Clube Literário

Mais uma, garçon! E pode pôr na conta. Que conta? Na minha não, que escritor num tem dinheiro, tudo sujeito lascado! Hojjjjje eu vou botar tuuuudo pra fora, tudo que táááááááááááááááqui dentro engasgado. Não vou vomitar não. Precissssssssso de balde coisssssa nenhuma. Num vou fazer como os colegas que atiram frustração na cara do leitor -- Ugh! -- Eu não! Mais uma aí, garçon, sejjjjjjjjjjja camarada! Vou fazer uma dedicatória pro senhor, masssss só se me trouxer maisssssss uma, e branquinha, que é da boa. Pode deixar, pode deixar que eu sssssei fazer. Num precisssssa me segurar não, que eu sei o que tô fazendo. Lembro da colega lá da aula de Francês que virou para uma das alunas e disse: "E você, minha filha, estuda Literatura?! Ai coitada, vai ter que casar com um homem rico senão acaba professora de Línguas, assim como eu." A aluna virou a cara para o colega do lado, os dois se olharam. "Casada eu já sou, professora." O colega era o mariiiiiiiidooo. Ops! Por isso é que eu digo: guarde suas frustraaaaaaaaaações só pra você. Num sei que mal tem em ser professor de Línguas. Profissão bonita, que mexe com as palavras, com os adjetivos. É mal paga e pouco reconhecida, como a de escritor, mas é bonita. Vale as penas. As letrinhas todas acessas, doidas pra se agarrarem no branco do papel. Bando de oferecidas! Isso ssssim é que elas são! Ah, mas tem também aquelas ingratas que se passa horas e horas lapidando, regando, passando a mão, tirando pulga, piolho, dando forma. E pra quê? Pra correr atrás do leitor, que nem percebe, ou pra que se agarrem ao primeiro treinado que passar, que decifra o segredo e leva o sentido pra bem longe, lá pra casa do Carrrrrvalho? Aí compensa... Diz que esse leitor é que o bom, que participa, que não tem preguiça de procurar chhhhhhifre em cabeça de alfinete. Imagina coisa que o autor nem sonhava dizer. Cortázar caiu na besteira de chamar de “leitor hembra”, só pras feministas caírem matando depois... Acho que ele quis dizer leitor passivo, sei lá -- Ugh! -- Há que se ter cuidado com o que se escreve, muito mais com o que publica. Pintor de palavras e sentidos. Isso sim é o que o bom leitor é, um come-folhas. Eu sei. Vou parar, vou pararrrrrrr -- Ugh! -- Garçon, traga uma outra igual, branquinha que hoje eu quero botar o verbo pra dançar, e bote uma música boa aí! Nada dessas barrocas -- Agh! -- arrumadinhas. Quê?! o Barroco é o pai do Rock?! Quero ouvir a gaita miaaaaaaaar! Bota uma irlandessssssssssa, colega, bota. Tá bom, vou me calar. Não se pode contar pro leitor o que acontece -- Ugh! -- neste nosso clube literário. Só de ver gente discutindo e trocando ofensas o leitor quer mais é arrancar. Escritor devia mais era escrever do que brigar -- Ugh! A gente se embriaga e solta o verbo. Por issssssso é que o -- Ugh! -- 'ledor' vai ver TV. Segura, segura o verbo que agora vai: o incorreto falando do mal escrito e a qualidade como é que fica?! Garçon, a saideira, a saideira. Mais uma branquinha, uma folha igual a essa aqui, limpa, e uma caneta nova que a tinta acabou e eu inda quero escrever o final -- Ugh!-- Pensando bem, colegas, deixo a conta pra vocês -- Aghhhhhhhh!.- Apagou.

Morreu dias depois. Causa mortis: celulose papiática.

Da série Contos Malandrinhos

----------------------------

Revisado em 18.09.2010