CINDERELA 2010 = EC

O dia era de festa. A noiva estava linda em seu exuberante vestido branco e o noivo deslumbrado diante daquela que estava se tornando sua mulher.

Só Clarita estava triste. Quase tão triste quanto no dia em que naquela mesma igreja despedia-se para sempre de sua mãe.

Naquele dia todos estavam tristes, o pai segurou sua mão o tempo todo e ela se sentiu acolhida, protegida, parecia-lhe que todos estavam solidários com a sua dor e isto tornava o sofrimento mais suportável.

Mas, agora, não.

Todos sorriam, comemoravam o casamento de seu pai, comentavam a beleza e a bondade da Natacha e a felicidade dele poder reconstituir sua vida com uma moça tão especial.

Ninguém reparava nela, Clarita, ninguém sabia o quanto ela estava sofrendo vendo seu pai levar para sua casa aquela mulher, uma madrasta!

Enquanto os noivos beijavam-se diante do altar, ela, revoltada, destilava um ódio violento e um desejo de que a madrasta também morresse, como sua mãe tinha morrido.

Mas, ela era tão jovem e saudável, era bem capaz de viver décadas e mais décadas para tormento da Clarita.

Uma idéia sinistra começou a tomar corpo dentro dela.

Ela ia apressar as coisas. Ia matar a intrusa.

Mas, como faria isso?

Não teria coragem de dar-lhe um tiro, muito menos uma facada. O ideal seria provocar um acidente, mas, como faria isso?

Acabou decidindo-se pelo envenenamento. Parecia mais fácil.

Não foi difícil comprar um veneno para ratos. O vendedor alertou-a para que tivesse muito cuidado, pois se tratava de uma droga violenta.. Tentou até convencê-la de que uma ratoeira seria mais seguro, mas ela insistiu e acabou levando uma latinha com o pozinho letal.

Escondeu-o no fundo de sua gaveta e ficou esperando uma oportunidade para fazer com que a outra o engolisse.

Engraçado, ela tinha desejado tanto cometer aquele crime, mas, agora que tinha a arma na mão sentia-se um tanto assustada e não sabia o que fazer para concretizar o seu plano.

Passaram-se alguns meses. Chegou o final do ano e seus colegas de escola estavam planejando a festa de encerramento das aulas.

Todas suas amigas estavam escolhendo os vestidos que usariam no evento e ela foi à “Butique da Lurdes” e escolheu um lindo vestido cor de rosa.

Experimentou, ficou ótimo. Agora era só pedir o dinheiro para o pai e ir buscá-lo.

Mas, quando à mesa do jantar ela abordou o assunto o pai disse-lhe que não via necessidade de comprar um vestido, que ela já tinha muita roupa.

O pai não era mau, era carinhoso, alegre, presente, mas, digamos, um pouco “econômico” demais.

Sua mãe sempre dava um jeitinho de economizar no supermercado para comprar um tecido barato e confeccionar ela mesma um vestidinho novo para a filha, mas agora ela não tinha mais a mãe, só tinha a madrasta que não se importava com ela, só queria roubar-lhe toda a atenção do pai.

E Clarita culpava a madrasta por todas sua infelicidade e cada vez mais desejava vê-la morta, mas não tinha coragem de concretizar seu plano assassino.

Naquela manhã, mais uma vez, na escola ouviu os comentários alegres dos colegas e sofreu, mais do que nunca, a sua frustração.

Chegando em casa, fechou-se no quarto dizendo que estava indisposta.

Momentos depois a madrasta bateu de leva na porta.

- Entre! – disse mal humorada.

A outra adentrou-lhe o quarto sorridente com um pacote na mão:

- Um presente para você!

Clarita não podia acreditar. Ali estava o cobiçado vestido cor de rosa.

- Como foi que você adivinhou qual vestido que eu queria?

- Ora, perguntei para a Lurdes. Experimente. Se gostar é seu.

- Mas, e o Papai...

Sorriu, piscando maliciosa:

- Deixe comigo!

Clarita não podia acreditar no que ouvia. A bruxa estava fazendo pela Cinderela o que nem a sua própria mãe teria coragem de fazer.

Natacha continuava:

- O seu pai ganha pouco e tem muito medo de que nos falte algo realmente necessário. Às vezes exagera, mas é pensando na segurança da família. Eu arranjei um emprego de meio período. Não vou ganhar muito, mas vai dar para comprarmos as nossas coisinhas sem abalar o orçamento doméstico.

Clarita estava emocionada. Será que estava sonhando?

- Posso dar-lhe um abraço?

Natacha nunca soube o que aquele amplexo representou para Clarita..

Este texto faz parte do Exercício Criativo - Conte-me um Conto.

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Maith
Enviado por Maith em 11/01/2010
Reeditado em 11/01/2010
Código do texto: T2022915