Em Tempos de Pandemia 3

Elba tomou a forma de faísca nas frações de tempo. De princesa, chegou em casa e foi logo assumir o figurino preferido, um par de calça e camiseta velha, as usava quando estava em casa, e uma pantufa nos pés, voltando à insignificância.

Passou com algodão o demaquilante no rosto. Lavou a face com água abundante para tirar completamente a maquiagem. Abusou do sabonete francês em pedra que havia comprado para lavar as mãos e o rosto, queria esquecer o odor que sentira quando passava de carro próximo ao córrego que recebe os detritos e fezes da cidade.

No standbay, reduzia-se na forma de uma tênue luz, servia tão somente para sinalizar a si mesma que estava viva. Nem feliz, nem triste. Viva.

Os tempos chegados trazendo o inesperado , levou Elba ascender em prol da Alma dois sentidos do corpo para ficar na linha de frente, a audição e a visão; além do paladar e o olfato. Com mais tempo em casa, pesquisou novas receitas e gostos na internet, cozinhou de tudo. Como resultado, ganhou peso.

Encontrou uma tábua de salvação, as ferramenta e as conexões que passou estabelecer na internet como forma de amansar as feras que acordara dentro, a aflição e o desassossego de não poder sair, interagir com o mundo como antes, e as inseguranças quanto ao futuro seu e do mundo.

Tinha os velhos abacaxis para descascar, e os novos que eclodiram com a pandemia estabelecida.

Não ia a Igreja, a roupa nova a estrear aos domingos nos templos nos cultos e reuniões estava entregue ao cheiro de naftalina no guarda roupa. Os cultos, passaram ser somente pela tela de um computador ou celular.

Quem dera... tecnologias que foram combatidas como nefastas pelas religiões protestantes e a moral conservadora, hoje, consagradas como único meio de realizar uma cerimônia religiosa.

O cinema, a Coffee break , dedo de conversa com as “migas”, para esparramar no riso, na fofoca e no choro, no provocar pelas presentes de uma verdadeira histeria coletiva como meio de exaurir o stress e o desabafo da lida . Tudo suspenso.

Elba adotou o assistir aos coachings, treinadores que utilizam de ferramanentas na internet de desenvolvimento pessoal e profissional para dar cursos a quem interessar.

Com a desconstrução do fazer, do ser, do conhecer, do conviver, e os estragos nas áreas: social, econômica, mental e espiritual na humanidade, desencadeados pelo isolamento social, os novos profissionais, “coachers”, trouxe um mix de tudo um pouco, orientando como falar melhor, pensar, buscar a felicidade, como correr, realizar esportes, maquiagens, autodeterminação, saúde, tudo aquilo que possa trazer resultados em curto e médio prazo, fazendo concorrência com o que a religião oferece, a psicologia, a sociologia, a filosofia, a medicina, a ciência.

O Coach treina. E a avalanche destes imediatistas tem inebriado Elba a querer mais e mais assisti-los, interagir com eles nas ferramentais virtuais.

Seriam os religiosos repaginados numa nova versão? nem religiosos, nem psicologos, nem filósofos, ou charlatões, mas sim, agentes aptos para facilitar ao enfrentamento do novo? Ou, os que esfumaçam a pureza das verdades tratadas pelas áreas do conhecimento, filosofia e religião, podendo levar ao aculturamento?

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 24/07/2020
Reeditado em 24/07/2020
Código do texto: T7015858
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