O Poder da Saudade

A saudade, doce ou amargurada, anda por entre vilarejos e grandes cidades. Perambula nos corações dos que partiram e, também, de quem ficou para trás. Daqueles que voltarão e dos que jamais irão retornar.

Ela não escolhe cor, gênero ou classe social. Não leva em consideração se no coração há bondade ou tudo que há de ruim. Apenas chega, de mansinho, e toma conta dos pensamentos de qualquer um.

A saudade não admite que a considerem fraca, então, sempre leva ao limite algumas pessoas, para que todos vejam seu grande poder.

Houve uma época em que alguns começaram a duvidar da saudade. Diziam que contorná-la era fácil.

E uma dessas pessoas era João, um rapaz que, em breve, iria para a guerra.

João casou-se há dois meses, com a jovem Dandara. Aquela que sempre, desde criança, teve seu coração. Não poderia estar mais feliz e realizado.

Haviam combinado que, assim que João voltasse da guerra, teriam um filho. Queriam ver o fruto daquele amor correndo por todos os cantos, alegrando ainda mais seus corações, eternizando e expandindo a boa fase que estavam vivendo.

Partiu para a guerra e já estava ansioso para voltar para casa. Mas, como havia prometido aos companheiros que mostraria como a saudade é passageira, permanecia tranquilo e certo de que seria uma tarefa fácil.

Imaginava que ficaria longe no máximo alguns meses. Grande engano: a guerra durou quatro anos.

A esperança e teimosia o fizeram, a cada mês, ter a certeza de que seria o último. Mas, nunca chegava ao fim. Durante todo o tempo, via seus colegas, e também desconhecidos, perdendo para a saudade. Eles sucumbiam, alguns mais rapidamente que outros, mas nenhum estava resistindo. João era o único que ainda lutava, bravamente, e mantinha uma chama acesa dentro de si.

A saudade, inconformada, entendeu que precisaria ser ainda mais dura. Não poderia, de forma alguma, permitir que João espalhasse aos quatro ventos sua vitória. Então, afastou-se, aceitou a derrota naquela batalha e planejou, minuciosamente, uma forma de ganhar a guerra.

Quando tudo terminou, João voltou para casa. Estava grato por ter sobrevivido, animado para rever sua esposa e, juntos, realizarem tudo que haviam planejado. Tinham a vida toda pela frente, e todo esse tempo ainda parecia insuficiente ao lado de sua amada.

Havia uma movimentação estranha quando chegou: pessoas entravam e saiam de sua casa, tristes, algumas chorosas. Entrou apressado, em pânico com a situação. Mas, assim que seus olhos varreram o primeiro cômodo, seus joelhos bateram no chão, não mais suportando seu peso.

O corpo de sua esposa estava na mesa. Na sala, onde haviam colocado os móveis, juntos, escolhido cada detalhe. Tudo estava do mesmo jeito. Mas Dandara não estava mais lá, com seu sorriso contagiante e olhos brilhantes. Ela se foi. E, naquele momento, João desejou ter morrido nas trincheiras. Todo sofrimento que presenciou, nada se comparava com o que estava sentindo.

Enquanto lutava e vencia, tão longe, Dandara estava travando sua própria batalha contra a tuberculose. A diferença é que ela perdeu!

De repente, ele entendeu o que estava acontecendo e, em pedaços, pediu perdão à saudade. Ela ganhou a guerra. Viveria, para sempre, dentro de João.

A saudade precisa ser sentida.

Não há como brigarmos com algo que pode acabar com a gente de dentro para fora. Mas, há como aprendermos com ela.

Sentir saudade é inevitável e indispensável para darmos valor ao que está ao nosso lado.

Precisamos, muitas vezes, perder de vista para nunca mais deixarmos de admirar.