UMA VIAGEM SEM VOLTA

Naquela madrugada, Charles desperta às quatro da manhã e não consegue mais pegar no sono. Ele olha para o relógio e pensa que logo, às cinco da manhã teria que estar de pé, para ir ao trabalho.

Charles não estava se sentindo bem, no dia anterior ele havia sentido uma convulsão. Ele pensa: “ainda bem que eu estava em casa.” Charles era uma pessoa que vivia sozinho e com muita dificuldade tentava manter o seu emprego, que era a fonte que gerava o dinheiro para o sustento do seu vício.

O despertador toca às cinco da manhã, aquele barulho soava imperativo avisando a Charles que era hora de se preparar para sair para a labuta. Porém, aquele homem se sente fraco e incapaz de se levantar da cama, para se submeter ao trabalho. O dia vai clareando e o sol começa a iluminar o quarto daquele ser dependente. Ele ao observar a janela do seu quarto iluminando como uma lâmpada, reflete sobre a ironia daquela janela está virada para o leste iluminando-a logo de manhã. A reflexão avança, ele compara o dia com a sua vida: a infância sendo a fase iluminada do existir, ou seja, a manhã com o canto dos pássaros e o brilho prazeroso do sol; a tarde como a fase adulta, com a sua correria e o seu cansaço; e por fim, a noite, com o descanso e a solidão simbolizando a morte.

Charles se desperta da reflexão que o dominava, olha para aqueles pequenos “anjos” brancos, em cima da escrivaninha do seu quarto. Um desejo insaciável invade o seu corpo, ele estende o seu braço e captura um daqueles “anjos” do mal, que na palma da sua mão se transforma no desejado pó branco. Aquilo entra em suas narinas e ele começa uma viagem, que o transporta para fora da realidade e lhe traz um estranho e antagônico prazer. A curta viagem termina e quando ele se desperta, um susto invade a sua alma, pois de súbito ele ver parada ali, a sua frente, aquela criatura a qual ele ansiava tanto que viesse lhe buscar. Aquela dama com vestes negras, cabelos da cor das trevas e olhos igualmente escuros, que contrastavam com o seu rosto branco e pálido. Ela estende as mãos a Charles dizendo-lhe:

-- Venha comigo meu jovem, pois vou te guiar para o seu descanso.

Charles é invadido por uma imensa alegria, pois enfim, iria ser “premiado” com o descanso que almejava. Ele então indaga à Dama de Negro:

-- O meu descanso será eterno?

Ela o responde com um ar de dúvida que perturba a aquele fraco ser:

-- O descanso será somente para o seu corpo físico e durará até a terra o decompor.

A criatura continua a falar:

-- Quanto a sua alma, não sei o que a espera, a minha função é somente te levar para o portal das trevas.

Charles se lembra da vida que teve e se entristece, por causa das escolhas certas que não fez.

Dias depois, os vizinhos sentindo a falta daquele homem deprimido, e motivados pelo mau cheiro que exalava de sua casa, eles arrombam a porta da sala, penetram em seu fétido interior e ao adentrarem no quarto, se deparam com aquela cena horrível e triste, ao encontrar o corpo de Charles em cima da cama, ainda envolto em seu cobertor.

Vicente Mércio
Enviado por Vicente Mércio em 11/09/2011
Código do texto: T3214315
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