Em Tempos de Pandemia 5

Era assistente social em abrigo para mendigos e, sem teto. A instituição a qual trabalhava sobrevivia de recurso público provindo do fundo social e do empresariado local, que dava aporte aos gastos excedentes onde a finança pública demonstrava insuficiente.

Os necessitados eram atendidos diuturnamente, casa temporária para os que não tinham definição de morada, viviam na rua, no gueto, na escuridão da sociedade, na indefinição do destino, na desistência da vida social organizada, na subordinação ao vício, no álcool, nas drogas, na prostituição, no metabolismo da violência. Aqueles que, num olhar epidérmico, mantinha vivo o caos suburbano, camada tida como “excluída” da sociedade.

Com a pandemia, Elba passou fazer os atendimentos de forma remota, falava com os necessitados por vídeo chamada.

A explosão da demanda cresceu acentuadamente, sobretudo, o lamento de pessoas, o abandono dos idosos pelos filhos, das crianças perdidas que chegavam sozinhas, sujas e com fome no abrigo, sem noção de onde os seus genitores poderiam estar, dementes sem saber de onde eram, onde estavam, para onde iriam, prostitutas desabafando a violência ao contato com clientes, agressões domésticas de toda sorte, estupros, abandono parental, aquelas situações extremas de sofrimento borbulhando sem solução no subterrâneo da sociedade, que estourou com a pandemia em número sem precedentes.

As decisões, apesar de dependerem de um colegiado, composto de membros da diretoria do Abrigo, representantes das empresas mantenedoras, e do executivo municipal, a última fala era a sua, que tinha que decidir pela solução ou amenização dos problemas apresentados, que muitas vezes não acontecia porque o agigantamento dos estragos deixados com a pandemia e o isolamento social, fez com que gerasse esgotamento dos recursos, bem como o acomodamento das vítimas da violência ser impossível devido aos locais para atendimento estarem todos lotados.

Em alguns casos, conseguia contato com parente do desabrigado , que desligava o telefone quando Elba mencionava o nome daquele que necessitava de ajuda. Outros, ficavam extremamente felizes por ter encontrado o ente querido que há dias estava desaparecido.

Realizava ajeitamento entre conhecidos, que doavam cobertores, alimento, roupas, kit para higiene, máscaras às vitimas, que retornavam para a rua, indo procurar algum canto para dormirem.

Alguns, pediam desesperadamente máscaras, não queriam ser contaminados pelo vírus, mesmo em situação extrema de abandono da própria vida, miséria, toda sorte de violência. Queriam viver.

Recebiam o kit para a higiene: álcool em gel, sabonete e sabão, roupa limpa doada, alimento, Saiam sem destino.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 31/07/2020
Código do texto: T7022678
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