O Verdadeiro Terror

Woody acordou naquela manhã, as quatro e vinte em ponto, como todas as manhãs nos últimos doze anos. Levantou-se da cama e arrastou-se até o banheiro, para escovar os dentes e jogar uma água no rosto cansado. Já nem olhava mais para as olheiras. Faziam parte dele. Mas não deveriam, afinal tinha apenas 34 anos. Pareciam quase 50.

Vocês pensam que terror são essas histórias de sobrenatural com bruxas, vampiros e espíritos? Todas essas coisas fantásticas e histórias que dão medo? Terror mesmo é viver sua vida tendo que trabalhar num emprego que se odeia, aturar um chefe idiota e aporrinhações, tendo que acordar de madrugada todo santo dia, há anos consecutivos.

Ele lembrava-se de quando entrara na faculdade de administração, aos 17 anos. Sonhava em ser consultor, ter sua própria empresa de consultoria. Ele podia alcançar aquilo. Mas então nada foi como ele esperava. Acabou fazendo estágio em uma empresa que prometia o mundo, mas quando se deu por conta a mesma havia falido, devido à crise. Então encontrara uma vaga, por sorte, de assistente administrativo. Ganhava pouco menos que dois salários mínimos, não tinha quase benefícios, e sua vida se resumia a mexer em arquivos velhos e pútridos, estragados pelo mofo, corroídos. Tinha que tomar remédio controlado para rinite, por conta do mofo em que vivia e só isso levava uma boa parte do seu salário.

Ele pôs o uniforme, estava bem desgastado. Deveria tê-lo desde que entrara na empresa. Suspeitava que tivesse um furo embaixo de uma das axilas – podia sentir sempre uma ventilação por ali.

Estava chovendo. Normalmente quase sempre chovia naquela época. Chuvas de verão. Um calor infernal e mesmo assim, chovia. Seu guarda-chuva havia estragado da outra vez e não se dera ao trabalho de comprar um novo. Não tinha dinheiro pra desperdiçar. Catou o jornal do vizinho e tentou se proteger no caminho de quatro quarteirões até o ponto de ônibus mais próximo. Claro que foi inútil.

O ônibus quebrou no caminho. Ele teve que esperar outro. Atrasou quarenta minutos no trabalho, que com certeza seu chefe descontaria no salário.

Ao chegar na empresa, achou tudo muito quieto. Mas normalmente, com ele, era sempre assim. Não falavam com ele, a não ser em caso de extrema necessidade, apenas quando era urgente ter em mãos um arquivo daqueles velhos e puídos. Ele foi direto para sua sala. Não deu bom dia pra ninguém, mas ninguém fazia questão.

As horas passaram muito lentamente, e ele ainda ficou uma hora a mais para pagar os minutos de atraso. Como se fosse adiantar alguma coisa.

Finalmente o relógio bateu seis horas. Ele levantou, pegou a mochila e foi embora, mas não sem antes dar uma topada com o dedo mindinho na quina da mesa.

- Puta que pariu. – ele gritou, enfurecido.

Irritado, ele foi andando embora. Queria sentir aquela dor, pois era menor do que a dor de viver a própria vida. Estava tão desligado que não viu quando vinha um carro em sua direção. Ele sabia que ia morrer, mas o carro em tempo, conseguiu desviar, indo direto contra o começo de um viaduto. Ele não ficou para ajudar. Teve medo de o culparem. Saiu correndo, esquecendo a própria dor e foi para casa.

Beep beep beep.

Novamente, mais um dia. Mesma rotina.

Chegou ao trabalho. Dessa vez estranhou a quietude. Tudo estava muito quieto. Conferiu o andar da empresa. Estava fechado. Um bilhete dizia que todos tinham ido há um enterro. O endereço estava logo abaixo, para quem quisesse prestar homenagens.

Ele seguiu para lá, por falta de coisa melhor para fazer. Quem teria morrido? Ele torcia para ser o chefe. Odiava aquele homem. Ele era um dos grandes culpados de ter acabado com sua vida.

Chegou no enterro. Era um cemitério pobre. As lápides desgastadas pelo tempo, mal mostravam o nome dos queridos entes enterrados ali. Ele prosseguiu até onde havia uma pequena multidão. As pessoas pareciam estar ali apenas porque era melhor do que estarem naquela empresa horrível trabalhando.

Ele chegou perto. Então gritou. Mas sua voz não saiu. Estava mudo. Não podia falar. Nada podia acontecer com ele. Estava morto.

Constatou ao ver-se deitado naquele caixão de madeira barata. Estava com a pele toda queimada. Não havia sido pego pelo carro, mas a explosão o havia matado. Estaria pasmo, se não estivesse morto.

Que pesadelo. Aquilo era um terror. Estava morto, mas sua alma estava vagando por aí.

Então ouviu um barulho. Um sonzinho agudo, daqueles irritantes. Ele não podia acreditar.

Beep beep beep.

O despertador estava tocando. Mais um dia.

Quem disse que morrer era terror? Terror era aquilo, acreditar que tinha se livrado de tudo e ter que levantar mais um dia para a sua rotina daquela vida miserável que tinha.

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Por favor, comentem!! Obrigada!!! Até o próximo :D

Camilla T
Enviado por Camilla T em 08/08/2016
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