A penalidade de ser visto como alguém que não existe

Nesta nova sociedade o meio para que eu me corrigisse foi o desprezo.

Assim era a lei: para eu me aperfeiçoar, melhorar, me corrigir, todos da sociedade deveriam me desprezar. Não poderiam agir como se me vissem, como se eu tivesse existência.

Eu estava debaixo dessa lei e por infringir artigos dessa lei tive que ser submetido às penalidades nela definidas.

Eu poderia gritar, espernear, chorar, me debater, assaltar, me desesperar; apresentar joias, ouros, ferimentos, histórias, brindes; quebrar bens públicos, todos continuariam agindo como se eu não existisse. Assim era a lei. E foi o que fiz, nada adiantou. Eu não existia, ainda que com lágrimas e desespero tenha procurado.

Passado o tempo da penalidade a mim imposta, passou meu castigo, conforme a lei, e então novamente fui reintegrado à sociedade; passei a ser visto, passaram a falar comigo.

Quando, eis que vejo a alguns metros alguém com o mesmo castigo que sofri imposto por essa nova sociedade. Todos se afastaram e fingiram nada ver, todos respeitaram a lei. Meu coração não suportou e lhe ofereci o que mais precisei em todo tempo dessa inexistência social: um abraço apertado com todo calor humano da minha alma.

Creio que fui realmente aperfeiçoado, embora não conforme a lei.

Jackson Angelo, em 15 de novembro de 2016.