MOCINHA DO INTERIOR

Ritinha olhou-se no espelho para conferir a maquiagem. Os lábios exageradamente vermelhos contrastavam com o rosto pálido, mas ela se achou bonita. Abriu o botão superior da blusa deixando mais um pouquinho de seu busto à mostra. Assim, chama mais atenção dos rapazes. Colocou os óculos de sol comprados na banquinha do camelódromo, apanhou a bolsa de juta e saiu para a rua.

Como era diferente a cidade grande. Ao invés do tropel dos cavalos, o ronco dos motores dos automóveis; no lugar do frescor da verde mata, a selva fria de concreto e em vez do sossego da fazenda, o barulho e o agito da metrópole.

Tinha boas lembranças da vida do interior, mas não queria voltar ao passado. Nas mãos ainda conservava os calos do trabalho pesado, do cabo do machado e da enxada. A vida no sertão não é fácil. Faça chuva ou faça sol é necessário ir para a lida para ganhar o de comer, trabalhar até o sol descambar do céu. Só sentia saudades, mas desertara para sempre das agruras do sertão.

No ponto do coletivo, enquanto aguardava, um rapaz a olhava com interesse. Era domingo, dia de folga, bem que podia arrumar um namorado para ir com ela ao Passeio Público, andar de mãos dadas, comer pipoca e algodão doce. Olhou para ele e sorriu. Seu coração bateu mais forte. Os moços da cidade são muito interessantes. Não são como os rapazes do interior, tão tímidos.

O ônibus chegou. Demorou um bocadinho, mas não tem importância, hoje é dia de folga, vou à cidade fazer compras, pensou. Comprar uma bermuda branca e um sapato novo, vermelho, de fivela. A economia de dois meses daria, talvez, para comprar também uma bolsa nova.

“Ufa, como este ônibus está lotado. Não faz mal. Assim fico mais perto daquele moço bonito.

Ai, ele tá vindo. Ui, parou atrás de mim e se encostou”.

Realmente, a cidade grande é muito divertida. Todos são alegres, sorriem, conversam. “Olha, tem até um bêbado cantando dentro do ônibus. E está olhando para mim”. Retribuiu o olhar e prestou atenção na canção:

“Tem gente mexendo na bolsa dos outros, eu vi. Tem gente mexendo na bolsa dos outros, vi sim”. Eta música lascada de ruim. Também, deve estar com a caveira cheia de cachaça.

Desembarcou na Praça Tiradentes, apreciou a Catedral, desceu a Marechal Floriano, passou a Rua das Flores e entrou na loja de roupas cheias de balaios. Num deles, lá estava, a bermuda branca que ela iria usar para ir ao “baile do desmanche”, no Vasquinho, ali no São Francisco, bairro dos ricos. Nossa, iria fazer sucesso com uma roupa nova. Quem sabe até levassem ela de novo para passear de carro no Parque Tanguá. É, ela já tinha ganhado carona para passear até lá. Era tarde da noite e o homem agarrou-a, mas o pinguelo dele não funcionou.

Foi ao caixa pagar, abriu a bolsa e... Cadê o dinheiro?

Na sua cabeça ainda rimbombava o bêbado cantando: “Tem gente mexendo na bolsa dos outros, eu vi. Tem gente mexendo na bolsa dos outros, vi sim...”

Obs: Baseado em fato real.

CLEOMAR GASPAR
Enviado por CLEOMAR GASPAR em 15/12/2012
Reeditado em 19/01/2013
Código do texto: T4037204
Classificação de conteúdo: seguro