6 - Caronte

(Recomendo a leitura dos números anteriores, pois são os contos que antecedem a este!)

Hoje decidi visitar um amigo; e antes que perguntem, sim eu tenho “um amigo”, afinal, a Morte não pode ter amigos? Enfim; Caronte era um cara muito tagarela, falava mais que aquela vizinha fofoqueira de cidade pequena, pois bem, eu o conheço desde quando comecei a trabalhar nesse ramo de; como eu posso dizer; ah sim, matar. Pois bem, como somos colegas de profissão, às vezes ia visitá-lo, hora só pra descontrair, hora para apavorar algumas almas; ou simplesmente bater papo, como é o caso hoje, apesar de ser um bate papo sério e de extrema importância.

Ele trabalha como barqueiro de almas, ou seja, quando termino o meu trabalho, ele assumi à partir daí, levando os imbecis para o reino dos mortos, no começo ele até recebia para fazer a travessia, mas morrer se tornou tão banal hoje em dia, que dificilmente as pessoas estão gastando suas moedas com o “Cara da Barca”, sendo assim, às vezes ele fica irritado e de raiva acaba deixando algumas almas perdidas vagando pelo mundo, com isso, pelo menos ele pode se divertir um pouco vendo-os atazanar os parentes.

Quando cheguei, lá estava ele encostado em seu barco, esperando para atravessar mais uma leva de almas chorosas..., era uma figura sinistra e como tal, mataria de medo qualquer um; o que não era o caso, pois todos ali já estavam mortos; mas a letargia dos moribundos impedia que esboçassem qualquer reação, suas figuras deprimentes e cadavéricas não permitia que interagissem, então toda viagem era feita em completo silêncio, silêncio este que era quebrado apenas pelo som de criaturas marinhas que constantemente batiam na embarcação ou de aves monstruosas que não raramente, sobrevoavam bem próximas as cabeças dopadas presentes no barco.

Caronte não tinha um rosto, aliás não tinha nada, era um esqueleto coberto com uns trapos de tecido preto opaco, mãos e pés ossudos a mostra e um remo que devia medir uns três metros de altura, nas costas, rasgando o pano, tinha longas pontas afiadas, como se fossem lanças, era meio corcunda e o olhar..., bem, seus olhos eram apenas dois buracos negros e sem vida. Mas sua figura medonha, contrapunha com o seu jeito fora do trabalho, quando não tinha que manter a postura diante dos passageiros, ele simplesmente falava de coisas banais, como a vez que “sem querer” deixou um dos sacos de bosta cair do barco ou quando inseriu na mente de um deles a sensação de estar sendo comido vivo por formigas, passando a viagem toda gritando, “pelo menos consegui quebrar o silêncio...”, ele me disse rindo, numa certa ocasião.

Por fim, antes de saírem, me aproximei e assim que ele me viu, mantendo uma certa distância do barco, me encontrou no meio do caminho...

- “Ei, meu caro, vai demorar?”

- “E aí Reaper, vou nada, i'll be back, me espere ok?”

Ele tinha a mania de falar algumas frases em inglês, nunca entendi o porquê, mas tudo bem.

- “Ok, vou te esperar, preciso falar com você.”

- “Relax man, vou só levar esses inúteis para o outro lado e já retorno.”

- “Tá certo, até daqui a pouco então.”

- “See you!”

Enquanto ele não voltava, fiquei repassando em minha mente o plano, logo mais o colocaria em prática..., eu precisava saber porque a Morte anterior me deixou esse legado, deve ter alguma razão..., e como Caronte já trabalhou com ela, certamente deve saber de algo que possa me ajudar, estou contando com isso.

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Moises Tamasauskas Vantini
Enviado por Moises Tamasauskas Vantini em 19/10/2015
Código do texto: T5420181
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