O GALEGO PILECO

O sanatório São João abrigava uma grande quantidade de internos, e passava por dificuldades financeiras. A direção desta casa de saúde estava prestes a dar alta a pelo menos cinquenta pacientes. Neste contingente havia muitos que incorporavam celebridades da música, outros acreditavam ser médicos, advogados e juízes. Um dos internos que se destacava chamava-se Galego Pileco. Ele considerava-se o líder daquela numerosa turma de colegas da lotada casa de saúde. Este interno dizia que o mundo precisava de um líder. E por isto sentia-se preparado para assumir este posto. O que lhe credenciava a alçar tamanha responsabilidade era a leitura que ele fazia sobre grandes governantes. Durante os sete dias da semana, Pileco assumia um papel diferente. Nas segundas e quartas ele era Getúlio Vargas. Nas terças, quintas e sábados transformava-se em Gandhi. Mas aos domingos assumia a identidade de Raul Seixas e fazia a alegria do sanatório. Pileco produzia manuscritos chamados de "Constituição Federativa da República de Tira Cocos". Segundo ele, estes papéis dariam-no plenos poderes de presidente da república. Nesta "Constituição não haviam parlamentos, instituições jurídicas, tampouco administradores estaduais ou municipais. Tudo seria controlado pelo presidente da república. A sede do governo possuiria uma pequena quantidade de câmeras. Segundo os cálculos de Pileco, seriam apenas um bilhão de lentes. O número de seguranças não passaria de cem mil. As principais ações de seu governo seriam pautadas em intervenções no comércio, indústria e no setor de serviços. Todos estes setores pagariam 80% de impostos ao novo governo. O Estado empregaria toda a população de desempregados. Esta massa trabalharia na construção de pontes sobre casas, e fabricação de carros voadores movidos a espirros humanos. Estes projetos estavam sigilosamente guardados a sete chaves em uma pasta escondida no quarto do "líder". Tudo isto fora planejado nos últimos trinta anos de internação. O "líder" aguardava com ansiedade a sua saída do sanatório. O dia finalmente chegou. O nosso Galego Pileco foi o primeiro a postar-se diante do portão. A hora marcada para a liberação dos internos estava próxima. Pileco mostrava-se nervoso. Ele estava bem vestido com um terno branco, gravata borboleta e um perfume forte para impressionar os seus seguidores. Todos os pacientes foram postados em fila indiana. O relógio registrava 10 horas. O seu tic e tac enervava o nosso "líder". De repente um guarda apareceu, olhou Pileco de cima a baixo. Visualizou a pasta, que ele carregava com muito cuidado, e conferiu o crachá dele. Então falou: - O senhor é Jovinaldo Pires Santos?. - Sim. Respondeu o ´"líder". O guarda assim complementou: - O senhor não tem autorização para sair deste local. - Mas por qual motivo?. Respondeu Pileco. O guarda explicou que ele não completara a maioridade naquel sanatório. A sua saída seria permitida quando compleasse 48 anos. O nosso "líder" retornou triste para o seu quarto. Mas estava comformado. Ainda não tinha redigido toda a "Constituição", e agora tinha ainda 18 anos para terminar todos os artigos. Mais tarde, soube-se que o tal guarda era na verdade um paciente novato que alegava ser a autoridade policial naquele tranquilo sanatório.

Levi Oliveira
Enviado por Levi Oliveira em 11/09/2015
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