INCONFESSÁVEL SEGREDO!

 

 

Saía todas as tardes, tomava o metrô sentido norte-sul, 
só retornava no início da noite. A vizinhança já estava incomodada com essas escapadas de Vilma, toda arrumada, ostentando aquele batom vermelho hemorragia nos lábios.

 

- Dona Cotinha, a senhora notou o batom da Vilma hoje?

- Vi; e o sapato, então! Se ela cair daquele salto é bem capaz de se quebrar toda.

- A gente precisa descobrir aonde ela vai, todas as tardes, assim nos trinques...

- Xi, minha filha! Será que ela... Cala-te, boca, não quero nem pensar, ela é casada!

- Uai, minha filha, casada, mas não amarrada, né? Hehehehehe...

- Dora, você já observou o jeito que ela volta pra casa?

- E não, dona Cotinha!? Descabelada, parece que voltou
da guerra.

- Dora, eu tenho certeza que essa menina tá aprontando poucas e boas!

- Ainda bem que quando o marido chega, ela já está arrumadinha de novo.

- Coitado, tem marido que é cego!

- É, mas acho que as coisas lá não andam muito bem não.

- Ah, é? Me conta, vai...

- Outro dia, eu tava passando em frente à casa deles e percebi uma discussão entre os dois. Não que eu quisesse escutar, imagina, não sou dessas que ficam ouvindo atrás da porta, mas, sem querer, ouvi um pedaço do quiprocó. Tava rolando um guatambu lá.

- Num me diga, minha filha!

- Digo, porque ouvi uma boa parte da discussão.

- O que cê ouviu? Ah! Fala logo, que não me agüento
de curiosidade...

- Olha, dona Cotinha, num consegui entender bem as palavras, mas a gente percebe quando é briga, né...
Ainda mais briga de casal!

- Ah, Dora! Assim num vale... Trata de escutar direito da próxima vez.

- É, se calhar, de tá passando por lá, a senhora sabe que não sou de fofoca.

- Psssst... Ela tá de volta, venha, vamos até a janela pra gente observar.

- Nossa, dona Cotinha, hoje a coisa foi boa, ela demorou pra voltar!

- E toda descabelada!

- Olha lá, dona Cotinha! Observe a boca – tá sem o batom vermelhão!

- Que sem vergonha, meu Deus! Onde já se viu uma mulher com um marido bonito daqueles, arrumar amante.

- A senhora acha, dona Cotinha?

- Eu? Como dois e dois são quatro, minha filha. Tem amante na jogada!

- Que pilantra, heim! Sabe que um desses dias atrás, a gente se encontrou, na feira e eu joguei um “perdido” pra cima dela, pra ver se ela caía em contradição.
- Ah, é? E ela, soltou alguma coisa?

- Que nada, dona Cotinha! Ficou muda que nem uma parede.

- É, Dora... Sabe quando a gente vai descobrir?

- Quando, dona Cotinha...

- Nunca, minha filha! Mulheres assim guardam
segredos inconfessáveis!

 

(Milla Pereira)

 



Este texto faz parte do Exercício Criativo
 - Inconfessável Segredo -
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