Meus amores fantasmas de Blumenau

Blumenau em Santa Catarina é talvez a cidade mais germânica do Brasil. Morei e trabalhei naquela cidade durante 7 anos. Helke hering Bell, saudosa amiga, era escultora e assombrou a Europa ao trabalhar em seu atelier, cortando grossas chapas de aço, que utilizava como elemento de suas esculturas. Eu, na época possuía um estúdio onde produzia fotografia industrial como complemento ao meu estúdio de criação. Sempre gostei de pintar embora na época me dedicasse mais a fotografia por motivos óbvios. Helke vez por outra me solicitava alguns quadros, que vendia na galeria AçuAçu de sua propriedade, principalmente à turistas que visitavam a cidade em bom número. Eu pintava mais por prazer do que propriamente como um meio de vida. A fotografia me dava muito mais dinheiro. Sempre fui um mulherengo inveterado e a fotografia por natureza, principalmente a fotografia de moda, me colocava permanentemente em contato com belas mulheres. Mas Blumenau esconde mistérios, para os quais busco ainda hoje uma explicação. Dentre vários, dois envolvendo belas mulheres, me fascinam até hoje, porque não fazem o menor sentido, mas aconteceram e estão ainda bem claros em minha mente. E embora no decorrer dos anos tenha buscado uma explicação, ficaram na verdade, envoltos em mistério e fazem parte da grande quantidade de casos misteriosos que nos envolvem e para os quais ninguém tem uma explicação. Talvez existam para ser vividos e não para ser compreendidos. O primeiro foi na época em que morava lá e o segundo anos mais tarde quando já havia voltado para Porto Alegre, mas ainda atendia vários clientes daquela cidade. Certa noite de verão, eu saí do estúdio e resolvi ir ao cinema. Havia uma única sala de exibição numa cidade que não oferecia muitas opções além dos tradicionais restaurantes típicos. Subi a rua 7 de Setembro e estacionei diante do cinema. O cartaz anunciava um filme nacional obviamente pornô, ( a maior produção nacional da época). Confesso que este tipo de filme, não me faz a cabeça. Não vejo graça em ver os outros fazendo aquilo que podemos fazer sem problemas. Pensei!

– Acho que por hoje vou precisar achar outra coisa.

– Ta a fim de puxar um cineminha? A voz feminina e doce soou aos meus como música. Virei-me e meus olhos depararam com a bela visão de uma linda loura, trajando um vestido preto para noite e me chamou a atenção pela elegância no vestir talvez exagerado para aquela hora da noite, pois eram apenas cerca de 19:30 h.

– Não sou muito chegado neste gênero, respondi enquanto fazia uma radiografia completa da minha bela aparição.

– Você gostaria de dar uma volta? Perguntei.

– Sim acho legal. Concordou. Saímos e retornei pela avenida Beira Rio subindo novamente a rua 7. Helga, quase não falava, ouvia com atenção tudo o que eu dizia e vez por outra manifestava uma ou outra opinião. Lembrei-me que era hábito aquele passeio indo por uma via e voltando por outra. Os habitantes locais fazem isso após a janta formando uma fila de carros, como uma procissão que vai até tarde, principalmente no verão. Convidei-a para jantar e fomos ao restaurante chinês, pois ela não queria comida típica. Jantamos e resolvemos ir a uma Boate de um amigo meu de cuja decoração participei com alguns painéis fotográficos. Dançávamos ao som de um conjunto que tocava antigos sucessos românticos e ela estava carinhosa e parecia flutuar nos meus braços. Eu a olhava nos olhos e via aquela expressão que nos diz tudo de uma só vez. Saímos finalmente e rumamos obviamente para o motel. Foi uma noite inesquecível e lá pelas 4 da manhã eu a levei para casa. Uma Rua de esquina no bairro Da Velha. Lembro até hoje o número, 459. Uma ampla casa de alvenaria, branca com as aberturas em verde. Beijamos-nos e nos acariciamos demoradamente e depois de me fazer prometer que a veria novamente, nos despedimos. Eu iria a São Paulo na manhã seguinte e ficaria lá uns 6 dias fotografando desfiles para um cliente local participante de uma feira de moda, mas prometi vê-la tão logo voltasse. Levei-a até a porta, nos beijamos e ela entrou acenando enquanto fechava a porta. Na minha volta de São Paulo o vôo foi meio complicado devido a forte turbulência, mas, eu só tinha um pensamento. Helga não me saia da cabeça e isso me fazia esquecer os trancos do voo. Claro que assim que me refiz da viagem que naquela época incluía a viagem de carro do aeroporto de Florianópolis até Blumenu, cerca de 120 km Apressei-me em desfazer-me de alguns compromissos no estúdio e rumei para a casa dela. Eram umas 20 h quando estacionei o carro e me dirigi para a casa. Bati e uma senhora de uns 70 anos ou mais atendeu à porta. – Boa noite! Falei, -A Helga está?

– Helga? A velhinha pareceu surpresa.

– Moço, aqui só moramos eu e meu marido. Não há nenhuma Helga morando aqui. - Mas eu a deixei aqui, semana passada, tenho certeza.

– Moço, a única moça que morou aqui, mudou-se quando compramos a casa, faz mais de 20 anos. Lamento, mas o senhor deve estar enganado. Bem, voltei para o carro e tentava entender o que havia acontecido. Fiquei um tempo olhando a velha casa, não havia erro. Era aquela casa. Resolvi descer do carro e perguntar, afinal, mesmo que não fosse aquela casa, alguém a deveria conhecer, Blumenau não era tão grande assim. A resposta foi sempre a mesma, ninguém a conhecia. Voltei para o centro e fui comer uns camarões no restaurante chinês. O garçom lembrava de te-la visto comigo, mas não a conhecia e não lembrava de que alguma vez ela tivesse aparecido ali. Na boate do Dani, foi a mesma coisa. Ele lembrava dela comigo, mas, mais nada, nunca a vira antes e olha que ele nasceu lá e conhecia todo mundo. Será que havia transado com um fantasma? Mas ela era de perfeito conjunto de carne e osso! Sensual, meiga e carinhosa. Embora passasse ainda algum tempo tentando encontra-la e depois de conferir as únicas 3 Helgas encontradas na cidade, nenhuma tinha a menor semelhança. Finalmente desisti. Não foi um sonho. Sonhos não deixam manchas de batom no pescoço. Tempos depois, vendi o estúdio e vim para Porto Alegre, mas, continuava atendendo clientes de Blumenau e região. O grande Hotel na entrada da cidade, possuía uma boate no sub-solo e eu costumava freqüenta-la quando ia a Blumenau e isso acontecia seguidamente, as vezes chegava a viajar duas vezes por mês. Numa destas viagens estava bebericando um uísque e apreciando os jovens dançando animadamente ao som da discotheque dos anos 70 e me chamou a atenção uma morena dançando sozinha e que me olhava de maneira insistente. Naquela época o som era bem mais comportado, nada tendo a ver com o exagero dos dias de hoje. Me chamou a atenção o fato dela estar dançando sozinha, numa cidade cheia de alemães que não costumam deixar uma morena daquele padrão de beleza desacompanhada por muito tempo. Larguei o copo e saí dançando e procurei aproximar-me da garota. Ela sorriu e insinuou-se bem junto a mim com movimentos sensuais e convidativos. Passamos a dançar e nos olhávamos insinuantemente. O local estava muito cheio e um tanto abafado. Ela aproximou-se e falando ao meu ouvido disse,

- Vamos cair fora daqui?

- Ok, respondi, - você conhece algum lugar? – Sim, sei de um lugar bem legal. Saímos, peguei o carro e falei.

– Ok, você vai dizendo o caminho. Ela acenou que sim e andamos por alguns instantes por uma alameda bastante arborizada.

– É aqui! Falou apontando um grande portão de entrada para carros. Um motel, sem mais delongas. Naturalmente que diante de tão sugestivo convite, não havia nada a dizer, senão satisfazer a vontade da moça. Fomos para o apartamento e naturalmente foi mais uma daquelas noites que só acontecem de vez em quando. Acho que eram umas 3 h da manhã quando exaustos tomamos uma banho e resolvemos pedir um lanche. Sexo dá fome. Convidei-a para ficar o resto da noite comigo.

– Não posso, amanhã ou melhor, hoje levanto muito cedo, tenho que trabalhar.

– Ok, eu a levo para casa. Então notei em seu braço, marcas típicas de agulhas, ainda avermelhadas.

– O que foi isso? Perguntei apontando o local.

– Há!, foi uma bobagem que fiz, mas já passou. Eram marcas de injeções obviamente de cocaína, mas, não era uma prostituta e não estava ali por dinheiro, pois não me pediu nada. Chegamos a uma rua cujo nome não lembro, mas que eu conhecia. Havia uma fileira de casas em estilo europeu, com telhados altos e iguais as outras como costumavam construir condomínios na época.

– Pare aqui, minha mãe ainda está acordada e vai me dar uma bronca. Eu moro ali na terceira casa.

- Ok, nos beijamos e ela me deu uma correntinha de prata com um pequeno coração pingente.

– É pra você não esquecer de mim. Sempre que vier me procure. Adorei sair com você. Despedimos-nos e a deixei. Voltei para Porto alegre e no caminho relembrava a noite anterior. Eu lembrava daquela rua mas não lembrava das casas e na ocasião não dei a menor importância ao fato. Numa longa viagem de carro temos tempo de sobra para relembrar e eu lembrava cada momento. Aquela era uma garota diferente de tudo o que já encontrara na cidade em ocasiões anteriores. Era muito bonita, uma pele morena suave e quente. O tipo de mulher difícil de esquecer. Certamente não era de Blumenau e eu lembrei que nem sequer havia perguntado de onde era. Mas claro que quando voltar irei vê-la. Tempos depois voltei a Blumenau e fui procurá-la e novamente aconteceu. Chegando à rua, as casas eram diferentes? Claro, nada tinham a ver com aquelas casas onde a menina morava. E obviamente ninguém sabia nada sobre ela, ninguém a conhecia. Alma havia evaporado. Ou será que ela existia? Alma? Será? Lembrei que ao saber seu nome havia brincado.

– Alma? Mas você é deste mundo não?

– Claro seu bobo, sabe, gosto deste nome, é pouco comum e acho que sugere um sentimento, como se diz, do fundo da alma.. Claro, agora meu sentimento era novamente de espanto. Lembrei-me da correntinha que guardava na carteira. Sabem? Não achei! Havia sumido também. Deve ter caído em algum lugar.

Lauro Winck
Enviado por Lauro Winck em 26/04/2010
Código do texto: T2220303
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