Eu sou a morte-parte nove

Você já teve a sensação de ter alguém te olhando, quando achava que estava sozinha? Pode ser um fantasma te espreitando. No caso de Analice (mulher do meu assassino), era eu. Depois dos filhos, tinha chegado à vez da mãe. Comecei aos poucos, uma panela caindo aqui, alguns copos quebrando ali. Uma roupa limpa que eu derrubava do varal, uma comida que eu ajudava a salgar. O chuveiro que mudava a temperatura de quente para frio enquanto ela se ensaboava. A mulher ficava igual barata tonta tentando entender os estranhos acontecimentos. Pedir socorro ao marido era quase impossível, porque o sujeito desde a morte dos filhos não passava muito tempo na casinha alugada. Quando não estava furtando (o sofrimento não o modificou), estava na casa da antiga amante. Cansada de brincar de fantasminha divertido, comecei a pegar pesado. Nas noites em que ela dormia sozinha, - e isso agora era constante-Eu fazia companhia . Esperava que adormecesse e então me enfiava debaixo dos lençóis. Que delícia quando eu a despertava com meu toque frio. A mulher gritava de pavor, acendia as luzes e passava o resto da noite acordada com receio do meu toque. O relacionamento entre ela e o marido estava por um fio. Analice perdeu toda a libido e não aceitava ser tocada por João Carlos. Por sua vez, o cara estava muito satisfeito com a amante e lhe desagradava tocar aquela mulher cada vez mais envelhecida. Minha vítima passou a trocar o dia pela noite. A idiota pensou que não seria perseguida diurnamente. Quanta bobagem! Não tenho mesmo nada importante para fazer, disponho de todo o tempo. Então tanto faz assombrar de dia ou de noite! Era até mais divertido. Assim que ela adormecia eu começava. Ligava o som ou a televisão no volume mais alto, fechava e abria as gavetas da cômoda, batia diversas vezes a campainha, escancarava a janela do quarto quando estava chovendo, tirava sua coberta, estapeava-lhe as pernas. Sua sanidade mental foi a zero e ela saiu da casa numa camisa de força rumo ao hospício, onde não chegou viva ,pois fiz o favor de perfurar sua jugular com uma agulha de injeção, que um enfermeiro descuidado deixou cair no chão da ambulância. João Carlos demonstrou alguma tristeza, mas no fundo ficou aliviado de se livrar daquele peso morto e poder viver em paz com a amante sadia. Pobre diabo não tinha ideia do que o aguardava. (fim da nona parte) 07/04/2012