— X? —

 

———————————————————————————————————————————————————

???

???

———————————————————————————————————————————————————

FIM?

 

Ele estava jogado no chão. Os vários ferimentos espalhados pelo corpo o impediam de ficar de pé. O cenário era desolador, corpos estirados no chão, as construções ao redor estavamem ruínas devido aos impactos e explosões que precederam aquele momento  deixavam uma nuvem de poeira densa no ar.

 

Eu estava imobilizado, preso entre os escombros. Mas de onde estava, pude acompanhar toda a conversa.

 

— Olha só onde você chegou. Onde viemos parar? É isso que você quer para você? – Seu olhar carregava um misto de tristeza e indignação.

 

— Eu dei o melhor que pude para você, desde que nasceu! A melhor escola, a melhor saúde, aos melhores professores, médicos e mentores. Recursos financeiros não lhe faltavam. Mas você escolheu isso, isso! – Apontava para as pessoas espalhadas pelo chão.

 

— Você não vê que isso não tem futuro algum?! Se juntar com essa gente?! Pra quê tanta rebeldia!? – Ele andava para um lado e para o outro, visivelmente nervoso.

 

— Essa gente é a minha gente. É a nossa gente, pai. – Mike sussurrou com as poucas forças que tinha.

 

O homem parou por um instante. Seu olhar de desdém era inegável.

 

— Viemos deles, mas somos muito melhores! – Retrucou em tom ríspido.

 

— Não! Somos todos humanos. Não podemos negar a humanidade dos outros sem negar a nossa própria, por qualquer razão que seja. As diferenças que temos entre nós são meros detalhes. – Mike reunia forças para se levantar.

 

— Humanos... Você sabe tão bem quanto eu que eles foram criados para serem escravos! Híbridos de macacos com uma mistura dos caminhantes das estrelas para servirem de mão-de-obra e como alimento físico e espiritual dos outros seres. Tão somente porque, naquela época, o sol não permitia a permanência de máquinas, naves e estruturas complexas por muito tempo na superfície deste planeta. Humanos e gado são a mesma coisa! Podemos ser algo melhor a depender de quem escolhermos servir.

 

— E vender a nossa humanidade? A que preço? – Mike mal conseguia ficar de pé.

 

Antes daquela batalha, tínhamos recebido no BunkerLab um traje especial de combate, um tecido branco parecido com um colante justo ao nosso corpo que continha uma mistura de material compósito e de nano robôs que nos permitira suportar forças extremas como explosões e tiros. Em nossa cabeça, uma tiara que parecia um aro dourado reluzente circundando-a que serviria para melhorar os nossos reflexos, permitir que fizéssemos movimentos mais rápidos e precisos e nos proteger de ataques psíquicos. Em nossas costas, estruturas que lembravam asas, nos permitiam voar e absorver as energias do ambiente para usarmos com forma de ataque e defesa. Nossa roupa, a minha, de Artemisa, Mônica e Charles, era branca. Mike escolheu a de cor preta, não sei por qual razão.

 

Naquele momento, não sabia onde Artemísia e Mônica estavam. Tive a impressão que foram banidas para uma outra dimensão ou para um local tão distante que não consigo senti-las mais. Charles revidou o ataque da horda liderada por aquele homem praticamente sozinho e não resistiu, embora tenha lutado bravamente e praticamente neutralizado quase todos os agressores. Aquele homem, que ainda não sei quem é, praticamente nos aniquilou sem sequer ficar ofegante. Vestido com um traje militar operacional futurista e com aquela pequena arma em punho, que mais parecia um bastão, mas que projetava um tipo de energia sólida mutável que, pelo que vi em combate, já se transformou em espada (tipo um sabe de luz), tridente, lança longa de duas pontas, adaga curta e até mesmo um chicote. Não sabia que a luz poderia ser curvada daquele jeito, até aquele momento.

 

O homem que estava de pé tinha uma aparência mais levemente mais jovial do que Mike. Era contra intuitivo imaginar que aquele era pai deste.

 

O traje de Mike, assim como o meu, estava em frangalhos. Mas, ainda assim, percebi que Mike buscava absorver a energia do ambiente para ganhar forças. Pondo-se em posição de luta, em guarda ativa, punhos cerrados e protegendo a cabeça.

 

O homem gargalhou.

 

— É isso então?! Hoje você levará toda a surra que não te dei quando era menor, garoto! Você não vai sujar a nossa linhagem! Não vai anular o pacto que fiz. – Seus olhos brilharam um vermelho vivo, e sua pele parecia formar escamas grossas.

 

— Nossas escolhas são nossas e nossas somente! A cada ação, uma decisão tomada e uma reação. Somos donos de nossos destinos, merecedores do livre-arbítrio! Vou lutar pela nossa liberdade até o último instante! – Um tipo de luz branda se formou, envolvendo o seu corpo, enquanto sussurrava uma prece fervorosa a Uriel.

 

— Os antigos deuses do submundo foram libertos do seu cárcere por Uriel! Ele é apenas o carcereiro. As portas do céu e do inferno estão sendo abertas. Centenas de espécies já estão aqui, disputando entre si para saber quem será o senhor dos humanos. Você quer ser mais uma marionete da Federação? Daqueles que mais parecem elfos, auto proclamados ascencionados? – Seu corpo termia de tanto ódio.

 

— Somos mais do que isso! Temos a capacidade de decidir nosso próprio destino. Não precisamos ser servos de ninguém!

 

O homem gargalhou novamente.

 

— Já chega de ouvir tanta tolice! Seu cérebro já deve ter derretido! Menos de 0,1% dos povos “livres” não se auto aniquilam ou não são consumidos por outras potências desta galáxia no curto prazo. Que tanta fé é essa que você tem nos humanos da Terra?

 

Nesse momento, Mike concentrou toda a sua força e rapidamente se aproximou daquele homem com um poderoso soco, rompendo seu campo de força e acertando um direto no rosto dele, fazendo-o dar alguns passos para trás.

 

O homem arregalou os olhos e viu seu sangue escorrer de sua boca. Um grito de fúria ecoou no ar. Transformou o bastão em um tipo de chicote e açoitou tanto Mike que preferi fechar os olhos para não ver o sofrimento do meu amigo. Juntei todas as minhas forças para tentar sair dali e fazer algo, mas não conseguia me mover, por mais que tentasse. Nada pude fazer para ajudá-lo.

 

O homem parou. O que restou do corpo de Mike estava no chão. E, assim como ele fez com Charles, sugou a “alma” de Mike para dentro do bastão. Gritei institivamente. Ele me viu e veio caminhando lentamente em minha direção. Ele falava comigo direto dentro da minha mente:

 

“ Então, você era o inseto que lia a minha mente e fez com que essa luta durasse tanto! Pena que minha capacidade cognitiva é superior a sua capacidade de ser dedo-duro!”

 

Ele percebeu a minha descrença quanto ao que presenciei, das almas dos meus amigos serem sugadas pelo bastão, e continuou:

 

“ A alma nada tem de pura ou sagrada. É apenas uma forma de energia individualizada e complexamente organizada. É um ótimo combustível para a minha arma! Não há bem ou mal. Há apenas o conhecimento e o poder. A única escolha que temos é se estamos do lado do opressor ou do oprimido. Sempre foi assim. Absolutamente tudo é uma ferramenta, desde o micro ao macro. Inclusive você.”

 

Gelei. Ele simplesmente iria sugar a minha alma com aquilo. Ele caminhava lentamente, com um sorriso sádico no rosto.

 

Ele retirou o grande escombro que me imobilizava com uma das mãos e o jogou longe, apenas para ver o meu espanto. Eu caí de joelhos, juntando todas forças para reagir minimamente. Ele apontou o bastão para mim.

 

Fechei meus olhos, contraí todos os meus músculos institivamente.

 

Uma última gargalhada.

 

Abri os olhos e ele simplesmente sumiu.

 

< Anterior || Próximo>

 

Manassés Abreu
Enviado por Manassés Abreu em 03/04/2024
Reeditado em 10/04/2024
Código do texto: T8033816
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2024. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.