Aos Domingos

Não entendia direito por que tia Lindalva todo santo dia pedia para ver meu gogó. Até comecei a achar que estava caducando “você vai ser um menino safado” e saia com a bíblia debaixo do braço, tia Lindalva sempre foi de juízo, não era casada, nem se quer teve namorado, era católica daquelas que não largava a bíblia por nada. Às vezes vinha uma vontade de perguntar por que ela não era casada, mas tinha medo de levar um tabefe no meio da cara. Eu já estava com alguns fios de cabelo no rosto já estava na idade certa para estudar catequese, era outra curiosidade que tinha sobre minha tia, por que ela só ensinava catequese quando os meninos começavam a apontar os primeiros fios de cabelo no rosto? Ela sempre dizia que eu estava novo para entender as coisas de Deus. “Quando você estiver com o gogó grande, você entra” em certos momentos, cheguei a achar que ela não era minha tia, até tomar ovo cru já tinha tomado, para crescer o gogó.

O sol já estava ficando frio e tia Lindalva nada de voltar da igreja. Nove e meia e lá vinha ela cumprimentando cada cidadão que encontrava na rua, aquele não era o jeito de tia Lindalva. Até chequei a estranhar aquela feição dela, só tinha visto aquela expressão na morte de Getúlio. Ao entrar em casa, não falou comigo nem com meu avô, foi direto para o quarto, parecia que estava em outro plano. Eu realmente tinha muitas curiosidades sobre tia Lindalva e uma das que mais me perturbavam era por que toda vez que ela ensinava a oração de São Raimundo, ela vinha tão desorientada da vida. Eu achava que era porque a oração era muito forte. Foi quando, em um dia de sábado, minha tia olhou para o meu gogó e disse “Menino do gogó grande, já está na hora de estudar a catequese” ela nem imaginava quantos ovos desapareceram do ninho, meu avô, coitado, achava que eram os ratos.

Enfim chegou o tão esperado domingo! Botei minha melhor roupa e fiquei esperando minha tia com vestido domingueiro dela, cobrindo dos pés à cabeça para não perder a decência. “Para que essa arrumação toda?” Nesse dia, ela nem olhou para o meu gogó e inexplicavelmente alisou minha barriga.

Lá estava eu, indo ladeira abaixo com os demais garotos sem saber dos olhares que aqueles meninos me lançavam, todos com olhar de piedade, eu nem imagina o que estava por vir. Ao entrar no anexo da sacristia, minha tia pediu para que os meninos abrissem a bíblia, olhava de rosto em rosto para ver se estávamos com a barba apontando. Eu tinha alguns fios de cabelo no queixo, mas eram o suficiente para ela, os meninos como já estavam há muito tempo na catequese, rezavam só. Minha tia ficava sozinha com os novatos no quartinho do fundo do anexo. E agora era a minha vez de visitar esse quartinho. Nesse dia tirei todas as minhas dúvidas sobre minha tia. Ao entrar naquele minúsculo quartinho, imaginei que faríamos algum tipo de reza especial, porém, para o meu espanto, minha tia pediu para que eu esfregasse o meu rosto no seu busto, eu achei um pouco estranho “Esfregue. Quero sentir a pulsação dos seus pecados e tire toda sua roupa. Vamos ficar pelados como Adão e Eva no paraíso”, assim ficamos. Eu não estava entendendo o porquê daquilo e para completar minha aflição, ela fez o sinal da cruz, olhou nos meus olhos e disse “entre dentro de mim.” Ela começou a se expor lentamente e quando percebi já estava dentro dela. A sua voz sussurrada fungava meu pescoço. Depois de muito tempo senti um líquido quente descendo pelas minhas pernas.

Nesse dia quando cheguei em casa, encontrei meu avô sentado no sofá com um senhor engravatado todo engomado, eu nunca tinha visto tanta compostura em uma pessoa só e senti um tremor ao tentar imaginar o que aquele ser estava fazendo ali. Meu avô pediu para que eu sentasse com eles no sofá. Depois de muito lengalenga o engravatado puxou um papel (o que me deixou ainda mais aterrorizado), dizendo que meus pais biológicos queriam me conhecer.

Gleison da Silva Santos
Enviado por Gleison da Silva Santos em 17/11/2021
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