Antagonismo
Ela encostou o rosto no vidro, estava frio! Sua respiração acelerada embaçou a visão que ela tinha do interior ricamente iluminado.
Lentamente, num gesto impensado, passou os dedos sobre, a superfície fria como se pudesse apagar junto com as marcar que deixara a tristeza que trazia. Podia sentir o calor e o aroma que vinham de dentro, convidativos e traiçoeiros. Fechou os olhos, antecipando o prazer de entrar e fazer parte daquele mundo proibido e hipnotizante que aguçava todos os seus sentidos.
Agora, apenas um vidro a separava de seu objetivo. Não queria esperar, mas aqueles minutos esticados eram o anticlímax de algo que aguardara com ansiosidade por muito tempo. Como se não pudesse mais adiar, entrou com o andar vacilante e com a cabeça erguida em forma de desafio, passou pela porta sentindo vários olhares acompanharem seu corpo magro e maltrapilho. Será que seria expulsa dali, enxotada como um cachorro sarnento que não pertencia àquele mundo de opulência e conforto?
O rapaz alto e de uniforme engomado que a atendeu parecia cheirar o ar ao redor dela e mesmo ante o olhar desdenhoso dele, a voz saiu confiante.
- Eu tenho o dinheiro, posso pagar.
Sentou. Tirou uma pequena vela do bolso e a acendeu.
Sobre uma toalha de renda imaculadamente branca, uma grande fatia de bolo colorido e extravagante a esperava.
Ela sorriu. Fechou os olhos e suspirou profundamente.
Seus lábios moviam-se perdidos em uma prece ou num pedido mudo. E proferiu num sussurro satisfeito quase inaudível:
- Feliz aniversário!