A FELICIDADE ESTÁ LÁ FORA
 

   - Você é feliz? – perguntou João a seu amigo Pedro, sentados à mesa de um bar, em uma ensolarada manhã de sábado.
Pedro pensou um pouco, levou o copo até à boca, quando se achava que iria tomar apenas um gole, virou de uma vez esvaziando tal objeto para, em seguida, devolvê-lo à mesa. Ficou parado uns três segundos pensando para só então olhar nos olhos de João e dizer:
   - Desde que percebi que a felicidade não existe, eu me tornei uma pessoa mais feliz.
   - Como assim? O que você está falando é uma contradição – argumentou João.
   - Até poderia ser, mas não é. As pessoas estão sempre se perguntando sobre a felicidade. Estão sempre preocupadas em viver uma vida feliz.
   - E isso não é bom? Afinal de contas esse é o objetivo de todos – disse João. – Estamos sempre buscando o melhor entretenimento, o melhor trabalho, as melhores pessoas para conviver... Estamos sempre buscando nos divertir, nos distrair... A vida é feita disso. Não vá agora querer me dizer que você não é assim?
   - Não, não é isso. Você tem razão. Eu também procurava essas coisas.
   - Procurava? Não procura mais? Não estou entendendo. – falou João tirando o chapéu para coçar a cabeça, já se mostrando um pouco confuso.
   - Vou tentar explicar. Quando falo que a felicidade não existe estou falando dessa felicidade a qual as pessoas tanto buscam. Essa felicidade que está atrelada a coisas materiais e não é só isso, mas também a situações perfeitas ou utópicas.
   - Pode continuar! – falou João, apoiando o queixo com a mão.
   - O que temos hoje é uma grande mentira que, de tanto ser repetida, está se tornando verdade. As pessoas estão cada vez mais entregues ao mundo do consumismo e acreditam que será neste mundo onde elas encontrarão a felicidade. Por exemplo, eu compro um celular, passo um tempo aprendendo suas funções, mexendo nas suas configurações, verificando a potência de sua câmera para tirar milhares de selfies, tudo uma maravilha. Entretanto, após alguns meses, eu descubro que aquele aparelho já tem uma versão mais atualizada e com mais funções. Toda aquela minha alegria adquirida com o meu celular atual já é passado. Agora eu fico angustiado porque os outros já estão usando um modelo de última geração e eu não. A felicidade de antes alcançada com a compra do objeto já não existe mais. Ela só voltará se eu conseguir novamente satisfazer esse desejo com a compra do novo aparelho. E isso não acaba nunca. Serve também para aqueles que acham que a felicidade está em uma viagem que ainda não aconteceu, ou ir ao shopping para comprar um monte de roupas que, muitas vezes, perdem sua validade no primeiro momento de uso. Fique sabendo, João, que estamos escravos de um sistema que nos vende uma ideia de que a felicidade está sempre fora de nós. Está sempre no “outro”: uma pessoa ideal, um objeto perfeito etc. Por isso, cada vez menos as pessoas param para refletir sobre si mesmas. O que está fora de mim se torna cada vez mais importante do que o que está dentro de mim.
   João estava atônito. Jamais pensou que uma pergunta aparentemente tão clichê pudesse trazer reflexões tão profundas. Mudaram de assunto, pois o jogo de futebol tinha começado.
   O sábado passou, domingo também. Já faz alguns meses daquela conversa e ainda hoje João lembra com saudade do seu saudoso amigo Pedro, vítima fatal de um acidente de trânsito. Isso sempre acontece em momentos como este, em que ele está sentado em um banco, dentro de um shopping, observando sacolas que vem e que vão, cheias de felicidade.

Rogério Rodrigues
Enviado por Rogério Rodrigues em 05/07/2017
Reeditado em 15/04/2022
Código do texto: T6046244
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