DE VOLTA PRA MINHA TERRA

Minha vida está resumida a um objetivo: voltar à minha terra, abraçar e beijar minha mãe e meus irmãos. O porquê dessa obsessão conto aqui! Meu nome é Celita, nasci na roça, na fazenda Urubu, distante da cidade (ITIÚBA), distante da capital (Salvador), distante do mundo. O meu pai era cego e com sessenta anos resolveu casar com uma mulher quarenta anos mais nova. E foi desse casamento que dez anos depois eu nasci, ou seja, meu pai tinha setenta anos quando eu vim ao mundo. Não vou me aprofundar em detalhes pra não banalizar o meu relato. Digo apenas que minha mãe, pelo fato de ser nova (será que esse é o fato mesmo?), não tinha juízo e provavelmente por isso, depois que dilacerou o cabedal do meu pai, fugiu com outro homem mais novo do que ela, deixando meu pai apenas comigo, a casa que morávamos e o dinheiro da aposentadoria. E justo no momento que mais nós precisávamos dela, eu pela tenra idade, meu pai pela idade avançada e pela deficiência. Eu era muito agarrada a meu pai, toda filha é, né? Como ele não tinha ninguém mais próximo, era eu quem guiava ele, de modo que ficávamos juntos vinte e quatro horas por dia. À noite ele dormia numa rede, eu numa caminha ao lado da rede. Não saía de perto dele. Fino e educado que ele era, me educava como se educa uma princesa. E eu era a princesa dele. Aprendia tudo que ele me ensinava não o desobedecia, tentava não magoar ele, não desapontar ele. Mas nada disso foi suficiente pra ele recuperar a auto estima (O carrancismo de homem, nordestino, da roça, tem esse poder), de modo que ele debilitado pela velhice e acabrunhado pela desonra, ficou doente, foi definhando, definhando, não resistiu e não ficou comigo o tempo suficiente pra me ver crescer. É isso mesmo! Se acabou! E se acabou nos meus braços (Felizmente eu fui forte, ou era jovem de mais pra entender, mas suportei). Achei que tinha acabado comigo também, mas... Revoltada, com minha mãe e com a vida, sem confiar nos parentes que ainda restavam, nem em ninguém daquele lugar, acompanhei um casal daqui de São Paulo que estava lá a passeio e vim parar aqui. Aqui acabei de crescer, casei e tenho uma filha de dez anos, que é uma princesa. Quando minha filha nasceu, eu perdoei a minha mãe (ou será que é ela que tem de me perdoar?) e prometi a ela, à minha filha e a mim, que em breve, ou assim que pudesse, iríamos vê-la. Mas nunca pude. Meu marido não consegue um emprego decente, o que eu ganho não é muito e não dá pras despesas de viagem, minha e da minha filha, de modo que venho adiando, adiando e ainda não pude levar minha princesa pra vó conhecer, já que o avô não pode esperar pra conhecê-la. Mas tenho medo de morrer ou saber que minha mãe morreu, sem receber meu perdão pessoalmente. E sem conhecer a neta

 

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