Numa Boate Lounge III (Final)

Levantou-se, desesperado, da sua cadeira. Tinha que ir pedir um cigarro àquela jovem. Pagaria por isso, caso fosse necessário. Enquanto caminhava notou que o grupinho da fumante estava conversando a seu respeito, pois tapavam a boca enquanto falavam, ao mesmo tempo em que continuavam sorrindo. De fato, estavam adimiradas. Não era a primeira vez que causava esse tipo de impressão. Mas não se julgava tão bonito assim, não gostava dos elogios que recebia. Mesmo porque nunca se utilizou dessa provável virtude para trair a esposa. Na sua mente só existia Valéria. A sua vida era Valéria.

- Com licença, boa noite... Você poderia me arranjar um cigarro, por favor? - Implorou Luís, ao aproximar-se da mesa do grupo.

- Bom... Não... - Respondeu a moça bela e sorridente.

- Não?! Mas eu posso pagar por ele. Quanto é?

- Ora.. não quero o seu dinheiro... Vamos fazer um trato? - Perguntou a jovem, ao mesmo tempo em que piscava para as amigas.

- Um trato?! Mas que tipo de trato?

- Te darei um cigarro, se você permitir que eu sente um pouquinho numa das cadeiras da sua mesa. E, então... combinado?

- Er... Mas... Esta bem. Eu aceito a condição. Pode vim comigo. - Respondeu Luís, dando as costas ao grupo e caminhando de volta a sua mesa.

Sentaram-se e apresentaram-se. A jovem começou a fazer perguntas a respeito da vida de Luís: o que ele fazia, onde morava, o que gostava de fazer e coisas do gênero. Contudo, enquanto ele tragava, com imenso prazer, o seu cigarro, refletia sobre o seu futuro, sobre a sua relação com a esposa, sobre os seus dois filhos, ainda crianças. Não prestava atenção na conversa da moça, estava em outro universo, apenas respondia as perguntas e fingia simpatia. Até que um assunto despertou seu interesse: a jovem afirmou-lhe que o pai dela estava traindo a esposa, e, por conseguinte, o ambiente estava bastante desagradável na sua casa. E que havia saído com as amigas a fim de esquecer um pouco esse problema.

- É mesmo?! Que coisa! Julgo que seus pais estão passando pelo mesmo problema que eu e minha esposa. É triste...

- Triste?! Minha mãe contratou um detetive. Ele descobriu tudo, até o nome da vagabunda: Valéria. Ela trabalha no mesmo hospital onde meu pai trabalha como médico. É enfermeira.

O seu mundo havia caído. Sentiu um mal estar apoderar-se do seu corpo. Era muita coincidência. Só poderia ser ela. A sua esposa era enfermeira e trabalhava num hospital da cidade. Sabia que era uma metrópole, poderia haver outras Valérias em outros hospitais, mas algo lhe dizia que a amante do sujeito era sua esposa. E apavorou-se.

- Mas vocês tem certeza disso? O detetive trouxe provas materiais?

- Sim, trouxe, Luís. Disse a minha mãe onde a piranha morava e disse até que ela também é casada. Pra você ver... - Respondeu a jovem, acendendo outro cigarro.- O corno é empresário do ramo de informática, tem uma loja na Rua da Aurora.

Não havia mais nada a fazer. Havia confirmado a sua hipótese. A sua "fiel" e ciumenta esposa estava o traindo, ninguém sabia há quanto tempo. O jogo havia mudado. Ocorreu o inverso, o negativo da situação. Coisa que Luís até então julgava impossível. Mas era verdade, não havia fuga. Valéria havia criado tudo aquilo a fim de se passar por vítima da história.

Luís levantou-se, cambaleante, da sua cadeira e justificou que tinha de ir ao banheiro, mas que voltaria. Então, ao entrar no WC, fez uma ligação para Moreira e, em prantos, explicou-lhe tudo que houvera descoberto. Depois de alguns minutos de conversa disse:

- Não precisa vim mais, Moreira.

- Por que? O que estas pensando em fazer? Não vais matar a tua esposa não né? E nem pensas em cometer o suicidio... não sejas louco!

- Que nada, Moreira! Vou me vingar, mas é usando o mesmo artifício dela: vou levar a filha do urso para um dos melhores motéis da cidade. Eis a minha vingança!

- Mas...

- Fica frio. Amanhã eu falo contigo. Agora deixa eu agir.

Desligou o celular e, com uma das folhas da resma de papel guardanapo colocado no balcão de granito preto, limpou o rosto molhado pelas lágrimas. Olhou-se no espelho, ajeitou seus cabelos com um pente de osso que sempre carregava consigo. Seus olhos estavam evidentemente vermelhos. Refletiu que poderia alegar a jovem que foi apenas o efeito da fumaça do interior da boate. Saiu do banheiro e foi direto à mesa onde estava. Não sentou-se, retirou o dinheiro das cervejas que houvera tomado e colocou em cima da mesa. Usou seu charme e, sorrindo, olhou para a jovem, a qual aparentava ter no máximo 25 anos, e disse:

- Vamos dar uma voltinha?

- Claro que vamos! - Respondeu-lhe, pulando da cadeira.

Fim do Conto.

Obrigado pela leitura, queridos recantistas.

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Fábio Pacheco
Enviado por Fábio Pacheco em 27/07/2006
Reeditado em 25/03/2007
Código do texto: T203179