Vortei nu tempo.

É anssim memo, tem veis que tô meditano e vorto nu tempo pra lembra do meu passado de minimo de roça, aprendeno a falá cus impregados da fazenda, é anssim memo.

Mêis passado tava eu aqui memo, quando me vi lá cunversano cueles sobre a vida boa que tinha lá. Foi quando um deles chegô a perguntou pra minha mãe, Sinhasinha , o Sinhosin tá aí? Tá sim, vô chamá. Vim correno pra incontrá meu amigo. E aí vai fazê o que hoje, preguntei? Respondeu Nacreto, vou pescá, qué i cumigo? Caro, vamu lá.

Era anssim memo, a gente num via o tempo passá de tão bãum que era, pescava, curria, brincano de pega-pega, andava nus cavalos, bibia leite nu currá, que maravia. Hoje, ah! hoje tá tudo diferente, dispois que vim aqui pra cidade mudô tudo, prendi lê, inscrevê, memo anssim num sô filiz não. Tô pensano in vortá , mais sei que lá tá tudo direfente tumem, arguns já morrerum, outros num fala mais anssim gostoso né? Sei lá, é vidinha que segue. Mais num vô dexá de sonhá não, quem sabe, podi cê que vorto, num futuro longe.

E é assim que às vezes choro aquele passado distante, longe da cidade grande, um menino cheio de vida, sonhador, sonhador continuo até hoje, mas não é a mesma coisa, pois naquele sonhar tinha felicidade, no sonhar de hoje só tem medo, falta de esperança, de chegar a algum lugar ileso, sem ser assaltado ou molestado por um inescrupuloso qualquer. Era vida que sorria e deixava a gente sorrir também, como era bom ouvir eles falando errado e compartilhar com eles para não envergonhá-los, ver a felicidade estampada em seus rostos só de poder conosco dar um dedinho de prosa como diziam, suas almas brancas, como também branca era a sua lealdade, seu respeito e admiração, e é por isso que as vezes tenho vontade de largar tudo e partir, partir em busca de um passado reluzente, tranquilo e feliz.

Mas hoje, ah! Hoje só me resta a lembrança, uma lembrança alegre, mas com um pós lembrança tenebroso, de incertezas, de frustrações ao pensar no futuro, que futuro? Me arrepio só em pensar no que vou deixar para aqueles que aqui ficarem quando de minha partida. Se hoje ainda pequenos eles não vislumbram nada, a não ser um horizonte sombrio, muito aquém daquilo que nós para eles projetamos. Fazer o que? Esperar e esperar que um dia nossas autoridades acordem, é assim mesmo minúsculo, acordem para nós e deixem de pensar apenas nas suas vidas, lembrarem que também temos vidas, que corre em nossas veias um sangue, não azul, mas vermelho como o que corre em nas suas próprias veias, e aí quem sabe deixarei de sonhar com o meu belo passado, deixando-o apenas em minhas lembranças, em minha memória onde guardo tudo com muito selo, porque foi dele que consegui tirar o que de mim resta, respeito, dignidade, moral e acima de tudo, a esperança, já que essa jamais há de morrer. Até breve e fiquem com Deus hoje, amanhã e sempre.

ChangCheng
Enviado por ChangCheng em 03/12/2014
Reeditado em 03/12/2014
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