ESTRANHA FORMA DE DOMÍNIO - CLTS 24

Planeta Terra.

Ano de 2143 do Calendário Gregoriano.

A cerca de 4 décadas, 42 anos mais precisamente, a primeira nave interestelar pousou no nosso planeta. Era o dia 11 de setembro do ano de 2101, a data marcava o centenário da tragédia do World Trade Center e os olhos de todo o planeta estavam voltados para a cidade de Nova York.

Às 11:21 da manhã uma nave de dimensões assustadoras se aproximou da órbita terrestre, e segundo divulgado pelos Estados Unidos só foi detectada no dia do contato. Anos após o acontecido a NASA assumiu que mantivera contato com os forasteiros por anos. 

No dia seguinte ao contato, os primeiros seres alienígenas desembarcaram no planeta água. O mundo punha fim a uma das principais dúvidas da humanidade. Havia, SIM, vida extraterrena.

A imprensa do mundo todo se aninhava em Manhattan. Um palco fora montado para receber as autoridades do planeta desconhecido.

Utilizando-se de tecnologia humana, um tradutor que a agência americana desenvolvera, os alienígenas iniciaram seu discurso.

Vinham de um planeta de uma galáxia exterior, Stygeon, do setor Geonesis, eram cerca de 1.200 indivíduos, todos do sexo masculino e disseram vir em missão de paz. Ofereceram ajuda a um planeta que sofria com a fome, sede, calor e violência. Num primeiro momento, tudo o que pediam era que fossem bem recebidos e que pudessem conhecer um pouco da cultura e vida dos humanos.

Fisicamente a aparência deles foi descrita de tal maneira: tinham cerca de 1,60, o tom da pele azulado e o crânio alongado para a posterior, os olhos eram grandes e negros. Não portavam armas.  Era praticamente impossível diferenciar um indivíduo do outro tamanha a semelhança, não usavam traje algum, exceto o líder que empunhava uma espécie de cajado de cristal e vestia uma túnica branca de um tecido extremamente fino.

Os humanos concederam a eles as principais mentes do planeta para que pudessem compartilhar experiências e tecnologias. Ao contrário do que muitos imaginavam, os visitantes tinham muito o que aprender com os humanos e assim o fizeram por cerca de 18 meses.

Além de conhecimento e tecnologia, os dois povos também realizaram intercâmbios não intencionais. A troca de microrganismo. Doenças Humanas os infectaram e nós, humanos, fomos atacados por doenças alienígenas. Uma destas infecções levou a terra ao estado que encontramos hoje.

Uma bactéria de origem humana, mas que sofreu mutação ao infectar um alienígena, atacava os testículos humanos silenciosamente e só foi identificada após as taxas de natalidade no planeta caírem bruscamente. Estima-se que já no primeiro mês de contato tenha acontecido a mutação e a subsequente infecção de alguns humanos. A transmissão se dava pelo ar e a ausência de sintomatologia ocasionou uma disseminação sem controle. Demorou muito pouco para que uma parcela gigante da população estivesse infectada. Em março de 2102, 6 meses após o primeiro contato com os alienígenas, estima-se que 95% dos seres humanos do sexo masculino não tivessem mais condição de se reproduzir. No mesmo mês foram identificadas 14 gestações de bebês híbridos, filhos de mães humanas e pais ET’s. O mundo se perguntava como baixíssima taxa de natalidade afetaria o futuro da terra e o que esses híbridos seriam. Órgãos de defesa impediram que os híbridos fossem estudados, houve conflito entre as nações e vários líderes acusaram os visitantes de serem responsáveis pela situação.

A resposta dos visitantes a tais questionamentos foi catastrófica para os humanos. Os alienígenas sitiaram o planeta, levaram as principais mentes do mundo (a grande maioria foi de bom grado), e destruíram todo o sistema de comunicação e infraestrutura do planeta. A destruição dos cabos submarinos de fibra óptica e dos satélites deixou o nosso planeta literalmente no escuro. A queda da Internet causou um colapso sem precedentes. Bancos não permitiam que os usuários pudessem usar seu dinheiro, e sem dinheiro não se podia comer ou abastecer o seu carro. Mercados, instituições bancárias e hospitais não tinham condições de funcionar. Os voos não podiam acontecer sem controle aéreo. Trens e metrôs nas grandes metrópoles não rodavam. Não demorou para que as populações de todo o mundo se rebelassem. Houve saque, depredação e morte. Só conseguiram restabelecer a comunicação entre países desenvolvidos cerca de 5 anos depois. Alguns países na África e na América Latina nunca mais tiveram internet restabelecida. Em 10 anos a população da terra havia caído de 7.5 bilhões de habitantes, números de 2100, para pouco mais de 4 bilhões. Hoje o planeta tem uma população estimada em cerca de 20% do que éramos no alvorecer do século, cerca de 1.5 bilhão, isso nas projeções mais otimistas. Além da taxa de natalidade, outras doenças assolaram o planeta após a partida dos alienígenas. A escassez de alimentos ocasionou um alto nível de desnutrição nos países desenvolvidos. Sem infraestrutura, os grãos e proteína animal não chegavam aos grandes polos. As grandes cidades foram as que mais sofreram. Houve uma enorme tentativa de êxodo para as áreas mais afastadas, mas a grande maioria dos habitantes pereceu.

Apesar de todas as adversidades, a espécie humana insistia em sobreviver.

No Sertão de Minas, um pequeno vilarejo onde um dia a cidade de Nanuque prosperara, tentava se manter de pé graças a coragem de alguns veteranos.

O sol escaldante ardia no pátio da igreja onde, no passado distante, havia acontecido por mais de uma centena de anos a festa em nome do padroeiro da cidade. Dentro da antiga igreja matriz, o líder da resistência traçava os passos que deveriam ser postos em prática a seguir.

Jhonny Bitsu, liderava os poucos sobreviventes do povoado. A antiga cidade polo da região em outrora havia se tornado um mero vilarejo com não mais do que duas centenas de maltrapilhos que dispunham de algumas armas que haviam “saqueado” do prédio da polícia e de corpos após os vários conflitos.

A região era assolada por bandoleiros, fome e doenças, mas o que mais afligia os cidadãos eram as “feras da noite”.

Um grupo de criaturas não humanas aterrorizava as pequenas cidades.  Segundo relatos, seriam os híbridos que haviam sobrevivido e se multiplicado. Eram bípedes com braços tão longos que se arrastavam no chão. Tinham garras e dentes afiados que estraçalhavam suas presas.

No início, se alimentavam de pequenos animais de sangue quente como galinhas e pequenos porcos, mas em grupos maiores e sem nenhum tipo de predador se tornaram extremamente agressivos e passaram a ter um comportamento diferente se alimentando de grandes animais e principalmente de humanos.

JB, como o líder veterano era chamado pelos seus subordinados, tinha perdido 6 homens em campo nos últimos meses para as aberrações. Os últimos haviam saído para uma patrulha para resgatar algumas vacas que haviam escapado do estábulo municipal e não voltaram. Pelo menos não inteiros. Um cachorro de rua, daqueles “caramelo”, foi encontrado com um braço humano na boca alguns dias após o desaparecimento e o líder reconheceu o braço do Major Oliveira por meio de uma tatuagem com o nome do filho do homem, Jonas, que o membro carregava.

O plano do grupo era tentar chegar a uma cidade grande para encontrar pessoas e tentar agregar mais membros, mas não sabiam como sair do vilarejo sem serem atacados. Mais do que isso, não sabiam qual cidade procurar e nem se haveria ajuda. Além disso, boa parte do grupo já não tinha condição de viajar longas distâncias e nem de se defender de maneira adequada devido à idade avançada.

O sol começava a sua despedida no fim de mais um dia. Ordens haviam sido designadas para que as defesas da igreja matriz no período noturno fossem reforçadas. As criaturas tinham predileção pela penumbra para atacar humanos.

Oito homens fariam a defesa da matriz na noite que seguiria. As grandes portas de cedro-vermelho tinham recebido travas de Jacarandá para aumentar a resistência. As grandes janelas que outrora ostentavam vitrais haviam recebido grades de aço de 2 polegadas (5,08 cm).

John sabia que ele e seus homens tinham os dias contados e que estes não seriam muitos, mas não podia imaginar que aquela seria a sua última noite ali.

Um dos encarregados da defesa das portas acabou bebendo mais do que devia. Esqueceu de conferir a posição da trava e deixou uma fresta na porta. Uma criatura se esgueirou pelo vão e estraçalhou a garganta do guarda desavisado. A tropa acordou com o grito curto e pavoroso do homem. Em poucos segundos o local estava tomado, os gritos e o estampido de disparos de arma de fogo eram ainda mais enlouquecedores devido à acústica do recinto. Jonh se arrastou até o altar, uma das feras havia rasgado a sua coxa com as garras e pelo volume do sangramento havia provavelmente rompido a sua artéria femoral. Ao pé do Cristo crucificado, ele tirou do bolso um dispositivo com um interruptor. Fechou os olhos e lembrou da terra antes dos visitantes. Sentiu o cheiro do cabelo da esposa e o calor do abraço dos filhos. Chegara a hora de encontrá-los. Apesar da dor e da pontada de frustração por não salvar a cidade, havia algo que aliviava tudo. A certeza de que a quantidade de explosivos nas pilastras da antiga igreja seria suficiente para dizimar boa parte do maldito bando que aterrorizava o seu povo. Antes do golpe final, descarregou a pistola 9mm numa das criaturas, atraindo ainda mais membros do bando para próximo de si. A besta, mesmo cravejada de balas, se arrastava na direção dele. Fechou os olhos e apertou o interruptor. A cidade sobreviveria, pelo menos por mais um tempo, e a esperança de que alguém no mundo lembrasse da existência deles também.

Tema: Mundo pós-apocaliptico