Ziguezagueando 21

Passou ficar difícil fazer montagem de cada um naquele estado que eram antes de se conhecerem.

Jovita chegou até a área comum, do lado externo do apartamento, pé por pé, era mais de meia noite, acreditou não ter sido notada pela mãe e filha no excesso das horas. Estava acostumada trabalhar até tarde, ainda mais em final do designe para a coleção que seria lançada. Depois de anos de casa, sua presença na empresa era fundamental, passou ser útil para o efeito luz e sombra na finalização dos modelos que criavam.

Quando chegou ao apartamento, acendeu a luz, dona Zirá, sua mãe, estava sentada em posição almofadada, de destaque no sofá. Dirigiu os olhos nos de Jovita , foram os que levaram a primeira impressão à aventureira, concluiu que a mãe tinha descoberto algo do dia. Pensou rapidamente: Mas como?

Zirá, naquele olhar circunspecto, foi adiantando, no atropelo das palavras que cravaram certeiramente no juízo de Jovita: Que história é esta de sair de sutiã e calcinha em manifestação pela rua, defendendo causa alheia? perdeu o Juízo? Assistia ao jornal local agora a noite, sai você toda serelepe, com os olhos até fechados, gritando como louca, praia limpa já, no meio daquela multidão de desorientado. Pensei que tinha caído a ficha de que o sucesso a qualquer custo é somente em prol da própria vida. Não sabe que o mundo perdeu os freios, que não tem jeito parar isso aqui mais? Acorda Jovita!! acorda! Praia limpa, já! Pura libertinagem de quem não tem o que fazer, saem para as ruas arrumando desculpas para o vandalismo, para a pouca vergonha, para o despudoramento.

Ajeitou as ancas no sofá, deu uma fungada, e falou: O pessoal da empresa ligou aqui, pareciam querer falar com urgência contigo. E eu de bobona, disse que você tinha ido para empresa. Te liguei no celular, e nada! Estava quase para ligar para polícia, quando sentada em agonia, eu, que nem sou mais de jornal, pego vendo você neste abusamento no Jornal Regional. Pensei até que era miragem.

Levantou em seguida, deu mais uma bufada profunda de desaprovação, disse que iria dormir.

Dona Zirá tinha uma opinião antiga formada sobre o mundo, não sabe se foi a vida que a endureceu, lado indomesticado da alma que não foi amaciado pela satisfação, talvez pela falta do motivo a mais de uma felicidade que não veio, ou até porque traduzia com maturidade e certeza de que a vida era assim mesmo. Mas falava: Eita mundão veio sem porteira!!!

Bastava assistir a um noticiário na TV de ocorrência policial, ou de guerra, até mesmo catástrofe natural, que ia dizendo: Isto aqui não tem jeito não, tem que acabar! Saia resmungando palavras baixinho, parecendo xingamento.

Jovita tomou banho, foi para a cama dormir, finalizaria um dia diferente, o único que não a permitiu tirar conceitos, conclusões. O sono veio repentino, dormiu profundamente até o outro dia, manhã como as outras, agora fertilizada de uma interiorização feminina de aceitação e acolhimento da vida como ela era, que depois das primeiras ações rotineiras, chegou até a empresa, preparada para as advertências e engarrafamentos das atividades, que haviam se acumulado do dia anterior.

Dona Zirá ficou somente com a metade da história, respeitava a idade da filha, não fez mais indagações, pode ter a perdoado pelo lapso raro ocorrido do excesso, nunca tinha feito algo tão extremo como do dia anterior, afinal, a vida da filha era somente trabalho e nada mais. O amor materno fez dona Zirá levantar no outro dia de manhã, fazer o café, e servir a filha. Não tocou mais no assunto.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 23/06/2018
Código do texto: T6371715
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