Só um aperto de mão

Naquele momento o que eu mais queria era sumir. Não conseguia acreditar que estava ali, naquele quarto sombrio onde descansava no único catre um homem ou o que restava dele, corpo esquelético inerte, os olhos frios de um escuro quase morto a me fitar como se quisesse me dizer algo. Eu sabia que eles queriam me dizer alguma coisa antes de se fecharem completamente, para serem abertos em outra dimensão, num outro mundo, mas o que? Há anos passados nossa relação não foi das melhores, passei anos e anos sem falar com o mesmo, guardando uma mágoa que me fazia doer o coração, mas o orgulho me impedia de aliviar essa dor perdoando, não havia ainda aprendido a fazer uso desse sentimento tão nobre, o perdão.

Mas o que mais me preocupava naquele momento era desvendar aquele olhar, o que ele queria me dizer. Enquanto isso nos segundos seguintes analisava a situação, como que para disfarçar o meu nervosismo, minha inquietação diante do moribundo. Era triste ver um corpo que já fora cheio de vida ali agora prostrado, inerte, quase sem alma, já sem voz e sofrendo os erros de um passado atribulado e mais voltado para os erros do que nos acertos. Tinha que agir e descobrir logo o que aqueles olhos queriam me dizer e partir, antes que enlouqueceria de pavor diante de uma morte eminente. Me aproximei mais um pouco e fitando-os, percebi um movimento repentino do lado e vi quando seu braço a muito custo se ergueu e aperou a minha mão, era o que aqueles olhos queriam me dizer, ele só queria um aperto de mão. Só que não era um simples aperto de mão, nele havia embutido o pedido de um perdão sincero. Meu coração esquentou, amoleceu e eu perdoei, ato seguinte aqueles olhos se fecharam de vez e ele partiu.

Era apenas um aperto de mão, só um aperto de mão. Siga em paz Tio.

ChangCheng
Enviado por ChangCheng em 05/07/2014
Reeditado em 06/07/2014
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