Uma pescaria pra ficar na história

Uma Pescaria pra ficar na história

Estava se aproximando a semana santa, Zé do Brejo foi até minha casa para planejarmos o local onde seria melhor para fazermos uma daquelas pescarias de fazer inveja a qualquer um, nos dias do feriadão. – Olha Zé eu também to numa vontade danada de dar uma pescada. - Vamos chamar os meus dois primos: O Valdo e o Nego para ir também. Eles sabem de um local excelente pra pescar lá na baixa da serra. - Não... La na baixa da serra é muito longe para irmos a pé. Eu não tenho cavalo, respondeu Zé. - Cavalo não é problema... Vamos falar com eles... Se eles toparem não se preocupe que eu lhe empresto um cavalo arriado pra você ir com a gente. - Assim eu topo ir pra qualquer lugar com vocês. O que eu quero mesmo é pescar e comer muitos peixes na semana santa.

Imediatamente fomos até a casa do Nego e do Waldo expor os nossos planos. Logo que chegamos lá, Zé falou do nosso plano e disse que esta seria a única forma de comer peixe na semana santa por que não tinha nenhum centavo para comprar nem se quer um lambari. O nego que não era negro se chamava Waldemar, Nego era apenas apelido. Eles também gostavam muito de pescar. Creio eu, que também por um pouco de pena do Zé, toparam a parada na ora. Para facilitar ainda mais a nossa pescaria o Nego disse que o seu pai tinha feito até um barraco na beira do rio do peixe para se acampar quando eles iam pescar por lá. Um local excelente pra nós ficarmos acampados durante a nossa pescaria.

Baixa da serra ficava distante da currutela da mata-Azul aproximadamente uns 40 km. Região muito montanhosa com enormes pedras de várias espécies e muitos riachos de águas cristalinas que nasciam no alto das montanhas e descia rolando sobre as pedras, montanha abaixo até desaguarem no famoso rio do peixe. Sua vegetação era mista: alguns lugares predominavam as matas virgens ainda intactas, em outras áreas, a vegetação era rala, típica do serrado. Tinha muito piqui, mangaba, caju, cagaiteira e outras frutas do serrado. Tinha também uma grande variedade de animais selvagens. Nas montanhas tinham enormes rochedos de pedras com muitos esconderijos. Era um lugar muito propício para o habitar natural da onça pintada que também tinha por lá.

- Depois de acertado o local da nossa pescaria, eu e o Zé do brejo, cuidamos de preparar nos mínimos detalhes, todo o equipamento necessário que íamos precisar no acampamento. A primeira coisa que Zé se lembrou de pegar foi a sua faca e a sua gaita. Ele era um excelente tocador de gaita e de acordeom. Por todos os lugares por onde andava pelo menos sua gaita ia com ele. Pegamos também toda a traia de pesca, alem de panelas, sal, arroz, farinha, uma boa lanterna, casacos de frio, cordas redes, uma cartucheira kalibre 20, etc.

Deixamos tudo bem preparados nos arfoges, na quarta feira de cinza: Eu, Zé do brejo, Nego e o Valdo, arriamos os cavalos bem cedo e partimos para a nossa pescaria no rio do peixe que ficava localizado na região da Baixa da Serra. Viajamos a maior parte do percurso em trilhas, atravessando riachos, subindo e descendo ladeiras. Quando chegamos ao destino final o sol já se declinava para o poente aproximando-se do píncaro das altas montanhas rochosas. O barraco onde acampamos era mesmo um recanto para caçadores e pescadores. Tudo muito simples: Coberto com folhas de palmeiras, paredes de pau a pique e tinha apenas um fogão à lenha. O que mais me impressionou foi a beleza das águas cristalinas do rio do peixe que eram cercadas de montanhas e rochedos que predominavam naquela região. A água era tão limpa que durante o dia dava pra gente ver os cardumes de peixes nadando de um lado para o outro.

Nossa pescaria estava muito boa, no primeiro dia pegamos muitos peixes de ótima qualidade: Tucunarés, surubins, pacus, pintados, etc. Eu ainda não tinha visto Zé do Brejo comer tanto peixe, que nem ele comeu no primeiro di de pesca. Zé estava tão empolgando que no outro dia, levantou ainda com escuro, pegou sua gaita, a faca, a vara de pesca e saiu sozinho para pescar em um belo poço na curva do rio, onde desaguava um pequeno riacho que descia de um enorme boqueirão de serra coberto por muitas rochas.

Eu o Valdo e o Nego levantamos mais tarde, só que pra nossa surpresa não encontramos mais o Zé na sua rede e em lugar nenhum. Procuramos por toda a parte nas proximidades do barraco, na margem do rio e nada de encontrar o Zé. Pensamos até que ele tivesse ido embora, mas a sela estava onde foi deixada e o cavalo dele estava pastando junto com os outros no piquete próximo do rancho.

O sol já estava quase na posição vertical e nada de notícia do Zé. Sem saber mais o que fazer já estava preparando nossa viagem de volta para buscar ajuda, quando ouvimos um grito que vinha do alto do boqueirão, seguimos naquela direção e para o nosso alívio encontramos com o Zé do brejo que nos contou a seguinte história: Estava meio truvo, eu ainda não tinha jogado meu anzol na água quando ouvi um barulho nas folhas secas, ao virar pra ver o que era, estava de frente com uma enorme onça pintada. O susto foi tanto que eu apenas tive tempo de me jogar de bruço bem enfrente daquele animal felino que, de um só pulo saltou em cima das minhas costas rosnando e me apertando com as patas, eu apenas parei a minha respiração e fingi que estava morto. O animal cheirou o meu nariz, cheirou o meu forofofó e percebendo que não havia nenhuma reação por parte de sua presa decidiu me arrastar para a sua toca onde aguardavam os seus dois filhotes ansiosos e famintos. A onça abocanhou apenas a minha jaqueta grossa que eu tinha vestido para me proteger do frio e logo começou a me arrastar sem nenhuma piedade. De vez em quando ela parava para descansar. O boqueirão era muito apique e a felina teve muito trabalho para me arrastar até sua toca, que ficava no meio de uma gruta de pedras. Quando ela chegou à gruta, me soltou no meio dos dois gatinhos e deitou muito exausta na entrada da caverna.

A pesar dos inúmeros arranhões que eu sofri ao ser arrastado tanto tempo por cima de paus e pedras, eu não perdi os sentidos em momento algum. O pior de tudo é que os dois gatinhos estavam muito famintos e queriam comer minhas orelhas a todo custo. Enquanto eu me defendia dando tapas nos gatinhos famintos para livrar as minhas orelhas, eu comecei a pensar em um plano para sair daquela caverna que tinha apenas uma saída e a onça estava deitada exatamente naquele lugar. Eu não tinha outra escolha, estava apenas esperando a hora de ser morto e comido por aqueles gatinhos assanhados que não me dava sossego nem um instante. Ao ver a baita onça deitada, peidando pra todo lado de tanto cansaço, Eu tive uma idéia: Lembrei da minha gaita. Tirei-a do bolso e com uns barbantes que eu tinha, comecei a amarrá- La no rabo da onça bem embaixo do seu forofofo. A onça muito cansada continuou peidando e quanto mais ela soprava mais a gaita tocava. Muito assustada com todo o barulho que ela mesma fazia soprando na gaita, saiu em desabada carreira pelo penhasco abaixo. O Zé que não é besta aproveitou a fuga da onça e também caiu fora deixando os dois gatinhos sem almoço.

Nós três mesmo diante da situação que encontramos o Zé, ficamos de boca aberta sem querer acreditar na história que o nosso companheiro acabou de contar. Muito assustados, voltamos para o barraco onde estavam nossas coisas, pegamos tudo, arriamos os cavalos e tratamos de dar o fora imediatamente antes que a onça fosse La no barraco fazer uma serenata com a gaita do Zé e buscar o almoço para os seus filhotes.

Quando chegamos a nossas casas, o Zé do brejo arrumou outro apelido... Agora era Zé da onça. Ele virou notícias por onde andava, todo mundo queria ouvir a historia desta tal pescaria. Eu só sei dizer que até hoje o Zé só lamenta muito é ter perdido a sua gaita, por que ninguém nunca mais foi pescar na baixa da serra pra ver se encontrava a onça que levou a gaita dele.

goiano
Enviado por goiano em 17/04/2010
Código do texto: T2203337