Elevar-se

Estacionou o carro o mais próximo possível do mar, escutou o murmúrio das ondas e fechou os olhos por alguns minutos, absorvendo a umidade e o peculiar cheiro marinho. Deixou a mente vagar, precisava daquela paz para acalmar a guerra interior. 

      Não se importou com o escuro ou com o perigo que era estar sozinha aquela hora, naquele lugar tão remoto, isolado do mundo.

     Deu a volta no carro e encostou-se no frio pungente e penetrante, precisava acreditar que o frio exterior excedia o frio que sentia por dentro.

     Acendeu um cigarro e tragou profundamente. Há quanto tempo não fumava? Um desperdício de tempo e esforço acabava de ser quebrado. Mas quem se importaria? Observou a fumaça afastar-se em leves caracóis, para logo dissipar-se e perder-se na escuridão. Seria tão fácil se conseguisse também fundir-se aos elementos naturais  e desaparecer levemente, quase inconsequentemente no espaço e no tempo. Apagar sua existência de forma tão fugaz!  Porém tempo, era o que ela não tinha. A vida por fim era assim, não era? Reminescencias e congecturas frustrantes e  vazias, às vezes sem sentido algum.

     O vento chegou-se sem preâmbulos e bateu-lhe forte no rosto, trazendo-a  ao momento presente, sentiu seus dedos gelados ainda por algum tempo percorrendo seu pescoço que num afago nada furtivo e um tanto selvagem deixou seu cabelo em desalinho.

      Talvez agora parecesse como a louca que era.

      Mas seria ela louca mesmo?  Por um atrio de segundo a resposta pousou em sua mente. Sabia que não era, e essa certeza era doce e amarga ao mesmo tempo. Começou a rir, um riso debochado e desvairado que ressoou através da escuridão e elevou-se ao barulho do mar.

      O que diriam no dia seguinte?

     Tentou imaginar a notícia que seria, ou a estatística de uma manchete evasiva.

     Era a noite perfeita. A lua enorme parecia cobrir todo o céu, estava quase mística!  E o mar raivoso elevava suas ondas muito além do que deveria. Poderia ele querer com seu alvoroso desvia-la de seu intento?

     Tentou visualizar - se naquele momento. Uma linda mulher, sim linda, por que não? Com seu vestido branco esvoaçante, os cabelos longos soltos em desalinho, e um ar de fragilidade feminina frente a toda aquela imensidão.

      Soava quase romântico.

      E antes que a idéia pudesse criar qualquer dúvida em seus pensamentos ou trair seu objetivo,  segurou as sandálias na mão e de passos leve como uma dançarina adentrou as águas furiosas, perdendo - se para sempre no brilho excessivo da lua.

    

Tânia Mara Paula
Enviado por Tânia Mara Paula em 11/10/2016
Reeditado em 26/12/2017
Código do texto: T5788197
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