Os chutes do Eunápio! (EC)
Eunápio não podia acreditar em sua tremenda sorte...
NUNCA havia ganho jogo algum, nem nas disputadas partidas de bola de gude com os amiguinhos em sua época de criança conseguia levar vantagem!
Como é que agora, já com tão avançada idade conseguira vencer um desafio com tão experimentado profissional de futebol?
E tudo devido à carta encaminhada por seu enteado Zezinho para um programa de desafios veiculado por um canal de TV, que em meio a milhares havia sido sorteada!
Em programa televisivo, com transmissão ao vivo para todo o Brasil, teria de bater e converter, três penalidades máximas em improvisada meta sob a qual se encontrava alguém que havia sido goleiro de um selecionado brasileiro. E ele, NUNCA havia batido penalidade sequer em peladas quanto mais valendo alguma coisa! Para os amigos, até que se saia bem atuando medianamente na zaga enfrentando bons atacantes, porém, quando se tratava de encarar disputas que envolviam cobranças de penalidades, era sempre colocado no final das escolhas, enfrentando o desafio somente se não houvesse mais quem bater...
E o pior (ou melhor, se conseguisse...)! O prêmio pela façanha seria R$ 20.000,00 em espécie, o que o tiraria das dívidas nas quais estava ‘afundado’ e mais uma viagem de navio pela costa brasileira, sonho que de há muito acalentava!
Como havia ainda uma semana para que tal evento ocorresse, resolveu apelar para o amigo Cavadinha, que era um exímio cobrador de penalidades, no sentido de que lhe desse algumas dicas de como proceder para tentar obter êxito nesta sua missão.
E, para surpresa do Cavadinha, logo que iniciou seus treinamentos para execução da prova que lhe era devida, Eunápio saiu-se de forma auspiciosa. É certo que contavam com a ajuda do amigo Zé Frango, que os auxiliou ficando sob as traves nos treinamentos executados. E o goleiro auxiliar NUNCA havia chegado nem a terceiro goleiro nos times de várzea pelos quais atuou. E o adversário de Eunápio no desafio era um profissional do esporte que inclusive já havia jogado na seleção brasileira...
E os dias, da forma como vem ocorrendo ultimamente, transcorreram de forma rápida.
Quando menos esperava, lá estava o ansioso Eunápio sendo preparado pela produção do programa para entrar no ar...
Devidamente paramentado, com calção, camiseta, meia, tênis... Chamado pelo apresentador, um sorridente desafiante ingressou em um iluminado palco.
Depois de muito blá, blá, blá, comerciais, bajulações, etc., próprias dos programas televisivos, armou-se o cenário para ter inicio o evento em si.
Explicadas todas as regras que vigorariam no desafio, onde Eunápio teria cinco chances de batida de penalidades, sendo que deveria converter três, foram posicionados. Neste instante, já com o goleiro do selecionado nacional sob as traves, Eunápio olhou para seu alvo suando frio! Parece que o defensor havia crescido e que a meta havia diminuído. Agora parecia que nem haveria espaço para que uma bola passar pelo goleiro e adentrar aquela meta!
Porém, o momento havia chegado e tinha de ir em frente.
Respirou fundo e aguardou a ordem para sua cobrança.
O apresentador pediu silêncio para o público, perguntou Eunápio se estava preparado e apitou, tal qual um juiz oficial de futebol!
Eunápio partiu para a bola e disparou um chutaço que passou muito longe do alvo!
A plateia e o apresentador foram literalmente à loucura. Os comentários e os sorrisos colocaram nosso herói mais para baixo ao invés de incentivá-lo. Mas como programa de TV ao vivo não pode parar, novo apito do apresentador para dar continuidade ao show...
Eunápio novamente olhou para seu alvo e novamente viu um imenso goleiro sob um pequeno local onde deveria encaixar a bola.
Como tempo é dinheiro no show business, Eunápio partiu e chutou. A exclamação da plateia denotou novamente o erro cometido. Desta feita Eunápio chutou pelo alto, quase atingindo os holofotes que iluminavam o cenário...
Novamente, o apresentador denotou todo o seu aparente desânimo pelo desempenho do participante, enfatizando que agora ele só tinha três chances e que deveria converter todas para atingir o que estava almejando. Um misto de desânimo e quase entrega total apossou-se de Eunápio.
Novamente posicionado, desta feita Eunápio não olhou para seu alvo, deslocando seu olhar para a novamente quieta plateia. Incrivelmente seu olhar focou-se em Zezinho, Cavadinha e Zé Franco que, sentados lado a lado no meio da plateia, ergueram seus polegares em sinal de positivo...
Eunápio aspirou e suspirou profundamente por algumas vezes, até ouvir novamente o apito do apresentador do programa. Silêncio total no estúdio, Eunápio tranquilamente aproximou-se da bola e com um leve toque encaixou a bola no lado esquerdo do goleiro que saiu para o lado direito!
Houve um delírio na plateia e, guardadas as devidas proporções, Eunápio sentiu como se houvesse marcado o gol que dava um titulo mundial de futebol para o Brasil! Olhou novamente para onde se encontravam os amigos e viu que permaneciam estáticos na mesma posição anterior!
O apresentador pediu novo silêncio, lançou novamente mão do seu apito e o trilou.
Eunápio, com o mesmo procedimento anterior, resolveu enquanto se encaminhava para o chute, mudar de lado onde deveria chutar. E o fez! E obteve novo sucesso, com o goleiro saindo para o lado esquerdo.
Novo delírio na plateia e na empolgação do treinador, que enfatizava agora a necessidade de apenas mais um acerto do concorrente para que abiscoitasse os dois prêmios!
Eunápio parecia nada ouvir, só aguardando a ordem para terminar aquele aparente martírio.
Resvalou novamente o olhar para os amigos e os viu como se estivessem petrificados, mantendo a mesma posição!
O burburinho cessou. O apresentador solicitou atenção, colocou o apito na boca e o soou...
Novamente, Eunápio andou em direção à bola e tocou de leve encaminhando-a novamente para o mesmo lado no qual havia enviado na batida anterior. E o goleiro também novamente saiu para o lado esquerdo, apenas observando a bola entrar na meta lentamente no seu lado direito.
Delírio total! Enquanto sirenes tocavam, holofotes piscavam, chuva de confetes e serpentinas caiam do teto do cenário sobre os participantes.
O apresentador cumprimentou o vencedor, que tal qual um atleta vencedor de um campeonato importante (e assim o era para ele, necessitado do valor pecuniário e de realizar um sonho contido por muito tempo e que seria quase irrealizável por um seu esforço pessoal...)!
O apresentador, microfone em punho, agora ladeado pelo vencedor e seus amigos que invadiram o palco para abraçá-lo, vociferou: “Senhores e senhoras, eis aqui um claro exemplo de alguém, pelo que posso precisar por tudo o que li a seu respeito no transcurso de sua vida, pela primeira vez,... , nadou, nadou e desta feita não morreu na praia!”.
Agradeço ao jovem MESTRE poeta/escritor Aleixenko, carinhosamente por mim tratado como 'irreverente', pela excelente INTERAÇÃO!
OS CHUTES DO EUNÁPIO
Eunápio não acreditava na sorte
Ganhar prêmios como ele ganhou?
Pois é... ele nem chutou forte
Caramba! Eis que ele acordou
Este texto faz parte do Exercício Criativo - Nadou, Nadou e Morreu na Praia
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