abraçando, fazendo juras de amor. Os esposos, gay e heteros, abraçando-se carinhosamente. Via o mundo sendo feliz. E eu? Sem ninguém para dar o feliz ano-novo.

Passaram-se as festas, e eu precisava de um lar. Foi quando passei na rua, não direi o nome, e vi duas mulheres fumando. Elas sorriram, e perguntaram o que eu queria. Disse que precisa de um lugar. Elas sorriram e me disseram que havia um lugar. Eu, onde? Elas me mostraram o “Madame Bovary”. Que lindo era. E claro eu sabia o que ele era. O que seria de mim?

Uma jovem sem rumos. Cheia de amor pela vida, de uma “popularidade” apagada, morta.

As duas tornaram-se minhas melhores amigas. Danielle e Camille. Danielle tinha seus vinte e poucos anos. Era bela sim, tinha muitos clientes e muitos amantes. Camille era tola. Inocente. Eu? Sentia-me suja todas as noites. Passava horas imaginando, e sentindo saudades de minha casa. Minha antiga vida. Meu mundo. Éramos três mulheres. Cada uma com seu destino. Cada uma com seus sonhos. Cada uma com seus homens...

Catharine D’Bourbon era nossa meretriz. Nossa protetora. Eu gostava dela, e todas de mim. Eu era uma jovem princesa. Meu trono era a cama e meu Rei mudava todas as noites. Era estranho, mas eu pensava todas as noites em Camacho. No quanto seria bom revê-lo... No quanto minha vida mudaria. Era minha única esperança... Tola de mim. A esperança é sempre a ultima a morrer. Mas quando chegamos ao fim. Ela morre.

Eu fui apelidada de Violet Woman. Por quê? Nunca entendi bem. Tive muitos amores: Juan, Carlos, Augusto, Tiago, Jean, Chaules, Higor, Gustavo. Nenhum como Camacho. Eu experimentei tudo. Era uma prostituta sem sonhos. Nada mais lucrativo para o Bovary. Eu lia os romances de outrora, e preferia a realidade. Suja, vulgar e hipócrita. Era tão difícil para mim, mas eu adorava o que fazia.

Sei que posso parecer um pouco ingênua em dizer isso, mas eu era uma verdadeira puta. Cheia de mim. Sabia o que fazer. Sabia como fazer. Todos me amavam. Eu? Como podia amar alguma coisa? Meu coração estava frio, eu estava livre dentro de minha prisão: a vida. Os peixes são livres na imensidão do mar. As aves livres na imensidão do ar. E os homens? Livres na imensidão do tempo... Eu? Era livre na imensidão de um suspiro.

Tive vários abortos. Matei. Morri. Cada vez perdia mais de mim, e encontrava mais da vida. Eu era a pior mulher que poderia conhecer. Eu não podia ter meus filhos, foram tantos que eu já não sabia se um dia poderia ser mãe. Ah! Que saudades sinto de minha casa. Lugar este, que talvez não exista mais...

Foram-se três ou quatro anos de minha putificaçao. Fui canonizada puta. Queria sê-lo. Nunca menti para mim sobre meus desejos, sobre minhas loucuras. Visitei o mundo, ao lado dos amantes mais improváveis: com Juan conheci a Espanha, com Carlos a Bolívia. Com Jean o Texas. E assim eu fui. Ora aqui, ora ali. Mas sempre sem um lar. Sempre voltando para aquela rua... Sempre suja. Sem rumo. Sem poder fugir de mim mesma, ou quem sabe encontrar um lugar para chamar de lar.

Em julho, de algum ano, que não sei mais se existiu, eu revivi. Não sei como, eu vi o meu amor. Não era Camacho. Mas era a vida. O amor. Eu conheci Francisco Fernandes. Um espanhol, que vivia em Nova Iorque. Ele era alto, magro. Tinha os olhos verdes, o nariz grande – meio italiano – e a boca rosada. Em um tom leve. Eu? Não vem ao caso. Mas ele me amou. E eu não podia fugir, sentia por ele alguma coisa. Algo estranho. Algo que não podia ser evitado. E se não podemos evitar, que seja feito.

Sonhava com ele todas as noites. Via ele todas as manhãs. E a cada dia que passava eu me apaixonava mais e mais por ele. Queria ser dele, e que ele fosse meu. Eu o amava. Ele me pediu para ir embora com ele. Ele pagou para Catharine. Pediu a ela. Eu disse que sim.

Estava tudo pronto. Camacho havia saído de minha mente. Eu estava apaixonada por ele. Ele por mim. Nós estávamos esperando apenas que o sol amanhecesse. Mas algo aconteceu. Pela primeira vez, ele não estava em meus sonhos. O que estava em meus sonhos foi o dia que embarquei. Eu fiquei pensando no meu passado. Em minha mãe, meu pai. Meus sonhos. Tudo o que desejava quando criança. De minha adolescência e meus três anos de faculdade. Minha paixão por Camacho. E todos os nossos sonhos. Minha “popularidade”, meu amor pela vida. E eu vi, que eu tinha me tornado algo que estava longe de mim mesma. Era outra de mim, vivendo dentro de mim. Era estranho isso. Mas seria assim...

Quando amanheceu, eu deixei um recado para Francisco. Acordei Danielle e Camille, e me despedi de Catharine. E fui embora. Precisa ir para o mundo...

Eu era uma dama na sociedade. Uma puta na cama. E uma mulher presa na vida... E do tempo, eu seria apenas um momento. Um suspiro.

Era estranho... A vida é engraçada. Eu deixei a felicidade ir embora, primeiro por medo. Depois, por ter gostado da vida como ela era. Lágrimas correm de meus olhos agora. E agora? Por que eu deixarei o amor partir? Por medo? Por gostar de aproveitar a vida? Por amar a vida tanto quanto uma puta?

Eu sou uma rainha. Meu trono é a cama. Meu Rei muda todas as noites. E meus súditos são meus amantes. Meu castelo é o mundo. E meu reinado... Este é como um momento. Nada mais que um simples suspiro...

"Leiam minha apresentação: http://www.recantodasletras.com.br/cartas/2394709"

Le Vay
Enviado por Le Vay em 15/05/2010
Reeditado em 23/07/2010
Código do texto: T2259335
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