MINI CONTO DE TERROR - O MÉDICO DO 4° ANDAR - DR.LENI- PARTE I

Me sinto tão entediado. Estou cansado de sempre viver a mesma rotina ao ter que acordar de supetão graças a enfermeira que abre a droga da janela na minha cara, para que a “claridade entre em meu quarto” e ela ainda aperta o interruptor acendendo a luz cegante do quarto como se a da janela não fosse o suficiente.

Nunca entendi essa enfermeira. Na verdade, nenhum dos trabalhadores desse hospital. Ela sempre aparece no mesmo horário, abre a janela, liga a luz e depois ela sai tão rápido que eu nunca consegui nem saber o seu nome.

Eu ando por esses corredores e os outros fingem que eu não existo. De vez em quando alguém conversa comigo, como por exemplo um residente desinformado, um paciente ou um familiar querendo informações. entretanto, logo eles se afastam e eu fico novamente sozinho. Sabe, é um pouco triste ser ignorado. Eu que um dia fui a cara desse maldito hospital, tinha os melhores atendimentos e solucionava os casos mais complicados que muitos sequer ousariam em tentar! Agora... apenas estou definhando sobre a ignorância de todos. As pessoas realmente são ingratas! Por que eu não sai quando eu tinha tempo? Eu deveria ter saído, infelizmente já não tenho mais uma casa para chamar de minha. Minha ex-esposa ficou com ela depois do divórcio, pouco tempo depois ela vendeu o imóvel e se mandou para a cidade de seus pais com os nossos filhos porque “sofria demais” com as memorias que nós cultivamos juntos. Aquela ingrata... Todos são. Até mesmo a sala que eu trabalho no 4° andar eles não limpam, nem ao menos designam um paciente a mim. Acho que realmente me tornei um estorvo após tantos anos de dedicação.

Sempre ouço frases como “Meu deus, vocês viram ele?” em meio a murmúrios antes de entrar em minha sala. Já me acostumei com isso, até com a gritaria que ocorre ocasionalmente. Como as coisas chegaram a esse ponto? Acabei pegando a mania de me isolar em minha sala e esperar a hora do almoço, mas ironicamente eu quase nunca vou no refeitório, Ocorre as mesmas situações e sinceramente... eu estou cansado desse lugar, mas não posso sair.

A tarde passa sempre igual as outras, ou eu pensava que passaria, mas aquele dia foi diferente. Tínhamos uma paciente nova. Ela era filha de um importante político, no entanto, a filha era ilegítima, afinal ela era fruto de seu adultério. A parte boa era que ela quase sempre ficava sozinha no quarto e por ser cega não me julgava pela aparência. Comecei a visita-la frequentemente, me sentia bem em poder cuidar novamente de uma paciente e ela se sentia bem ao meu lado, tanto que me contava sobre as suas frustrações, como estava infeliz com aquela vida e como sua saúde ficava cada dia pior, e principalmente da sua frequente vontade de morrer. E eu? Bom, eu fico aqui do lado dela tentando a confortar, esperando os dias passarem para que ela fique finalmente do meu lado. É tão agradável o fato dela ser cega, assim ela não percebia minhas roupas ensanguentadas daqueles que sem querer acabavam entrando na minha sala que por mais que o hospital tentasse não conseguiam desativa-la. Todavia, seu olfato apurado fez com que perguntas viessem em sua mente, mas era fácil contornar essas duvidas, afinal estamos em um hospital. O melhor de tudo era a diretoria que fazia vista grossa, afinal eles não conseguiriam me manter preso em outro lugar. Como foi aqui que eu me matei então o único lugar que eu ficarei preso é aqui, procurando uma alma igual a minha para me fazer companhia, e pelo jeito eu finalmente encontrei. Afinal eu estou cansado dessa rotina. Eu quero outros iguais a mim.

Layla Vimorat
Enviado por Layla Vimorat em 25/11/2019
Reeditado em 06/01/2022
Código do texto: T6803409
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