A vida como ela é III

Às vezes quando se tem uma vida rica e farta, costuma-se esquecer de um bem que um dia nos foi muito caro e importante.

Eram um casal de jovens.

Se conheceram em dado momento da vida, numa certa cidade, longe de suas respectivas terra natal, quando ali estiveram cursando a faculdade.

Era uma manhã ensolarada, quando seus olhares se cruzaram. Foi um encantamento à primeira vista, naquele instante nasceu um elo de sentimentos nobres entre uma jovem e um jovem adolescentes.

Cada dia a mais de convivência, a amizade e o bem querer os envolvia mais, tornando-os mais próximos e “dependentes” da companhia do outro.

Os dias se transformaram quase que em uma doce espera, ficavam torcendo para que as noites passassem depressa e assim, o dia logo chegasse e eles pudessem encontrar o outro, mesmo que fosse um oi apenas.

Não compreendiam direito que sentimento era aquele, imaginavam que se tratava de amizade apenas. Se ficavam sem se encontrar o outro sentia sua falta e quando estavam de férias então, não viam a hora de retornar ao convívio do outro.

Em todos àqueles anos de convivência, nunca houve entre os dois algum momento de intimidade ou mesmo de alguma liberdade mais atrevida. Sempre se respeitaram mutuamente, cuidando e zelando do outro tal qual se cuida de um objeto de estimação de imensurável valor, assim como um vaso de cristal – que além da sua beleza, ainda tem a sua fragilidade – para não quebrar.

Ela gostava de ser cortejada por ele, gostava dos seus cuidados, do seu zelo, mas desvencilhava com maestria de alguma tentativa maior dele que pudesse dar lugar a uma possível declaração de amor.

Ela percebia que ele gostava dela e ela, apesar de gostar dele também, não podia retribuir ao sentimento, pois ela chegara ali com o seu coração já pertencendo a outro. Então toda vez que ela se sentia “ameaçada” pelos sentimentos dele , ela procurava afugentá-lo e isso ocorria às vezes até de maneira agressiva.

Ele por sua vez, tímido que era, nunca teve coragem de abrir seu coração pra ela, pois sabia que era bem possível ela se afastar de vez dele e isso seria o fim.

Assim, concluíram seus estudos, ele um pouco antes e ela depois, sem se permitirem falar para o outro daquele sentimento. Só foram perceber o tamanho desse sentimento, quando se separaram de vez, quando ele foi embora e ela ficou concluindo os estudos.

Foi muito difícil para ele, separar dela. A despedida então, foi uma das maiores se não a maior dor que ele sentiu na vida, estava deixando ali um pedaço do seu ser. Mas não havia o que fazer, tinha que seguir seu caminho.

Ela ao retornar de férias para concluir seus estudos, pode compreender o tamanho daquele sentimento, em seu peito havia um vazio enorme, algo que ela nunca havia provado antes. Mas sabia que teria que ser assim. Não era mulher de ficar deixando levar pelas coisas do coração, era muito razão.

Cada um seguiu o seu caminho, levando o outro no coração e na alma, as doces recordações e o gosto da saudade.

Os anos foram se passando, constituíram suas famílias, criaram seus lares, tiveram seus filhos, mas o outro sempre ali, na lembrança e no coração, tendo a saudade como fiel companheira.

Ela apesar de o ter presente nas lembranças, procurava não deixar que a saudade tomasse conta e por isso, evitava se “abrir” muito quando se comunicavam, para não deixar transparecer o quanto saudosa dele estava.

Ele um pouco diferente dela, vivia se controlando para não dar bandeira, ficava medindo as palavras para não deixar se revelar. Nem precisava disso, pois ela percebia perfeitamente o que se passava com ele, mas se fazia desentendida.

Ela, era o primeiro e o último pensamento do dia para ele. Já não estava conseguindo esconder àquele sentimento que lhe envolvia por inteiro. Resolveu que iria se declarar.

Não esperava nada em troca, queria e tão somente queria, lhe revelar àquele sentimento lindo que a ela pertencia. A vida para ele já se ia inclinando para o seu poente e não era justo que ela ficasse sem saber por ele, se acaso a vida resolvesse se abreviar.

Mas foi um desastre... Ela apesar de sempre ser sabedora daquele sentimento dele, não esperava por àquela declaração, sentiu-se ameaçada, invadida na sua privacidade sentimental e até familiar. Sua reação foi ríspida e felina, tal qual uma leoa a defender sua cria. Atropelou todo um passado, se esquecendo de quão foram puros e nobres os momentos vividos na companhia dele.

Ele se sentiu todo desconcertado e decepcionado, sentiu vontade de cavar uma cova e entrar dentro. Como ela pôde reagir tão duramente com ele, que tão inocentemente abriu o coração para ela?...

Ele se viu arrependido de tê-lo feito, melhor teria sido deixar as coisas ser levadas pelo imaginário.

Para ela foi como se tivesse perdido o encanto... Ela apesar de sempre desconfiar do sentimento dele, sempre procurou evitar que ele lhe falasse abertamente, tinha medo de não saber como lidar com isso. Talvez por medo do sentimento dela mesmo; talvez por não poder retribuir; talvez por não poder dizer o que ele gostaria de escutar ou mesmo, o que ela tinha vontade de dizer.

O tempo que às vezes é o melhor lenitivo, também pode nos fazer acostumar com a distância ou ainda, arrastar o outro para longe da gente.

E foi algo assim que aconteceu com ela. Esqueceu-se dos belos momentos que viveu no passado e junto com eles ficaram também, enterrados as doces lembranças da companhia de um alguém que por uns tempos lhe foi uma agradável companhia.

Além do que, às vezes quando se tem uma vida rica e farta, costuma-se esquecer de um bem que um dia nos foi muito caro e importante.

O sentimento às vezes é o mesmo entre duas pessoas, mas tem peso diferente. Com certeza, o sentimento que ele traz na alma, faz seu coração bater em frequência diferente do dela, embora seja possível que ela possa nutrir por ele sentimentos de igual teor.

08/02/2017

Menino Sonhador
Enviado por Menino Sonhador em 09/02/2017
Reeditado em 10/02/2017
Código do texto: T5906895
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