A FAZENDA MAL ASSOMBRADA.

-"Só chegam boletos pelos correios!" Reclamou Anastácio. A esposa abriu o armário. -"Nosso último litro de óleo. Ontem acabou o feijão." Anastácio tirou os óculos. Esfregou, nervoso, as mãos no rosto. Um suspiro. -"Estamos iguais aquele filme, cara Francisca! A espera de um milagre!" Ele olhou para o crucifixo na parede. A campainha tocou. -"Meu Deus! O seu Otair veio cobrar o aluguel!" Gritou a mulher, olhando pela janela. -" Direi a ele que fui despedido da firma. Essa pandemia mexeu com tudo. Paciência." A campainha novamente. Anastácio se levantou. -" É um homem de terno. Nunca o vi mais gordo!" Disse ele. O cachorro acompanhou o dono até o portão. Anastácio mediu o sujeito da cabeça aos pés. -"Boa tarde. Em que posso ajudar?" O outro ajeitou o nó da gravata. Suava, devido ao sol forte. -"Boa tarde. Sou o advogado Genivaldo, da Gomes e Gomes Advocacia." Anastácio achou melhor não abrir o portão. -" Não vou assinar nada, moço! Não me leve preso." O cachorro latiu, pressentindo o nervosismo de seu dono. -"Não se preocupe. Esse é o endereço que me deram. Quero falar com Anastácio Borba da Silveira Gusmão!" Anastácio odiava seu nome comprido. Ele ergueu o indicador. -" Sou eu!" Resolveu abrir o cadeado do portão pois começou a chover. -"Entre moço. A casa é sua." O outro protegeu a maleta e entrou. O corredor. O cão estava dócil. Anastácio abriu a porta. -" Francisca. Esse advogado quer falar comigo." A mulher olhou desconfiada. -"Tarde, moço. Isso é coisa da Jurema que botou na cabeça que o filho dela é seu. Até hoje não engoli essa história, Anastácio. Ela está pedindo pensão alimentícia, certamente. De onde você vai tirar dinheiro, homem de Deus?!? Olha, se for isso, eu volto pra casa da minha mãe! Você, que vá viver com suas quengas pois eu não te quero!" Anastácio deu um suspiro e ofereceu uma cadeira ao homem, boquiaberto e assustado com o falatório da mulher. -" Muito obrigado. Bem, não é sobre dívidas ou pensão. Eu lamento informar. E, puxa! Dizer isso não é fácil! Bem, o seu tio Waldemar foi a óbito!" Anastácio olhou para a esposa. -"Foi aonde? Essa cidade fica na Itália, por acaso? Esse Waldemar, quem é?!?" Perguntou Anastácio. O homem abriu uma pasta e retirou uma fotografia preto e branco. Um homem sisudo, careca, com um grosso bigode e olhar penetrante. -"Esse é seu tio, o barão Waldemar Borba. Ele vivia num lar para idosos e faleceu com cento e treze anos." Waldemar estava surpreso. Francisca não se conteve. -"Eita, velho feio." Ela resolveu se sentar. -"Prosseguindo, o falecido barão não tinha herdeiros pois seus filhos já partiram dessa pra melhor. O governo iria tomar posse de tudo o que pertencia ao barão. Verificamos os documentos e fotos do casarão, minuciosamente. Uma meia irmã. O barão tinha uma meia irmã, de nome Rosilene. Francisca deu um tapa na cabeça de Anastácio. -"Só faltava essa louca ser a sua mãe!? Ela se chamava Rosilene." Anastácio se virou. -" Mais respeito. Era doida mas já morreu, quando eu tinha dez anos." A chuva continuava. -"Prosseguindo, se me permitem. Rosilene Borba teve um único filho, correto? Tenho que conferir seu documento, senhor!" Anastácio se ajeitou na cadeira. A mão começou a coçar. Estava tremendo. -"Sim. Esse era o nome dela. Eu era criança quando ela morreu." Ele odiava aquele sobrenome. Odiava quando os meninos do internato o chamavam de Borba. Agora até que soava bem. Anastácio se levantou e abriu uma gaveta. Entregou um documento de identidade ao homem. Ele colocou os óculos. -" Hummm. Correto, meu caro Anastácio. Tudo confere. O senhor é o único herdeiro da fortuna do barão Waldemar Borba. Meus parabéns." Anastácio não estava acreditando. Francisca foi até o quintal. -" Não tem nenhuma equipe de televisão aqui fora. Não é pegadinha, Anastácio!" Gritou a mulher. Anastácio cumprimentou o homem. -"Isso quer dizer que estou rico?" Anastácio se ajoelhou e agradeceu aos céus. . -"Podemos dizer que sim. O barão só deixou uma fazenda, a Cruzeiro do Sul, em Minas Gerais. Uma fazenda bem grande, com um belo casarão no estilo colonial." Anastácio quase foi derrubado pela esposa. -" Me dê um abraço, homem. Estamos ricos!" Francisca abriu a geladeira. -"Vamos brindar com água mesmo." Eles brindaram, felizes. -"Se desejar, posso ser seu procurador e assistente. Nossos escritórios estão a sua disposição, senhor Anastácio!" Disse o advogado, gentil. -"Que bom ser chamado de senhor. Ultimamente, só os porteiros me chamavam de senhor. Está contratado então." Francisca estava feliz. -"Olhe como Deus é maravilhoso e o mundo dá voltas. Há um minuto estava no fundo do poço, agora é dono de fazenda, Anastácio!" O advogado tirou muitos papéis da maleta. -"Preciso que assine aqui, reconhecendo nosso escritório como seu parceiro. Esses são as escrituras, fotos e documentos da fazenda. Eis meu telefone, senhor Anastácio. Poderei levá-los até a fazenda, quando quiserem!" Anastácio se beliscou. Parecia viver um sonho. -"Curiosidade, meu amigo. Essa fazenda vale quanto? Em reais, bufunfa, gaita, faz me rir, money, cash???" O advogado riu. -"Bem. Há o casarão, a antiga senzala, as terras produtivas, as vinte casas da colônia, o riacho, a antiga mina. Eu calculo, por cima, uns doze milhões de reais." Francisca quase caiu para trás. Anastácio pediu para o advogado repetir. Era muito dinheiro. -"Jesus! É muito bom pra ser verdade!" Disse o agora milionário Anastácio. -"O barão, seu saudoso tio, tinha um pouco de dinheiro no banco. Esse valor é seu, meu senhor." Francisca abraçou forte o marido. -" Esse é meu homem, fazendeiro!" O advogado segurou o riso. -"O gerente Ednilson, do Banco do Brasil, está ciente de tudo. Vou ligar e informar que o senhor é o herdeiro. Assim, poderá ir até a agência central e transferir o dinheiro para uma conta sua. Poderá sacar a quantia que desejar, senhor Anastácio." Disse o advogado. -"O senhor disse que era um pouco de dinheiro? Será que vai ter o suficiente para irmos até a fazenda?" Anastácio estava preocupado. -" Certamente. Há quinhentos mil reais no banco!" Anastácio quase engasgou com o copo de água. -" Quinhentos mil? Meio milhão! O senhor acha que é pouco?!" O advogado guardou os documentos. -" Perto do que havia antes, sim. Seu tio sustentou, em segredo, a casa de repouso onde viveu seus últimos vinte anos de vida. Não sabemos o motivo dele escolher viver numa casa de repouso, sendo tão rico! Era um bom homem." Anastácio olhou para a foto do barão com carinho e admiração. Francisca beijou a foto. -"Lindo demais. Um homem nobre o barão!" A chuva passou. O advogado se levantou. -"Tem meu telefone, senhor Anastácio. Eu tenho que ir." Anastácio e Francisca levaram o homem até o portão. O cachorro, talvez pressentindo a boa vida que iria levar, não os acompanhou. O casal ficou olhando o carro do advogado dobrar a esquina. Eles se olharam. Anastácio ergueu a mulher e a beijou. -"O homem poderia ter nos dado um dinheiro ou um cartão, Anastácio!" Ele ficou sério. -"Talvez não deu por segurança, minha Chica. Não é certo andar com tanto dinheiro por aí. Vamos orar e agradecer por esse milagre. Amanhã iremos ao banco. Vamos tirar um pouco e pagar o aluguel atrasado. Não podemos falar para ninguém que ficamos ricos." Francisca estava feliz. -" Quero entrar no mercado, sem lista de compras. Quero pegar o que eu quiser e encher quatro carrinhos de compras." Anastácio sorriu. Uma semana depois. Anastácio e a esposa foram ao escritório de advocacia. Tinham comprado um carro popular. -"Pra quem nunca teve carro, está bom demais!" Disse ele ao advogado. O casal estava bem vestido. -"Estamos prontos pra conhecer a fazenda Cruzeiro do Sul, que era do meu tio barão." Disse Anastácio. O advogado foi categórico. -"Está certo. Eu poderei acompanhá-los mas terei que retornar em seguida. Minha tia, Catarina, está doente. Eu tenho que fazer companhia a ela. Não posso ficar na fazenda com vocês!" O casal concordou. -" Justo. Fique com sua tia. Podemos ir de avião fretado, mais rápido. Eu vi a rota e a localização da nossa fazenda nesse celular novinho. Veja, tem tudo aqui. Será a primeira vez que voaremos num avião." O advogado enxugou o suor da testa. -" Eu agradeço a compreensão. Estive na fazenda, é linda. Tenho esse compromisso com vovó!" Anastácio o corrigiu. -" Sua tia Catarina! Não é sua tia que está doente?" O advogado ficou vermelho. -"Sim. Titia Catarina. Me equivoquei!" Eles riram. Na manhã seguinte, o casal e o advogado voaram para Minas Gerais. Uma hora depois, o avião de pequeno porte pousou no gramado da fazenda. O casarão azul e branco saltava aos olhos com sua imponência. As grandes janelas e as palmeiras que o cercavam. Os ipês, amarelos e roxos, floridos e exuberantes. As casas da colônia. -" Essa é a fazenda Cruzeiro do Sul. Há um velho trator no galpão, se desejar ir até a cidade de Tapuias, a sete quilômetros daqui, senhor Anastácio." Disse o advogado, olhando para os lados. -" Obrigado, amigo. Volte com o piloto e cuide de sua tia. Vai ser divertido explorar a fazenda com a Francisca!" Anastácio cumprimentou o advogado. O avião decolou. -"Sujeito estranho. Nem desceu direito, não quis entrar no casarão!" Disse a mulher. -" Temos tempo, querida. Temos malas cheias de roupas e muita comida. Muito dinheiro no banco, graças ao saudoso tio barão! Isso aqui é o paraíso." Anastácio abriu o casarão. A porta grande rangeu. O piso de madeira. Francisca abriu as cortinas e as janelas. O vento entrou forte e derrubou um vaso sobre um aparador. Francisca se arrepiou toda. Anastácio a abraçou. -" Calma, querida. Estamos em casa. Isso é lindo." Anastácio fotografava tudo com o celular. O segundo piso. O acesso por uma escada em caracol. Os móveis rústicos. Uma sala de jantar. Um sofá coberto por um lençol. Um piano. Espelhos. Fotos do barão e dia família. Anastácio não viu ninguém parecido com a mãe. -"Estranho. Não tem fotos de minha mãe!?" Uma foto do imperador, Dom Pedro II, com o barão. Os primeiros presidentes da República. Os barões do café. Fotos de antigos escravos num canto inferior. Eles conheceram os quatro quartos. As camas antigas com o um véu protetor. As panelas de cobre nas paredes da cozinha. Uma mesa com quatorze lugares, numa sala ampla. Um fogão a lenha. As penteadeiras. Os lustres. -" Parece que estamos no cenário de novela das seis da Globo!" Disse a mulher. -" Verdade, Francisca. Eu sou o barão Anastácio Borba, minha flor de formosura. Tenho fome." Brincou. A esposa sorriu. -" Não me apetece cozinhar. Eu dispensei as mucamas e aias, meu marido. Por sorte, trouxe pão de forma e outras guloseimas!" Eles vestiram roupas confortáveis, após um banho no único banheiro da casa. -"Um casarão desses e um único banheiro decente. Foi adaptado e dá pra perceber que o chuveiro é novo!" Disse a mulher. -"Esse casarão é antigo, mulher. Não existiam chuveiros. Os banhos eram tomados em tinas, bacias ou nos riachos. Quando tomavam banho!" Anastácio tinha pesquisado sobre os hábitos do período colonial. Andaram por todo o lugar. -" Vamos ter que gastar um pouco pra reformar isso tudo. Podemos transformar o lugar numa pousada com restaurante, querido!" As casas da colônia estavam fechadas. Algumas delas estavam em ruínas. Francisca chorou, ao ver na senzala, os instrumentos de tortura dos escravos. -" Meu Deus. Esses coitados trabalhavam muito e ainda eram maltratados!" Anastácio concordou. Havia um grande pátio para secagem de café. Uma mata não muito longe dali. Podiam avistar o riacho. A noite caiu. Anastácio acendeu três lampiões de gás. Um céu explendoroso, como jamais viram. Estrelas enormes. A visão linda da via láctea. O Cruzeiro do Sul, que dava nome a fazenda, majestoso na abóbada celeste. Anastácio e Francisca estavam radiantes. Uma luz ao longe. -" Tem gente naquela casa, querido! É luz de velas!" Anastácio olhou. Uma luminosidade numa das casas da colônia. Eles viram um homem se aproximando. Andava devagar. Um chapéu de palha e um cigarro. Ele acenou. -" Oh, de casa! Boa noite pra vocês!" O casal desceu. -" O advogado não falou que tinha gente morando aqui, Anastácio." Ele abriu a porta. -" Entre, meu amigo. Achei que a fazenda estivesse vazia." O homem sorriu. O casal percebeu que ele tinha alguns dentes de ouro. -"Boa noite. Vazio? Aqui? Nunca está vazio, meu caro Anastácio." O casal estava admirado. O homem entrou e puxou uma cadeira. -" Como sabe meu nome?" O casal também sentou. O homem olhou em volta. -" Perdão. Sou Tinoco, o zelador. Zelador, é isso. Moro na última casa, a dezoito. A dezoito, é isso. Eu vi a luz. Eu vi o avião, o advogado me disse seu nome. Ele voltou. Voltou mesmo mas foi rápido!" Anastácio estava eufórico. Fazia muitas perguntas ao homem. -" Eu nasci aqui. Filho de escravos. O pessoal da cidade não costuma vir aqui. Aqui não. Alguns até vêm mas de dia. É linda a fazenda do barão Borba, que Deus o tenha!" Um barulho de trem de ferro. Francisca se assustou. -" Não vimos ferrovia do avião. Esse barulho de Maria Fumaça??" Perguntou Anastácio. O homem apontou a janela. -" A mina. O trem levava os minérios. Tem trilhos. Trilhos. O menino de cabelo vermelho brinca neles." Francisca se arrepiou. -"Menino?" O homem pegou a garrafa de água. Olhou o copo descartável. Ele tentou abrir a garrafa. -"Permitem? Tenho sede!" Anastácio o serviu. -" Obrigado, senhor Anastácio. O menino é o curupira. Assim o chamam. É do bem, apesar dos pés ao contrário. No rio tem a Iara, a sereia que seduz os homens com seu canto sem igual. Minha irmã, Filomena, foi seduzida pelo boto. O boto. Um jovem que sai das águas e engravida as mulheres." Anastácio sorriu. -"Isso tudo é lenda, senhor Tinoco. Não existe!" O homem prosseguiu. -" Aqui tem saci, boitatá. Foi a Mãe do Ouro que indicou ao barão Borba, não seu tio Waldemar mas o pai dele, o primeiro barão. O barão Ferdinando. A mulher de fogo mostrou aonde tinha ouro. Uma mulher vestida de branco que virou bola de fogo e o levou até às jazidas. Hoje, são protegidas pelo corpo seco." O casal desatou a rir. -"Corpo seco?!" O homem ficou sério. Tirou um cachimbo do bolso e o acendeu. -"Sim. O corpo seco era o Cosme, o capataz do barão Ferdinando. Ele matou muitas escravas bonitas que não queriam dormir com ele. Matava mesmo. Um homem ruim que matou vários escravos e batia na própria mãe. Está na sagrada palavra, aquele que bate nos pais será amaldiçoado. Por ser ruim demais, a terra não quis o corpo do Cosme, depois que morreu. Nem o diabo nem Deus o quiseram. Rejeitado e amaldiçoado, o corpo seco fica vagando no mato. É um espírito numa caveira que anda, fala e tem barba." Anastácio estava incrédulo. -" Vai dizer que aqui também tem lobisomem e assombração?" O homem tomou água. -" O compadre Deodato era lobisomem. Era o sétimo filho, nascido após as sete irmãs. Com treze anos virou lobisomem. A irmã dele, a Genoveva, virou mula sem cabeça depois de namorar o padre Junqueira. Amaldiçoada, ela virou um quadrúpede sem cabeça soltando fogo pelas ventas, a noite. O baú com barras de ouro do barão está enterrado na fazenda. Ninguém sabe onde o barão o enterrou. Não precisam ter medo!" O casal estava abraçado. -" Fale mais de meu tio, senhor Tinoco!" A conversa entrou noite adentro. A conversa se tornou mais agradável. Francisca fez um café fresquinho para eles. Tinoco se despediu. O casal se recolheu. -" Esses matutos gostam de impressionar as pessoas, Francisca. Essas lendas serviam para assustar os portugueses, que acreditavam em tudo! Seu Tinoco parece ser um sábio." A lua cheia. Alguns morcegos no sótão. Uma coruja na janela. Tempo depois, Anastácio despertou assustado com barulhos de correntes de ferro. Gritos de dor. Francisca ouviu estralos de chicotes. Gritos de dor e sofrimento. Sozinhos num casarão do século dezoito, esquecido pelo tempo. O casal se abraçou e começou a rezar. O quarto estava cheio de gente, fantasmas, que os observavam curiosos. -"Estou vendo, querido. O Tobias,no escravo que morreu afogado. Está alí no canto, chorando. O barão Ferdinando está com ele." Anastácio olhou. -" Não tem ninguém alí, Chica! Vai dormir!" Anastácio se arrepiou ao ver que a esposa já dormia. -"Chica? Você disse o que?" A esposa roncava. Quem falara com ele, então?" Ele se cobriu com o lençol. Suas mãos estavam geladas. Adormeceu enfim. O sol invadiu o quarto. Francisca queixou de dores no pescoço. -" Sonhei que alguém me enforcava! Eu, einh?! Tinha uma festa dos escravos no terreiro, só redor do tronco!" Anastácio estava com os olhos vermelhos. Dormira pouco. -" Vamos tomar um café. Um banho de cachoeira vai ser bom pra relaxar, querida. A gente ficou impressionado com as histórias do Tinoco. Quero usar os molinetes novos no rio." Ela concordou. -"Não vou dormir aqui, homem. Vamos procurar um lugar na cidade." Eles andaram por toda a fazenda. Um local com mato alto, próximo a entrada de uma mina fechada. Anastácio se arrepiou. -"Aqui são as jazidas. O mato alto, como o senhor Tinoco falou. Se o corpo seco existe, deve estar aqui. Eu não quero ver!" Ele acelerou o trator. Horas andando pela fazenda. De volta ao casarão. Era tarde. -"Ele disse que morava na casa dezoito mas ela está demolida, Anastácio!" O casal contou doze casas de pé. A tarde caindo. O vento gelado. -"Há um pequeno cemitério alí na frente! É sim!" Disse o marido. O casal andou entre as lápides. Alguns túmulos antigos destruídos. O túmulo mais recente era do barão Borba. -"Há uma foto do tio. Igual aquela que temos, Francisca!" A mulher não respondeu. Anastácio olhou. Ela estava com os olhos arregalados, cabelos arrepiados, apontando uma sepultura. A foto de Tinoco. Nasceu em 16/08/ 1820, faleceu em 11/03/1902 -" Tinoco morreu há mais de cem anos, Francisca! Vamos embora dessa fazenda mal assombrada!" O casal correu até o casarão. As coisas colocadas nas malas. Nem fecharam as janelas. O celular não dava área. Anastácio fechou a porta de entrada. -"Por isso o advogado não quis ficar!" Eles foram ao trator e rumaram para a cidade. A poucos metros da porteira de entrada, o trator morreu. -"Vai escurecer, querida. Corre!" A estrada de terra. O sol dando adeus. A noite caiu como um véu. Um barulho de trem de ferro. Um trem de ferro fantasma passou por eles. Francisca deu um grito de terror. Eles olharam para trás. Lá estava o Tinoco atrás deles. Francisca ficou paralisada. Anastácio a puxou. O corpo seco, o lobisomem, a mula sem cabeça, sacis e fantasmas de escravos vindo na direção deles. O casal cruzou o limite da fazenda. Anastácio fechou a porteira. O celular dele vibrou, dando área. Os fantasmas não passaram pela porteira. -"Eles estão presos a fazenda, Francisca!" O casal foi a pé até a cidade. Eles alugaram um carro e foram até a capital. O casal procurou o advogado, relatando os fatos estranhos que presenciaram. O advogado, a pedido do casal, anunciou a venda da fazenda Cruzeiro do Sul. Logo surgiram muitos interessados, atraidos pelas belas fotos do casarão. Anastácio e Francisca venderam a fazenda pela metade do preço que realmente valia. FIM

marcos dias macedo
Enviado por marcos dias macedo em 31/10/2020
Reeditado em 01/11/2020
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