Sotão

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- De todos os malditos lugares dessa porcaria de lugar e arrumam essa porcaria de sótão sujo e fedido - falou para ninguém, o homem com as roupas manchadas de sangue e que não se lembrava bem do que havia acontecido, só conseguindo pensar no dinheiro dentro do saco preto que segurava com força no colo.

- Problema não, vou torrar minha parte, fugir para onde nem o diabo vai me achar, ah... se vou... - continuou o sujeito enquanto aguardava os companheiros chegarem, pois de acordo com o plano, era para cada um pegar o máximo que pudesse e sair voando por caminhos diferentes para depois se encontrarem neste local.

Ele foi o primeiro a chegar.

- Quando esses vagabundos entrarem por aquela porta vou dar um esporro gigante neles. Que idéia foi aquela de abrir fogo contra os seguranças? Ficaram doidos? - repetia o homem sentado na cama e abraçado com a grana embalada e separada em notas graúdas por etiquetas do Banco do Brasil.

- Sim, vou dar um esparrama geral... por culpa desses idiotas tive que matar um dos guardas, coitado, parecia gente boa, meio gordinho, mas era ele ou eu e, nesse caso, vai tu mesmo.

- E esses caras que não chegam, será que foram pegos? Porra, se pegaram o Caqué, já era... logo, a polícia tá toda aqui.

- Vou embora, fico?

O barulho da porta se abrindo o pegou no meio dos pensamentos. Ele se levantou rapidamente e empunhou a pistola, largando o dinheiro aos seus pés. Já tinha matado um, outro era moleza.

- Tá limpo, moçada... - disse a pessoa entrando no sótão - agora, é só esperar a poeira baixar e a gente se mandar.

Atrás do primeiro, entraram mais dois grandões. Todos eles carregando sacos pretos. Deram uma boa olhada no lugar e sorriram satisfeitos.

- Nada mal - disse um deles.

Nessa hora, o primeiro elemento que já lá estava, totalmente surpreso, deu o grito:

- Vocês tão loucos? Isso aqui é uma merda, nem dá pra ver direito ...

- Ainda bem que tem água... vou tomar banho - interrompeu o elemento que tinha abrido a porta.

- Ô, vão nem falar comigo, não, pilantras? - perguntou com raiva o homem com as roupas manchadas de vermelho - Se não sou eu, vocês nem estariam aqui.

Os três homens silenciaram-se por um instante, como se tentando entender alguma coisa. Cabeças virando de lado a lado para melhor escutar.

- Vocês ouviram alguma coisa ? - questionou um deles.

- Sim, pareceu uma sirene.

- Impossível, estamos no meio do nada - afirmou outro.

Pasmo com aquela palhaçada, o primeiro elemento deu um tiro para cima.

- E agora, palhaços, vão continuar me ignorando ? - falou quase gritando.

Os demais continuaram quietos por mais alguns segundos e depois pareceram relaxar.

- Deve ser a porra do vento - concluiu um.

- Uma pena que o Angorá não tenha conseguido sair, mas se não fosse ele, a gente tava preso e não aqui com a grana.

A risada foi geral, a título de brinde ao colega.

- Como assim, amigos? Eu tô aqui, olhem - disse Angorá se adiantando para tocá-los, mas percebeu que havia outras pessoas no sótão, estavam saindo das sombras e pareciam olhar somente para ele.

Eram muitos, e eram horríveis. Atravessaram os corpos dos seus comparsas como se eles não estivessem lá e foram ao encontro do Angorá que disparou sua pistola muitas vezes, mas sem sucesso.

Quando enfim foi engolfado pelos braços e bocas daqueles seres, sentiu perder a consciência, não sem antes relembrar a face do guarda que havia derrubado e o sorriso do filho pequeno que ainda não sabia que o pai era bandido e o via como herói.

FIm

Olisomar Pires
Enviado por Olisomar Pires em 23/08/2020
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