Uma bolsa entre nós

Soninha estava radiante ao entrar na loja depois do trabalho. A tão sonhada bolsa da moda seria adquirida em cinco prestações. A vendedora a atendeu com um sorriso amarelo e um olhar de desconfiança, duvidando que ela poderia pagar pelo pedacinho de couro. A moça pegou os documentos com desdém, conferiu-os para ter certeza de que a pobre era mesmo a pobre que dizia ser, enquanto pensava:

─ Já conheço bem esse tipo: cabelo com creme barato, roupas de feirão... se essa neguinha me enganar...

Há tempos Soninha economizava. Andaria com a nota fiscal pelo condomínio em que trabalhava para provar que o artefato era mesmo seu. Entrou no ônibus e viu logo um lugar vazio. Sentou-se. Antes de arrancar, mais um passageiro entrou. Soninha pensou com menosprezo:

─ Era só o que me faltava!

─ Vou ser assaltada! Logo hoje.

─ Conheço bem esse gingado. No meu bairro esse tipo dá em penca: bermudão colorido, chinelos, correntes no pescoço, boné falsificado de marca famosa e... preto. Típico!

Soninha, mais que depressa agarrou a bolsa.

─ Ah, não! Minha bolsa ele não leva! ─ Pensava.

─ Dou-lhe um sopapo.

Era boa de briga, já se pegara algumas vezes com desafetos da quebrada. Estaria pronta. Não daria mole. De repente o senhor sentado ao seu lado desceu, mas Soninha nem se mexia. Percebeu que o rapaz se aproximava. Soninha não desviou o olhar. Pensava consigo:

─ Vou olhar bem na cara desse safado, porque se esse FEBEM pegar minha bolsa vou fazer questão de reconhecê-lo nem que seja no inferno.

A contragosto deu passagem para o rapaz e se levantou em seguida. Estaria pronta pra se defender ou correr. Um tempo depois o moço se levantou. Soninha pensou:

─ É agora! Senhor, tem piedade!

Um frio lhe percorreu o corpo, do pescoço até o cóccix. Mas Soninha apertou ainda mais a bolsa. O ônibus parou e o rapaz desceu.

─ Graças a Deus! ─ Disse aliviada.

Mais à frente ela desceu, ansiosa por fazer inveja para as amigas logo mais, quando iria balançar as carnes no baile do Seu Pemba. Foi tudo muito rápido. Soninha sentiu um puxão forte e viu sua bolsa sendo arrancada de suas mãos. Ficou apenas com um grito preso na garganta e só teve tempo de ver que o meliante era branco.

Ângela E
Enviado por Ângela E em 22/03/2024
Código do texto: T8025703
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