O GRITO DOS MORTOS

Era uma cidadezinha, um vilarejo perdido na imensidão do Brasil. Lugar afastado de tudo, havia entre os habitantes uma senhora, uma mulher altiva, segura de si e muito rica. De família influente, mas morava nesta cidade por gostar muito da vida pacata e lenta que levava.

Famosa pelo passado da sua família, a cidade inteira tinha profundo respeito e admiração por ela, pois ajudava muito os necessitados da vila. Mas, em um dia desses, ela veio a falecer.

A cidade inteira ficou de luto, e triste. Naquele dia, toda a vila foi ao enterro da senhora. Como não poderia ser diferente, um cortejo atravessou a vila inteira, a igreja anunciava com seus sinos badalando.

Uma grande fila se formou. Todos queiram despedir dela. A família estava presente, enfim o ritual seguiu normalmente, dentro dos padrões da boa morte.

Entretanto, havia chegado um forasteiro na cidade. Ele estava num boteco da vila quando viu aquela multidão passando em frente ao bar. Até pensou que fosse uma procissão, mas percebeu algo diferente do que seria uma verdadeira procissão. Não vendo a urna mortuária que seguia à frente da multidão, resolveu indagar uma outra pessoa que tomava suas cachaças no mesmo boteco. Como quem não queria nada, ele perguntou do que se tratava aquela multidão toda. O matuto respondeu-lhe ser enterro de uma pessoa importante.

Impressionado com a popularidade do defunto, quis saber mais. O peão já com a cuca cheia de pinga, soltou o verbo. Disse ser o enterro da dona da cidade, uma mulher rica,

de família influente, etc.

O forasteiro não perdeu tempo. Virou o ultimo trago da pinga e saiu atrás do cortejo.

Aos poucos foi aproximando da frente da fila para ver melhor o caixão. Foi seguindo o povo como se conhecesse a defunta.

Chegaram ao cemitério e foram em direção a sepultura da mulher, já pronta esperando. O padre faz todo ritual e no final um membro da família pede que abra o caixão para uma ultima despedida.

Foi nesta oportunidade que o forasteiro aproximou mais e viu que a defunta estava sendo enterrada com muitas jóias, e um anel no dedo dela chamou mais ainda a atenção do forasteiro que discretamente se afastou da multidão e foi saindo como se já tivesse despedido da mulher morta. Ele ficou perto do abrigo do velório e notou que uma capela estava aberta e ele acabou se escondendo nela mesma.

Passado o enterro, a multidão se dissipou e cada um voltou para sua vida normal. Já eram dezoito horas da noite e então ele observou que o coveiro, que fora a ultima pessoa a sair do cemitério, havia deixado a porta do quarto de ferramentas fechada, mas não trancada. Esperou anoitecer mais ainda e quando viu que todo o cemitério estava vazio, foi até o quarto de ferramentas e pegou uma pá, uma picareta e foi ao jazigo da defunta que acabaram de enterrar.

Sem muita dificuldade de desenterrar a morta, pois pouco tempo se passara do enterro e a terra estava fofa, ele, aos poucos foi retirando a terra até chegar no caixão.

Percebeu que este estava trancado, então pegou a picareta e tentou arrancar a tranca da urna. Conseguiu. Lá estava uma senhora de uns cinqüenta e cinco anos, muito bem vestida e coberta de jóias. Foi retirando uma por uma, pulseiras, colares, anéis, mas o anel que lhe chamara a atenção ele não conseguiu tirar. Parecia ter agarrado no dedo da defunta e ele tentou puxar, tentou várias vezes e não conseguiu. Então resolveu arrancar o dedo da mulher, pegou um canivete que carregava e foi cortar o dedo.

Assim que deu o primeiro corte, a mulher, de repente soltou um grito de dor, então ele viu aquilo e não agüentou o susto e desmaiou. Foi encontrado pelo coveiro no dia seguinte, morto ao lado da morta.

Nossos destinos são controlados por nós? Sua janela está aberta e a brisa que invade o seu quarto é doce e fria, fria, fria.

FIM

Jackro
Enviado por Jackro em 10/11/2009
Reeditado em 16/12/2009
Código do texto: T1916556
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