O LORDE DO ESPAÇO

Antártica, Terra, 24 de junho de 2018, 11:30 horas.

Gabinete do Presidente Marcos.

–Quer dizer que temos uma nave estelar no hangar? – o rosto do Líder de Antártica expressou a maior incredulidade perante a revelação inesperada.

–Meu pessoal está carregando material nela e vou levá-la para a INDEVAL Motores na Cara Oculta e praticar engenharia reversa. Segundo dados que Valerión enviou de Júpiter há três anos; esta deve ser independente dos conversores de energia cósmica; inutilizados pelo nosso pessoal da Hércules.

–Mas desde quando? Como a conseguiu, Martin?

–Ah! Foi em março do ano passado... Isso é uma longa história... – o Lorde do Espaço entreabriu um sorriso enigmático por entre sua barba branca, deixando ver de relance seus dentes amarelados pelo tabaco.

–Gostaria de ouvir.

–Outra hora, Marcos. A guerra me espera.

–Precisarei usar minha autoridade como governante supremo de Antártica para ouvir pelo menos um relato seu em primeira mão antes que você desapareça de novo, seja preso outra vez pelo inimigo ou morra na guerra?

–A guerra está preste a terminar, Marcos. Pegamos o chefe dos aliens; ele comandava cinzentos e reptilianos. Segundo dados que Valerión mandou antes de ir a Saturno, trata-se de um Dominion de Haduk Prime Beta Aquilae, na constelação da Águia. Mesma raça dos conselheiros do império raniano. Uma das raças mais letais do quadrante... Mais letal ainda do que nós!

–Se for como aquele Zvar Zyszhak; preso em Ceres; devia ter poderes mentais medonhos, segundo informes de Fuchida. Como o prendeu?

–Com muito trabalho.

–E como aprendeu a dirigir a nave?

–Com umas rápidas aulas de pilotagem dele e dos outros aliens.

–Está brincando, Martin.

–Digamos que o convenci a ajudar.

–Convenceu?

–Eu tinha urgência para sair da Área 51. A situação estava ficando quente por lá, havia alguns pelotões nos cercando. A forma de escapar era por cima do tiroteio e a nave estava em nosso poder. Por isso fiz coisas que podem chocar você.

–Nada que você diga pode me chocar, Martin. Conte-me tudo!

–Talvez eu fira sua sensibilidade com fatos que...

–Eu não tenho sensibilidade, Martin! A Nova Ordem Mundial, que o demônio carregue às profundezas do inferno; perseguiu, prendeu, torturou e matou meu pai; um filantropo, professor e cientista...! A maldita anti-raça perseguiu, prendeu, torturou, estuprou e assassinou minha mãe; uma doutora, uma médica, uma pesquisadora que ganhou o premio Nobel fazendo o bem a esta humanidade ingrata e burra...!

–Eu amava seus pais, Marcos! Eram meus amigos! Eu vi sua mãe grávida de todos vocês! Seu pai e eu alisávamos a barriga dela por horas, falando de filosofia...!

Marcos ficou sombrio e sem palavras, olhando fixo o rosto alterado do velho guerreiro que parecia que ia chorar. Por fim disse, com voz trêmula:

–...Depois disso, Martin; explorei a Lua, conquistei Marte; tornei-me chefe de uma nação considerada fora da lei pela comunidade internacional e entrei com tudo na Terceira Guerra Mundial... O quê mais pode me causar horror?

*******.

A nave interestelar.

–Matamos todos os humanos da Área 51 e a maioria dos aliens que usavam armas atordoantes. Nós usamos metralhadoras, granadas e facas. Eu queria matar, ferir, mutilar, para causar terror e surpresa nos aliens, habituados a nos amedrontar. Eles nunca imaginaram que seriamos tão... Tão...

–Cruéis...?

–Sim. O Dominion usou seu poder para tentar nos paralisar, mas éramos muitos. Eu o ataquei a golpes na cabeça, já que o queria vivo, aterrorizado e com dor. Intui que seria o líder deles. Cheguei a sentir o poder dele na minha cabeça, mas não conseguiu me dominar. Arranquei a pedra vermelha da testa dele com a faca. Ele gritou como um porco e vi que estava no caminho certo. Com a dor da surra e o medo da morte, ele cedeu. Acho que os dominion são covardes, confiam demais nos poderes e não resistem à dor. Eu fui perguntando e degolando os kholems um a um, na frente do dominion, até que sobraram quarenta e cinco. E ele aceitou colaborar para que a dor parasse. Geralmente todo ser vivente normal tem amor à vida, e medo da dor.

–E pegaram a nave.

–Pegamos. Colocamos os aliens sobreviventes a bordo, amarrados de pés e mãos, e viemos para Antártica em antigravidade, sob o fogo dos lacaios locais.

–Isso em março do ano passado?

–Sim. Conservamos o sigilo por causa de espiões. Sabe que nós, do Esquadrão, temos algumas prioridades que os militares comuns não têm. Após algumas horas de interrogatório e uma dúzia de kholems degolados, descobrimos como usar o impulso e a manobra, mas até hoje não nos atrevemos a usar todos os recursos da nave.

–Quem mais sabe disso?

–Os sobreviventes veteranos do esquadrão; Darlán, Syd, Liza, Alois e meu segundo em comando; Sean Syves McKinney; um perigoso ex-soldado SBS escocês que lutou nas Falklands em 1982 e passou para nosso lado em 1995, quando a ditadura matou-lhe a mulher e o filho; dois dissidentes que recusaram a Marca.

–Mas vocês eram mais de...

–Mandei os outros para o espaço. Integram as tripulações das naves marcianas como consultores. Não reparou que a pontaria dos marcianos melhorou?

–Ah! Então era por isso!

–Lá encima não há o risco de serem capturados e interrogados pelo inimigo.

–E o que pretende agora que conhece melhor a nave?

–Como disse antes, levar a nave para INDEVAL Motores e aplicar engenharia reversa ou levá-la para Valerión, onde ele estiver.

–Valerión está em Saturno. E Alan Claude também. Seu filho parece que está fazendo história por lá, segundo a pouca informação que chega. Ele é um guerreiro igual a você. O fruto não cai longe da arvore, Martin!

–Então tentarei chegar lá assim que a guerra terminar.

–Você deveria dedicar-se a estudar seu novo brinquedo em lugar de continuar arriscando a vida. Vocês todos do esquadrão estão velhos demais para isso!

–Se vai me insultar, seu moleque...

–Não diga bobagens. Pegue seu pessoal, vá para Cara Oculta nessa nave e descubra seus segredos; fique por lá, descanse e deixe os marcianos ganhar a guerra para nós. Reúna uma tripulação, dê um nome bonito a ela e aprenda a pilotar! Faça jus ao seu apelido! Você não é o Lorde do Espaço?

*******.

O conselho de Marcos era lógico. A guerra estava no fim. A frota marciana era dona do espaço. Apesar de que bombas caíram em América do Norte, Europa e Ásia; a maioria dos mísseis fora destruída no espaço pela artilharia orbital da Antártica.

Frotas marítimas da América do Norte e da Europa foram afundadas pelos caças CH-1 da aviação espacial antártica, dona do ar em todo o orbe. A China manteve-se neutra o quanto pôde, mas entrou na guerra a favor de Antártica ao ser atacada por Estados Unidos.

Marcos enviou duas esquadrilhas de caças CH-1 pára apoiar a força aérea chinesa e deu um ultimato para o presidente Arbusto, lacaio da anti-raça; escondido com seus mestres no subterrâneo das Montanhas Rochosas:

“–Ainda é tempo de sair vivo, Jorge. Evite a destruição do seu país, poupe a vida dos seus soldados e astronautas, pare com esta guerra inútil que você começou e não tem como vencer. A Europa e a Rússia fizeram um armistício, Antártica domina Ásia, África e Austrália e já ocupa América até o México. Nós lhe damos dez dias de prazo, até o quatro de julho, para acabar com a guerra. Diga apenas uma palavra e evite que a frota marciana vaporize com phasers essa montanha em que você se esconde, matando você e todos num raio de duzentos quilômetros”.

*******.

Caçada as bruxas.

Algumas grandes cidades do hemisfério norte estavam destruídas, havia fome, desolação, doenças da radiação e revoltas internas. Andarilhos, esfomeados e doentes, vagavam pelas estradas de América do Norte, buscando abrigo e comida, cobertos de feridas que nunca fechariam. Bandos de salteadores assolavam as estradas; despojando de roupas e comida os incautos que se atrevessem a viajar para o sul, mas a fronteira do México estava fechada. Já não existia polícia nem tribunais.

A humanidade finalmente acordava, embora tarde demais, já que a metade do mundo estava em chamas. A reação dos que sabiam a verdade e não puderam fazer nada; veio à tona logo depois que a guerra começou e a RTVV começou a transmitir sua propaganda.

Antes da guerra ninguém acreditava neles, eram chamados de loucos ou

silenciados pela ditadura da anti-raça vendida aos nefastos aliens. E os incautos que não sabiam a verdade, ao perceber o engano de séculos; ao descobrir que eram escravos e não sabiam; tornaram-se monstros vingativos.

*******.

E aconteceu que o povo; sem medo de ser silenciado, preso ou morto, reagiu aos outrora tão orgulhosos e petulantes parasitas dominadores, culpados do mal da humanidade, caçando-los como animais. A vingança era tudo o que restava aos humanos comuns e inocentes,transformados em feras impiedosas sedentas de sangue contra a elite dominante de parasitas enquistados em todos os cargos públicos e políticos.

Suas propriedades; empresas, templos e escolas foram saqueadas e incendiadas em todo o mundo. Quando capturados, eram sumariamente executados, fossem homens ou mulheres. Nem as crianças dos dominadores escaparam da sanha das brigadas justiceiras de matadores de todos os países. Não permitiriam que qualquer criança dos parasitas crescesse para algum dia voltar a dominar.

A consigna dos justiceiros vingadores da raça humana era matar até que a última gota do sangue maldito do último parasita dominador, traidor da humanidade aos aliens por dinheiro, fosse derramado na Terra. E desta vez, não apareceria ninguém para defendê-los.

*******.

Cara Oculta, Lua, 25 de junho de 2018, 09:30, hora de Antártica.

INDEVAL; Indústria Espacial Valerión.

Seguindo o conselho do Líder antártico, o velho guerreiro da Terra, hoje Lorde do Espaço; alunissou com sua nave estelar capturada na frente do rochedo que ocultava a entrada do enorme complexo industrial fundado pelo Dr. Valerión.

A nave, em forma de disco alongado aerodinâmico, com duas nacelas de

dobra, escondidas dentro de pesada blindagem aos lados, sugeria ser uma nave de guerra, provavelmente um cruzador ligeiro de ataque, poderosamente armada com lançadores de torpedos na frente e atrás, e um sistema de bateria de bancos phaser totalmente diferente dos conhecidos até agora nas naves kholems.

–Definitivamente não é uma nave kholem – disse o engenheiro chefe Jorge Alberto Palmer, de Antártica, coordenador do complexo INDEVAL, após duas horas de examinar os quatro andares da nave – acredito que seja da Suprema Confederação, capturada pelos cinzentos.

–Como sabe? – perguntou Martin Sarrazin, incrédulo.

–Não se parece em nada com as naves que capturamos deles.

–Além disso o suporte de vida está regulado para humanos – interveio a Dra. Débora von Endt, médica chefe da INDEVAL, uma brasileira de 44 anos, ainda muito bonita, de cabelos castanhos e olhos azuis – a nave é bem confortável, tem uma pequena, porém completa enfermaria, um refeitório, e camarotes diferenciados, para mais de oitenta tripulantes, oficiais superiores e o capitão...

–O que indicaria que os confederados são descendentes dos ranianos.

–Exatamente. Valerión mandou uma base de dados bastante ampla – disse a doutora – há dados da Analgopakin; dos milkaros; dos xawareks e os que você baixou do sistema da nave. A escrita dos painéis é raniana, embora eu não a leio.

–Tem sentido. Havia um dominion no comando dos cinzentos na Área 51.

–Segundo a base de dados, a Suprema Confederação colocou a premio a cabeça de qualquer dominion que apareça no seu território – disse Palmer.

–Podemos copia-la, Palmer?

–Podemos tentar, Martin. Mas em Saturno haveria mais possibilidades.

–Tive esse palpite.

–Vamos estudá-la e colocá-la em condições de ser pilotada corretamente pelo menos em impulso, já que você a trouxe em manobra, mas há o reator de dobra, que não entendemos e não poderíamos dominar – disse Palmer.

–Sim, consta-me que está equipado para lidar com trinta quilos de antimatéria.

–Suficiente como para fazer desaparecer a Lua e um pedaço da Terra.

–Melhor não mexer nele aqui – disse o Lorde do Espaço.

–Concordo, mas em impulso máximo que segundo Valerión atinge um quarto da velocidade da luz, você pode percorrer o sistema solar á vontade, fazendo seus desafios costumeiros contra o inimigo.

–Desafios? Será sua cara, Martin – disse a doutora – a nave tem nome?

–Não, não pensei nisso.

–Então porque não Desafiante?

–Arranje uma garrafa de champanha, você será a madrinha, querida.

–Que tal médica chefe da Desafiante? – replicou ela – A Lua está muito quieta.

–Porque não? Preciso também de um engenheiro chefe de impulso... Palmer?

–Como a doutora disse, aqui está calmo demais.

*******.

Órbita da Lua, 26 de junho de 2018, 22:00, hora de Antártica.

Após uma noite e um dia de trabalho do pessoal de Palmer, a Desafiante foi submetida a uma bateria de testes no espaço.

–É uma nave dura – disse Palmer – definitivamente uma nave de guerra.

–Podemos recriar essa blindagem?

–Talvez. Valerión precisa idéias e a Desafiante tem muito a oferecer a nossa frota. Ela mesma nos ensinará a recriá-la. Vamos baixar a base de dados. A nave se auto-analisa, Martin.

–Preciso aprender mais sobre navegação espacial e pilotagem, Palmer.

–Há uma máquina de táquions mais avançada do que as nossas na enfermaria da nave – disse a doutora – acho que podemos treinar os tripulantes com ela.

–Também precisamos aprender os idiomas que se falam lá fora, doutora.

–Já pensei nisso, Martin – a máquina de aprendizado é bem completa.

*******.

Com a dobra desligada, a Desafiante só atingia manobra e impulso, o que já era considerável.

O sistema de armas era controlado pelo painel táctico da ponte, uma cúpula achatada que sobressaía de cima da borda de proa, sem comprometer a estética arredondada.

No centro da nave, estava o reator de dobra, uma estrutura vertical que ocupava quatro andares e uma engenharia arredondada. Atrás do centro, os poderosos motores de impulso cujas bocas apontavam para popa. A estibordo e bombordo do centro, estava a complexa maquinaria das bobinas de dobra das nacelas embutidas em casulos blindados. Do meio para proa, nos andares dois e três, estavam os alojamentos da tripulação e o refeitório.

No andar dois estavam também a enfermaria, o laboratório e a sala de reuniões. No andar um, onde estava a ponte, havia alojamentos para oficiais e o capitão, além de uma sala táctica de mapas e navegação.

Na ponte, a tela de dois metros por um e meio, o painel de navegação do piloto à frente, a bombordo a estação de engenharia e uma estação táctica secundária. A estibordo a estação de ciências e a estação táctica primária. No centro, atrás do piloto, em posição ligeiramente elevada, a cadeira do capitão com painéis de comando a ambos lados.

A popa, duas portas, a bombordo e estibordo; comunicavam com as demais dependências da nave no primeiro andar, contado de cima para baixo.

–Os dois sistemas tácticos são superiores aos nossos – disse Palmer. Podemos atirar com os phasers em qualquer coisa em qualquer ângulo, com a maior precisão.

–Ótimo! Podemos avariar o inimigo sem destruí-lo.

–À vontade, Martin. O phaser tem a velocidade da luz, podemos regulá-lo fino ou grosso, ou aberto, como as armas marcianas, com a vantagem de que não é bruto e arrasador como as armas de nossos aliados e as nossas.

–Mas não abro mão de um par de canhões marcianos e um laser potente de cem milímetros, Palmer – disse o Lorde do Espaço – E quanto aos torpedos?

–São grandes, disparados por electromagnetismo, ligam impulso máximo ao sair do tubo. Podem levar qualquer tipo de carga, fotônica, atômica, convencional e acho que estes podem levar uma carga explosiva de antimatéria. Muito perigoso.

–Precisamos colocar pelo menos dois lançadores de torpedos padrão.

–Será feito.

–O quê mais descobriu?

–Casulos de fuga para 87 pessoas.

–Fascinante.

–Há duas naves do tipo explorador; para dez pessoas, com engate padrão, em baias de atracação na popa do quarto andar. Também encontrei outros dois núcleos de antimatéria vazios de reposição. Ejetáveis, como o principal.

–Será que conseguiremos aprender tudo isso?

–Penso que sim – interveio a doutora von Endt – a base de dados alimenta a máquina de aprendizado.

–Só que não sei direito como programar essa máquina, Martin.

–Por quê?

–Está tudo escrito em raniano, o computador mestre só responde em raniano, estou como quando você veio da Terra, adivinhando os comandos. Você aprendeu a mexer em algumas telas e apertar alguns botões virtuais, mas isso é tudo.

–Custou muito fazer aquele alienígena nojento falar.

–Imagino.

*******.

Órbita da Lua, 27 de junho de 2018, 12:30 horas.

Refeitório da Desafiante.

–Vamos preparar tudo – disse Martin – Marcos tinha razão; eu devo me dedicar a meu brinquedo. A guerra está praticamente ganha e ele não precisa mais de mim, os marcianos tomaram conta. E falta só uma semana para o quatro de julho.

–O quê vai acontecer o quatro de julho? – perguntou Palmer.

–É o último prazo para o cretino do Jorge Arbusto se render se não quer ser vaporizado nas Montanhas Rochosas. Pessoalmente, prefiro que ele não se renda.

–Por quê? – perguntou a doutora.

–Porque eu quero que ele morra, não importa se com sofrimento ou não, quero que morra; por vingança, sim, mas principalmente para que o mundo fique livre desse traidor da Raça Humana. Se ele se render, ficará vivo e será um mau exemplo para outros que venham por aí. Mas... Bobagem. Esqueçam, amigos. Este velho já sofreu demais lutando contra essa maldita gente por décadas. Eu estou azedo, desiludido, eu já vi traição e maldade demais. Mas vamos pensar que já está por acabar.

–Esperemos que sim.

–Vamos pensar em coisas agradáveis, doutora.

–Ótimo! Qual era seu plano?

–Se conseguirmos levar esta nave a Júpiter poderemos conseguir alguém que nos ajude a mudar a linguagem do computador – disse o Lorde do Espaço.

–Segundo a base de dados de Valerión, há uma pessoa indicada para pilotar esta nave em Júpiter ou em Saturno: Nahuátl Ang, o ex-capitão da Analgopakin.

–E porque não o milkaro Pru Atol?

–Segundo Aldo, no último relatório que enviou de Júpiter, ele não vai nos ajudar, Martin – disse a doutora – parece que eles têm uma diretriz que os impede de interferir com espécies que não possuem tecnologia interestelar. E parece que a Suprema Confederação também tem algo parecido.

–Bobagem!

–Acho que não, Martin – disse Palmer – nós estamos brincando com uma máquina poderosa que desconhecemos e que um comando errado pode destruir em um segundo, junto com a Lua e sabem os deuses quanto espaço em volta dela.

–Temos medo dela – acrescentou a doutora.

–Vou concordar com vocês. O que sugerem?

–Sabemos que Valerión está construindo uma nave estelar em Saturno. Se a levássemos a ele, poderia ser de utilidade para melhorar o trabalho deles e Valerión poderia ceder a você o capitão Nahuátl para pilotá-la, se este já estiver em Saturno.

–Concordo, Palmer. Você está certo.

–Valerión e você são velhos amigos, ele não terá objeções – disse a doutora.

–Sugiro uma primeira escala em Marte para aprender a língua raniana – disse Palmer – eles têm o que precisamos e podemos recrutar tripulantes marcianos.

–Depois seguimos para Saturno – completou a doutora von Endt.

–Não passaremos por Júpiter?

–Não, Martin. Se esta nave for roubada dos confederados, como imagino, não seria bom passar por lá. Eles podem estar monitorando as luas dos milkaros.

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Seis meses depois,

Cidadela, Rhea, 17 de Janeiro de 2019.

A guerra termina em novembro de 2018, e a notícia chega a Rhea no dia 17 de janeiro de 2019, dia em que Alvin festeja seu quarto aniversário. Como era hábito na Cidadela, uma festa foi organizada.

As festas de aniversario eram corriqueiras; a única descontração que se permitiam terrestres, troianos, marcianos e sirianos; dedicados ao duro trabalho de afinar duas naves estelares, aprimorar uma estação espacial e um enorme estaleiro orbital para uso continuo. Havia muito que fazer desde 2015.

Este dia era especial por vários motivos: a Ilustre Dama Ingeborg também fazia aniversário. Inge era a suprema sacerdotisa odínica dos terrestres e troianos; a Reverenda Madre; a quem todos recorriam; inclusive os marcianos, que a amavam como um elo de ligação com Marte, já que a religião Antártica tinha pontos em comum com as crenças marcianas.

Os sirianos, cuja cultura matriarcal era dominante entre os guerreiros, também a respeitavam como uma mãe de clã. Outro motivo importante era a anunciada presença do imperador Tao, que por primeira vez na sua vida, subia para o espaço. Sua Suprema Inteligência fez questão de estar presente no aniversário do menino nascido nas Terras Frias.

Ele veio como passageiro de honra da Hércules e tivera um belo passeio pelas luas, conhecendo de perto os anéis e bases em algumas luas, incluindo Japeto, e finalmente a Cidadela de Rhea, onde foi levado a conhecer as instalações antes da festa, que começou pontualmente às 19 horas, hora local.

Alvin, o pequeno príncipe das Terras Frias, demonstrou suas habilidades em artes marciais orientais, aprendidas com seu preceptor Lobsang Dondup.

–Ele já opera os computadores, Alteza. Está aprendendo a pilotar os patrulheiros e os caças nos simuladores. Na prática sabe manobrar no espaço, embora seja cedo ainda para pousos e decolagens.

–Capitão Al-Do meu amigo – disse o imperador – temos suficiente confiança um no outro nestes ciclos todos de amizade, que podemos falar certas coisas...

–Sim, Alteza.

–Seu filho terá um futuro brilhante entre nós.

–Espero que sim. Gostaria que seguisse meus passos.

–Sem dúvida que o fará. Mas saiba que tenho planos para ele.

Aldo fitou o rosto de Tao com curiosidade.

–Meu amigo Al-Do. Quero dizer que tenho a esperança de restaurar o império raniano, como sabe pelas nossas longas conversas. Quero ser imperador do novo império raniano e dominar este canto do quadrante, como fizeram meus antepassados.

–Compreendo e concordo, mas... Qual é o papel do meu filho nisso?

–Não percebe, capitão? Vocês, terrestres, são ranianos, como nós. Todos nós somos descendentes dos ariones de Nirvana. E o senhor e seu filho são tão bons representantes da raça raniana como qualquer antártico, hiperbóreo e troiano que já conheci nestes ciclos todos graças a você.

Tao fez uma pausa e olhou demoradamente as frias constelações através da cúpula transparente que cobria o promenade da Cidadela.

–Quero dizer, capitão Al-Do que eu não sou eterno. Já tenho mais de cento e quarenta anos dos seus e algum dia morrerei. E quem tomará meu lugar? Quem sentará no meu trono? Quem reinará sobre os mundos que reconquistaremos?

–Sua tataraneta...

–Alana é uma criança, um bebê. Seus pais, avós e bisavós morreram a mãos de Suer Dut e ela ficou ao meu cargo. Não tenho herdeiros homens.

–Mas um dia ela governará sabiamente, se bem preparada.

–Mas precisará de um marido, um imperador que imponha respeito, Al-Do.

–Alvin? Mas ele não tem sangue real...

–Quem diz que não tem? Seu filho é herdeiro da Terra, da raça antártica; ele é seu filho, nascido como um deus nas Terras Frias, um território do qual nunca antes nos preocupamos, mas que agora aprendemos a apreciar, como berço de Humanos Verdadeiros. Você sabe disso Al-Do. Não negue.

–Não posso negar.

–Os Vurians adoram seu filho, que consideram seu príncipe... Sim, eu falei com a bruxa das Terras Frias, não se surpreenda. Ruddah é poderosa e sensitiva; ela profetizou que Al-Vin governará o mundo. Isso me deixa feliz. Os vurians são Ranianos Verdadeiros nas Terras Frias, onde lutam pela sobrevivência como fizemos milênios atrás, quando chegamos aqui após a destruição de Ran. A bruxa pode estar certa, capitão, seu filho pode ter genes dos príncipes de Atlântida.

–É impossível saber. Somos lutadores, e se Alvin herdou minha determinação...

–Nunca duvide disso. Seu filho é um Humano Verdadeiro. Esperamos que

assim o considere. O futuro apresenta-se como um tempo de luta.

–Sim, alteza. Sei disso...

–Um tempo de reconquista de mundos!

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Continua em: NAVEGADOR SOLITÁRIO

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O conto O LORDE DO ESPAÇO - forma parte integrante da saga inédita Mundos Paralelos ® – Fase I - Volume III, Capítulo 27; Páginas 153 a 160, e cujo inicio pode ser encontrado no Blog Sarracênico - Ficção Científica e Relacionados: sarracena.blogspot.com

O volume 1 da saga pode ser comprado em:

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Gabriel Solís
Enviado por Gabriel Solís em 27/10/2016
Reeditado em 20/02/2020
Código do texto: T5804855
Classificação de conteúdo: seguro
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