Maldito o dia que inventaram que eu deveria ser taxista.

Lá pelos idos dos anos 70, estava desempregado. Currículo, era como revoada de pombos. Bancos, lojas, mercados, feira, consultoria e até para vigia de rua. Nesse último quase fui contratado, mas no treinamento, meu físico de galinha não ajudou. Fui dispensado! Já estava sem nenhuma esperança. Por pouco não me tornei um ébrio. Já tinha na ponta da língua a música de Vicente Celestino. E às vezes me pegava cantando: - “Tornei-me um ébrio, na bebida busco esquecer.” Um belo dia um amigo me deu um conselho: - Vá fazer o curso de taxista que dá uns bons trocados. Hoje me dá desespero só em pensar naquele conselho. Bem. Fui ao Detran e fiz a matrícula. Em menos de uma semana comecei o curso. No terceiro dia, o instrutor começou a aula dizendo: - Hoje vocês vão apreender a fazer um parto em caso de emergência. Parto? – pensei eu. Fiquei de orelhas em pé ouvindo instrutor: - Quando estiverem levando uma gestante para o Hospital, muita atenção! Se, no meio do caminho, ela começar a dizer que o nenê está nascendo, vocês coloquem uma toalha sobre ela e olhem bem a posição da criança. Se a cabeça estiver para fora, é só puxar, enrolar e levá-la para um hospital. No final da aula, eu já nem sabia o que dizer. Imagine se aquela situação acontecesse comigo? E aconteceu!

Um belo dia recebi uma chamada da Vila Ema em São Paulo: - Venha logo! Aqui tem uma senhora que está para pari! Na hora comecei a rezar: - “Meu Deus! Que essa criança não decida nascer em meu carro. Deus que me perdoe! Acelerei o carro e me dirigi a Vila Ema. Lá chegando, a gestante já estava na calçada se retorcendo. Abri a porta e a coloquei no banco de trás, perguntando: - Em qual hospital? Ela respondeu: - Qualquer um, pois não tenho plano de saúde. Bem. Na época, sem GPS, sem Celular, comecei a perguntar para os transeuntes: - Onde tem um pronto-socorro por aqui? – Olha, senhor, eu não sou daqui. Mais adiante, vi uma senhora e fiz a mesma pergunta. Ela respondeu que estava a passei e não morava ali. Enfim, a mulher começou a gritar: - Está nascendo! Meu Deus! Naquele momento, vieram à minha mente as palavras do instrutor do Detran.: - “Se, no meio do caminho, ela começar a dizer que o nenê está nascendo, vocês coloquem uma toalha sobre ela e olhem bem a posição da criança. Se a cabeça estiver para fora, é só puxar, enrolar e levá-la para um hospital.” Que droga, não tinha no carro uma toalha. Mas...ufff! Logo à frente, tinha uma loja das Casas Pernambucanas. Desci correndo e peguei a primeira toalha que estava em promoção. Voltei para o carro. Ao chegar perto...O senhor está preso! Era um polícia! Preso? – pensei. Eu sou taxista! A mulher está parindo! Enquanto eu falava, a mulher gritava ainda mais, em desespero.: - Socorro! Me ajudem! O policial, ouvindo os gritos, me respondeu: - Já para o camburão! Todo malandro tem uma desculpa na hora “H”. Mas...tentei argumentar. Novamente, mas.... Sem, mas! Já estava algemado em direção à delegacia. Lá fiquei por duas horas, quando chegou um homem e falou ao Delegado: - Vim agradecer aquele senhor que está ali algemado. O Delegado, sem entender nada, respondeu: - Ele está preso porque estava sequestrando uma mulher. O homem retrucou: - Não, não! Ele é taxista e estava levando minha mulher que estava parindo! No fim das contas, fui solto e convidado para ser padrinho da criança. Uma semana depois, anunciei o táxi. Deus me livre de ter que enfrentar essa situação novamente. Mas fui recompensado. Sabe aquela revoada de currículos? Então, parece piada, mas fui contratado em um hospital na ala para acompanhar parturientes.

Estêvão Zizzi
Enviado por Estêvão Zizzi em 31/07/2023
Código do texto: T7850270
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