Fui Bebê Jhonson!

Fui Bebê Jhonson!

Até que a bajulação dos pais, avós, tios e toda vizinhança quase deu certo.

No ano de 1956, com um aninho de idade, todos diziam: - Que menino mais lindo! Uma fofura! Que bochechinha! Dá vontade de morder!

No meio de toda aquela euforia, minha avó proferiu: - Inscreve esse garoto no concurso 'Bebê Johnson'! Pode apostar, ele ganhará com certeza! Eu me pergunto por que vovó se meteu no assunto. Formou-se uma sinfonia de vozes na sala: - Vai, Terezinha (minha mãe), inscreva o moleque no concurso! Vai ganhar um bom dinheiro! E quem sabe viverá o resto da vida de pernas para o ar! Enfim, minha mãe, sem saída, pegou um ônibus cedo e foi até o centro, na rua Alameda Barão de Campinas, sede do Jornal "Folha da Manhã" (Hoje Folha de São Paulo). Lá chegando, deparou-se com uma fila quilométrica de mães com crianças no colo, dando mamadeiras, chupetas, tentando conter o choro das nenezadas.

Bem, pegou a ficha de número 101 e ficou aguardando. Após seis ou sete horas, foi atendida no final da tarde. Quando chegou a sua vez, deparou-se com uma ladainha de perguntas: - Nome: Estêvão. Idade: 1 aninho. Nome dos pais: Terezinha e Gélio. Nomes dos avós: Antônio e Anália. Endereço: Largo São José do Belém, 358. Agora a senhora entra naquela fila para tirar uma foto da criança. Detalhe: Essa outra fila já tinha 100 pessoas! Sem saída, minha pobre mãe aguardou. Lá pelas 11 horas da noite, ela ouviu: - Traga a criança e coloque nesse banquinho. – Posso por outra roupa nela, pois a fralda está daquele jeito – falou minha mãe.

- Sim, fique à vontade. – emendou o fotógrafo.

Com calma, minha mãe tirou da bolsa um macacão amarelinho e um chapeuzinho e os colocou em mim. Finalmente, o clique da máquina do fotógrafo.

Depois daquela maratona, voltou para a casa. Lá chegando, ainda teve que aguentar o bafafá: - E aí, deu certo? – falou vovó Anália. - Sim. – respondeu minha mãe, exausta. - Inscreveu o menino, minha filha? – Sim, papai. Até foto tiraram dele. – Ele saiu bem na foto? – perguntou tia Elda. - Isso eu não sei. Acordei com uma luz no rosto. - respondeu minha mãe. – E quando sai o resultado? – perguntou uma vizinha. Mamãe, esgotada, replicou: - Disseram que em dezembro sai o ganhador. – E qual o prêmio? – perguntou meu bisavô Floriano. - Não sei, vovô. Eles não falaram, mas deve ser um grande prêmio. – Certamente! Você vai ganhar tanto dinheiro que essa criança nem vai precisar trabalhar. – falou animada a minha bisavó Luzia. Que Deus a tenha ao seu lado!!!!!

Bem, no domingo de 23 de dezembro de 1956, meu avô, após voltar do jornaleiro, chegou aos gritos: - O garoto é mais bonito que Alain Delon, Marilyn Monroe e Brigitte Bardot! – De quem fala, Antônio? – perguntaram minha mãe, meu pai, minha avó, meu bisavô, minha bisavó. Meu avô pulou como um canguru e mostrou o jornal aberto a todos: - Aqui está o nosso garoto estampado no jornal! Foi o campeão do concurso bebê Johnson! Logo, todos gritaram: Vá, Terezinha! Vá buscar o prêmio! Esse guri está com o futuro garantido! Coitada, minha mãe toda feliz nem esperou o ônibus. Foi direito ao ponto de táxi. Mas que azar! O único carro disponível era um Ford 29, daqueles que a partida era feita girando uma manivela, que ajudava o motor a entrar em funcionamento. Gira que gira a manivela e nada. Minha mãe, desesperada, perguntou: - Pega ou não pega? Nada que um bom relógio de cordas não ajude. Após quatro ou cinco maniveladas....afff, o carro pegou. Entrando no carro, minha mãe falou ao taxista:

- Ande o mais rápido possível, pois estou atrasada. Já o taxista respondeu: - Olhe, minha senhora, essa tranqueira já disputou corrida com tartaruga e quase ganhou. Tenha paciência. Cinco horas depois, chegando no jornal, toda radiante, minha mãe perguntou a um atendente onde receberia o prêmio do concurso "Bebê Johnson". Um senhor muito educado deu um vale para ela e falou: - A senhora pode ir à loja do Mappin e apresentar esse vale que vão atendê-la. Mais do que de pressa, ela foi para a loja. Lá chegando, um vendedor a recepcionou e disse: - Parabéns, minha senhora! Não é qualquer um que é bebê Johnson nesse nosso Brasil! Seu filho ganhou o concurso! Agora a senhora pode escolher qualquer um dos brinquedos daquele departamento. – apontou o vendedor. Final da história. Claro que não me recordo, mas minha mãe me contou que escolhi um "João-Bobo". Para quem não conhece, é aquele boneco de plástico que, por mais que seja inclinado, tende a permanecer de pé. É... o prêmio que já me daria uma bela aposentadoria no meu primeiro ano de vida, ficou para outra encarnação! Por hora, depois de 35 anos de contribuição, aguardo sentado na fila do INSS, os minguados cruzeiros, aliás, hoje reais. E quanto ao destino do “João – Bobo”, sou sincero. Toda vez que vejo um, começo a tremer de raiva.

Estêvão Zizzi
Enviado por Estêvão Zizzi em 19/07/2023
Reeditado em 20/07/2023
Código do texto: T7841015
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