Me & My Ghost

É no ínfimo pecado da noite, que as sombras se aproximam do mundo. Na tétrica arte de sangue, no insucesso dos fracassados, nos murmúrios das vítimas, nos gritos de desespero daqueles que arrasados pela vida, inundados de medo e remorso, se atiram janela abaixo, a fim de se deliciar uma última vez, na liberdade chamada vida. Nas esquinas, prostitutas se transvestem de personagens para se lambuzarem com seus clientes. Alguns grunhidos são ouvidos de longe, a raspa de uma faca correndo por entre a pele de um pescoço, suavemente sangrando, caindo para trás e visualizando uma última vez o rosto de seu algoz. A tristeza dá lugar ao desespero, aos gritos de socorro. O que se espera de uma cidade cercada de pecado, de luxuria, de gula por mais uma pobre garota, filha do nada, do acaso, da vodca, do álcool e das drogas, concebida com sujeira e sangue, jogada ao esmo, descansando e chorando em meio ao lixo, uma história para ser contada e terminada com uma faca no pescoço. Não há assombração, não há o demônio por entre colinas, há o mais mórbido dos seres que já caminharam nessa cidade. Ele é forte, inteligente, e não há pena em seus olhos, não há alegria, somente o sabor insaciável de quero mais. Muitos já o viram caminhar pelas esquinas, muitos já ouviram o som de uma garganta sendo rasgada com força e desprezo. Ele não tem nome, ele está na cidade de Water Hill há anos e não criou empatia com a vida. A morte anda ao seu lado, com uma corrente no pescoço, como um animal de estimação, a sua foice está pregada nas costas desse ser desumano. O som do tic tac, da loja de relógios na esquina do Prazer, está com o seu dono desaparecido a muito tempo, não ousaram procurá-lo, só há especulações a respeito. Um relógio, que toca sem seu dono para dar corda, afasta todos os curiosos. Já falaram que há fantasmas em torno dele, cuidando e mantendo ele sempre ativo, sempre com seu tic tac assombrando a silenciosa cidade do pecado. A solidão é algo permanente nessa cidade fúnebre, sempre noite, sempre fria, neblina por todos os lados, morte e sangue caminham de mãos dadas como num pesadelo sem fim, imagens que já foram reais, agora assombram à todos, elas se projetam nas paredes sujas e manchadas com a morte. Mulheres e crianças que já foram inocentes, agora agonizam infinitamente com seus gritos desesperado, cada vez mais alto. Um prelúdio para a morte, um prólogo para a chacina, sem interlúdio e epílogos, sem fim, sem ponto final. Water Hill vive a sua mais triste história, até enfim podermos contar a história do forasteiro. Water Hill Burns, mais uma vez, as suas chamas, queimam até hoje, no fundo do poço da morte, emergirá Julia, aquela que com sangue nos olhos dizimou dezenas de crianças de um instituto para crianças abandonadas, juntamente com a sua personalidade Jennifer. Personagens estes que fazem parte das fantasias de um escritor, que poderá ser visto, na esquina chamada Rose & Crows, devido ao inúmero corvos que se ajuntam na janela desse pobre escritor.

Alfredo José Durante
Enviado por Alfredo José Durante em 31/05/2015
Reeditado em 09/06/2015
Código do texto: T5261577
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