A FALTA DO SENSO DO RIDÍCULO

A FALTA DO SENSO DO RIDÍCULO

Manhã tranquila, silenciosa; por que não dizer deliciosa!

Como estamos no período de férias escolares os ônibus rodam quase vazios.

Mas um dia nestes trinta e dois anos de luta como trabalhador assalariado. Lá vou eu para o trabalho. De ônibus como sempre. O lusco fusco da noite/dia faz brincadeira com quem olha ao longe, para o horizonte. Ora vê-se uma imagem dos contornos das serras escuras, ora o vermelhidão do dia que vem empurrado pelo sol.

Quis a imposição do meu anjo de guarda que me sentasse no primeiro banco á frente de duas pessoas... de chofre nem sei como denomina-las: línguas soltas, matracas, faladeiras, fofoqueiras...

Uma coisa é certa: o papo era sem pé nem cabeça, ou seja, sem nexo, plexo ou sexo. Para piorar o tom do som doía nos tímpanos de qualquer um.

Mesmo sabendo da falta de educação e/ou indiscrição, virei-me para trás e olhei-as, pelo menos para identificar aquelas que teimavam em desagradar gregos, goianos e insanos.

Identificadas: uma era obesa (para não dizer gorda), mais de vinte e menos de trinta anos; loira falsa, de pele branca descascada. A outra uma raquítica, de aparência desleixada, já passada dos quarenta anos, morena cinza... pode?

Mesmo vendo-me de cara fechada, olhando-as não se deram por achadas. Matraqueavam.

A loira falsa palrando:

- Fui convidada para ser madrinha de uma criança que vai nascer de uma vizinha.

A morena cinza quis saber detalhes:

- Não vai me dizer que é aquela que você diz que só não fleta com o sapo por que não sabe qual é o macho?

- Acertou em cheio!

E a maritaca acertou também meus ouvidos com mais uma saraivada de agudos e graves de doer.

A raquítica resolveu mudar de assunto:

- E a festa ontem? Parece que não foi o que você esperava.

A outra toda eufórica explica (parecia que estava fazendo um discurso para todos no ônibus):

- Nem te conto! Aquele morenão que eu estava de olho, apareceu lá... agarramo-nos, amassamos, ficamos... fui fodida! – gargalha como uma gralha do sertão – Hoje de manhã ele saiu do meu quarto trocando as pernas.

As duas gargalham para o sacrilégio das minhas bigornas, estribos e martelos...

Sem mais nem por que mudam novamente de assunto. A quarentona, sempre a que mais questiona:

- Você viu a novela ontem?

- E eu ia perder!

- Não gostei daquele beijo que x... deu no Y... (me recuso a escrever os nomes).

- Eu também não gostei. Beijo tem que ser molhado. E quando parar os dois têm que ficarem sem fôlegos.

Novamente gargalham nos últimos decibéis aceitáveis para humanos ouvirem.

A desleixada inquere a outra:

- O que será que vamos fazer hoje: lavar os banheiros ou varrer o pátio?

A descascada faz muxoxo como quem diz o que vier eu traço. Levanta-se, aperta a botoeira que dá sinal ao motorista de “parada solicitada”.

Quase tive um orgasmo por ficar livre delas. A paz retornará e o silêncio reinará.

Qual o quê?

Um casal de dois homossexuais, daqueles ultras escandalosos entra no ônibus exatamente quando as duas desceram. Para meu deleite ao contrário, se sentam onde antes estavam as duas ditas e referidas cujas.

Resignei-me: hoje não é meu dia!

Persignei...

Aleixenko
Enviado por Aleixenko em 23/07/2012
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