Depois que Deus morreu.

Que Deus ia morrer todos nós sabíamos, afinal, Deus é a mais mortal de todas as criaturas. Só não sabíamos o significado da angústia de sua morte.

Deus caiu dos céus sobre a terra, uma massa de proporções gigantescas que abriu os mares ao se colidir com o globo. Seu corpo prestes-a-morrer era enorme. As feridas do coração divino se abriram no impacto, as suturas se alastraram sobre a terra, o pus jorrou de seu peito e sua imundície banhou a humanidade.

Absolutamente tudo em Deus fedia e fodia, seu corpo se abria aos poucos e mostrava a podridão em seu interior: os órgãos negros de alguém que um dia já reinou sobre o cosmos. Ainda assim, respirava e chorava, lamentava a própria dor, o fim de si, o fim de tudo.

Não tinha mais controle sobre seu corpo, urinava sobre si mesmo. Seu xixi banhava a sua prole, sua merda fedia e toda a res extensa conseguia sentir seus odores.

Há quem se alimentasse de seus dejetos, seu sangue, seu mijo, sua merda, suas lágrimas e seu pus, jurando serem milagrosos, mas todos que fizeram isso infectaram-se e morreram em poucos dias.

Logo, Deus se mostrou uma praga sobre a terra, seu cheiro era insuportável. foi dominado por um bilhão de vermes que trafegavam pela extensão transnacional de seu cadáver.

Muitos perderam a fé em Deus e principalmente em si mesmos, sua agonia era a agonia de tudo o que existia, afinal, o ser-humano não é capaz de pensar em um Deus que sofre.

Finalmente chegaram ao extremo do possível: “vamos explodir Deus”. Instalaram sobre a sua carcaça fétida as armas mais poderosas que a tecnologia podia fornecer, apertaram o gatilho e os pedaços de Deus voaram com uma velocidade absurda e fizeram um anel que rodeava a terra, a humanidade foi consumida no processo.

Os poucos que sobraram viveram de uma angústia infinda e um medo agudo. Acreditavam que as armas serviam para a proteção da espécie, e tinham perdido a mais poderosa arma que o homem um dia já criou: perderam Deus, perderam a religião.