AO CAIR DA TARDE

Foi numa dessas tardes de não se fazer nada que resolvi dar um passeio vestido ao estilo – turista deslumbrado – com câmera (ainda existiam as Fugi), chinelo de dedo, bermuda cargo de brim cheia de “pra que serve isso? ”, camiseta de gola careca, boné com as cores do time do coração e óculos escuros, porque o sol estava naquele ponto de cegar camelo.

A brisa estava tirando a soneca de depois do almoço, porque afinal, tudo e qualquer coisa precisa de um tempo de descanso. Privilégio que é negado só aos relógios que são obrigados a trabalhar o tempo todo sem direito a descanso ou atrasos...

Depois dos arrecifes, o oceano espelhava a grandeza da tarde em tons de verde esmeralda, o Capibaribe se espremia entre a muralha de pedra e o cais, talvez ansiando se espalhar na imensidão que o aguardava... o silêncio era perturbado pelo vai e vem de dois moleques jogando uma pelada com garrafa pet à guisa de bola no vasto espaço da praça do marco zero.

- O doutor quer um passeio de barco? É cinquenta real até a ponte giratória e parada pra foto naquele monumento ali...

O susto misturado à surpresa do inusitado oferecimento não deixou espaço para a recusa.

Fui guiado até a escadinha de pedra junto ao cais e subi na baiteira com a recomendação de não pisar na madeira do fundo. Pedi para ir primeiro ao parque das esculturas de Brennand, porque queria as selfies feitas enquanto eu estava lindo...

Depois costeando o cais para minimizar o esforço das remadas contra a correnteza chegamos ao que resta da ponte giratória.

É encantadora a vista da cidade a partir do rio e por conta disso, pedi ao barqueiro que me deixasse no cais de Santa Rita, porque eu iria completar a tarde com o passeio no catamarã pelas 14 pontes.

Acompanhado por gente vestida de gente, alegre, se comunicando em vários idiomas, ouvi o guia demonstrando os pontos notáveis do passeio, falando com forte sotaque pernambucano, o inglês que, tenho cá minhas dúvidas, se foi realmente entendido...

A estrela papa-ceia brilhava no lusco fusco do ocaso enquanto eu saboreava sorvete de mangaba e gastava o meu inglês, tão chulo quanto o do guia do catamarã, na companhia das irmãs Margareth e Mildred em férias no Brasil.

GLOSSÁRIO

Baiteira = patacho = pequeno barco artesanal

Estrela papa-ceia = planeta Vênus