A vovó

A vovó está na varanda, pernas cruzadas, dorso apoiado numa cadeira que diz ter a mesma idade dela. Sozinha, a vovó. Pensativa como se habitasse, agora, um remoto lugar bucólico nunca antes vislumbrado em seus 80 e tantos anos. E os netos? Não chegaram. Ou melhor, nunca chegarão, já que não os teve. Nem netos, nem filhos, nem marido. E se nesse percorrer as oportunidades apareceram, isso lá apareceram sim, e em grande número, para esclarecer. Mas com que ousadia apossar-se-ia ela de alguém, a ponto de usar o pronome possessivo meu, se tampouco possuía a si mesma? E foi por esse motivo que renunciou o fazer, ou o estar em uma família propriamente dita, se mais conveniente. Viveu só.E não se arrependeu.

Mas pode uma senhora ser vovó sem ao menos ter sido mãe? Não são, entretanto ,autênticas as que adoçam o mundo infantil com guloseimas,espiam por entre as cortinas e acordam a si e aos outros ao primeiro cantar de galo? Sim. Mas não muito. E se ela é ou não essa pessoa meiga e reverenciada, pouco importa. Nada importa, aliás. A principio porque nem sabe se é, e, depois, ser vovó, essa soma de dois termos estranhos, transcende uma definição.E ela é indefinida.A vovó.

flor de vento
Enviado por flor de vento em 20/04/2016
Reeditado em 20/04/2016
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