Gruta dos Ecos

Adolescentes destacam-se pelo impulso e espírito aventureiro. Comigo nunca foi tão diferente. Recordo-me de um dia em que por muita curiosidade nunca tinha conhecido ou entrado em uma caverna, apesar de estar sempre buscando algo menos tedioso em minha vida. As coisas que nunca tinha experimentando sempre me apimentavam a mente. Os poucos amigos que tinha, jamais concordavam com minhas idéias ou até concordavam, porém a falta de medo em demasia ou a pouca coragem que tinham afastavam deles a idéia de compartilhar algo tão inusitado; embrenhar-se nas entranhas da terra 160 metros abaixo, em um lugar escuro, “escroto” e desconhecido no intuito de desafiar um suposto medo oprimido, experimentar uma adrenalina fascinante ou mesmo apreciar as belezas subterrâneas. A gruta demonstra as mais belas formas de estalactites, estalagmites ainda nos oferece o prazer de deleitar-se na água gelada de um lençol freático belo e fascinante!

"Velho Joe" é um apelido engraçado e enigmático que coloquei em um amigo bombeiro que tive o prazer de conhecê-lo quando cursava o ensino médio, sempre muito louco por motos e alucinado por aventuras radicais e verticais. Sua grande amizade induziu-me pelos caminhos das paredes, prédios, cachoeiras montanhas e até saltos de pêndulos em uma ponte. Comecei a vivenciar um mundo novo, um mundo vertical onde a vertigem e adrenalina me impulsionavam sempre a desafiar novas alturas e experimentar as mais diversas formas de apreciar novas paisagens claro sempre obtendo com uma visão privilegiada de todos os ângulos da natureza, visto e fotografado nas alturas. Pronto, já estava alucinadamente viciado. Adquiri todo equipamento necessário para essas peripécias, e com esse amigo meio pirado mudei totalmente minha maneira de encarar o mundo. Agora tinha um amigo a minha altura! "Em todos os sentidos" e o mais interessante não fugia dos desafios; quando surgia uma nova oportunidade bastava um singelo convite, pronto! Velho Joe estava lá pronto para... E em condições de... E não simulava desculpas estava lá ao meu lado sempre pronto a colocar sua coragem à prova.

"Neto" amigo praticamente de infância, motociclista nato, um grande amigo, porém dotado de pouca coragem! Uma pessoa muito simpática e sempre disposto a atrair a atenção das mais belas garotas. Tínhamos algo em comum distante da beleza física, rudimentar e ligado as coisas que gostávamos. Claro um convite desses para uma pessoa como ele era como se estourasse com brutalidade seus testículos, sempre impunha muita dificuldade e apresentava seus argumentos pessimistas no intuito de fugir e não admitir seu medo de encarar uma coisa nova. Conseguir convencê-lo a um passeio rústico como este levaria semanas, e nosso diálogo sobre minha vontade imatura e seu cuidado pessimista caberiam em 500 páginas de um livro, porém afugentaria qualquer leitor que ousasse folhear a introdução. Consegui convencê-lo de uma simples forma, apoiando o seu olhar pessimista, admitindo minhas atitudes inconseqüentes e solicitando sua presença de amigo para resguardar-me se ocorresse qualquer adversidade, pronto! Tinha que agir rápido consegui convencê-lo por algumas horas a aceitar meu convite.

Marcamos em um sábado após ouvir falar de uma gruta denominada "Gruta dos ecos" situada no município de Cocalzinho-GO, a 55KM de Brasília Velho Joe trouxe um amigo de trabalho nos informou que era um amigo muito experiente porém omitiu o fato deste indivيduo possuir medo em excesso e muita mais muita claustrofobia, ou seja um perfil perfeito para estar presente nesses ambientes. Ao chegar ao local estávamos cientes de que não possuíamos nenhum equipamento adequado para adentrar naquela gigantesca clarabóia, a única ferramenta que tínhamos era disposição, lanternas de mão, coragem em demasia, uma câmera analَgica e muita curiosidade. Restringimos nossa alimentação em água, biscoitos e algumas frutas. Ao chegarmos ao recinto por volta de 09h00hs chegamos a clarabóia e nos deparamos com uma placa contendo os seguintes dizeres: "Bem vindo a Gruta dos ecos. De uma caverna nada se tira, além de fotografias; Nada se leva, além de saudades; Nada se quebra, além do silêncio e nada se deixa além de pegadas". Essa frase além de me impressionar muito ficou marcada para sempre em minha vida, e percebi que esse era o início do meu vício. Quebramos o gelo, levamos a frase em nossos corações e começamos a explorar o interior da imensa gruta.

O local era imenso com um terreno bastante acidentado, trazendo assim uma grande dificuldade para caminhar no seu interior; composto de gigantescos paredões e pedras de dezenas de toneladas que segundo boatos desprendeu se do teto a milhões de anos (coisa que duvido muito), ou seja no fundo sabíamos que a qualquer momento centenas de toneladas poreríam simplesmente ruir sobre nossas frágeis cabeças; que sequer ostentavam um simples capacete daqueles utilizados em obras. Nossa progressão no interior era muito lenta devido as dificuldades apresentadas, bem como as coisas curiosas que encontrávamos em nosso caminho. Alguns habitantes residiam no lugar além dos morcegos e insetos percebemos que o local possuía uma comunidade natural de uma aranha conhecida como aranha marrom, segundo relatos sua ligeira picada era capaz de necrosar qualquer membro em apenas alguns minutos. As paredes de rocha da gruta predominavam-se de um mineral chamado mica xisto, ou seja, expelia uma poeira respirável que também deixava nossa pele muito brilhante e bonita! Ao tocar as rochas para o início da progressão percebemos que o cuidado com a escolha do local era de grande importância pois fezes de morcegos eram algo comum nos locais em que nos apoiávamos. Começamos a perceber a grande quantidade de entradas e saídas da galerias e começamos a explorar todo aquele lugar freneticamente, sem ter o cuidado e a preocupação de marcar os locais passados para evitar que nos perdêssemos no interior; apesar de ter encontrado na entrada um barbante estendido no intuito de alguém que por ventura tenham ido com o receito de se perder no seu interior.

Aos poucos percebemos o sumiço da luz do dia e estavámos envolvidos em um breu de noite eterna, ou seja, no fundo obscuro subterrâneo da terra. Encontramos o maravilhoso lago do lençol freático da terra e percebemos o beleza transparente da água que se não tivéssemos tido cuidado cairíamos nele despercebidamente. Esquecemos o relógio, então o relógio biológico nos avisou que já era tarde. Já passava das 17:00 então paramos para nos alimentar, e então começamos a retirada do recinto mesmo porque as pilhas de nossas lanternas começaram a emitir sinais de falência, “pessoas preparadas como nós jamais acreditaria que poderíamos levar pilhas de reserva!”. Começou a grande saga: Encontrar a saída da gruta, o caminho foi ficando complicado, pois todos os lugares pareciam iguais, tantas saídas e galerias percorridas e nenhum sinal da luz do dia. O cansaço começou a dominar esses físicos despreparados, 5 horas se passaram e nenhum sinal da luz do dia, mesmo sabendo que já era noite lá fora, pois lá dentro já parecia outro universo diferente.

Andando em círculos chegamos no mesmo local, o lago, como nosso estoque de água potável havia esgotado recarregamos nossos cantis com um transparente água temperada com fezes de morcegos; deparamos com algo que deixamos para trás; cascas e sementes de frutas, “descumprindo e desreispeitando a regra número 4, que para trás só poderíamos deixar pegadas, no entanto na ação discreta da fome esses restos alimento foi recolhido e armazenado em nossos estômagos. Meu amigo neto neste instante não ofereceu seu estômago como suporte e de uma maneira insana pegou a lanterna principal e saiu em disparada insistindo em procurar desesperadamente uma saída. Controlamos os ânimos e decidimos que a melhor solução seria dormir um pouco e quando amanhecesse iríamos procurar essa tão desejada saída. Estávamos desanimados e desacreditados foi quando “Velho Joe” resolver assoviar, inesperadamente e diferente do eco ocorrido recebemos uma resposta a esse assovio; decidimos seguir o barulho do som e surpreendentemente deparamos com 2 casais no interior da gruta, não portavam lanternas apenas 2 velas na mão já quase no fim. Éram jovens hostis e simpáticos, nos disseram que estavam apenas fazendo um breve passeio e que iríam ao lago e voltariam, nos indicaram a saída da gruta e um deles que identificou-se como Bruno e disse que aquele local era muito perigoso e que há 2 anos 2 rapazes e 2 garotas em um feriado de carnaval, haviam morrido no interior desta mesma caverna de desidratação por estarem perdidos! Disse conhecer profundamente a gruta, deixando conosco seu numero de telefone e que quando quiséssemos voltar ele se disponibilizaria a nos acompanhar em uma nova visita. Saímos então exaustos da gruta por volta de 23:50, porém algumas coisas me deixaram intrigados quando estávamos indo embora: 2 casais sem lanternas nenhuma apenas 2 velas quase se extinguindo? Fora da gruta não havia nenhum veículo além do nosso e a cidade mais próxima situava-se há 8 quilômetros! Estava muito cansado precisava dormir. No domingo por volta de meio-dia resolvi dar uma ligada para o Bruno no intuito de marcar uma nova visita a Gruta dos ecos no próximo fim de semana, Uma senhora de voz severa atendeu o telefone, provavelmente sua mãe; ao perguntar se Bruno encontrava-se em casa retrucou:

-“Moço você só pode estar brincando! Meu filho faleceu há 2 anos quando saiu com sua namorada no carnaval com um amigo dizendo que iria visitar uma tal de Gruta dos Ecos”...

http://www.poesiaurbana.net

http://twitter.com/gessebsb

Gessé Cotrim
Enviado por Gessé Cotrim em 19/12/2009
Reeditado em 06/06/2010
Código do texto: T1986180
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